O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes avaliou, nesta sexta-feira (6), que a ordem de prisão do juiz Sérgio Moro ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é "absurda", porque ainda não foram finalizados todos os procedimentos do Tribunal. Ele classificou a situação no país como "despotismo judicial".
— Estamos vivendo uma Prokuratura — disse há pouco em entrevista ao Broadcast, realizada em Lisboa. O termo russo refere-se ao período que a então União Soviética (URSS) vivia sob a subordinação do "Soviete Supremo", o poder legislativo soviético.
O ministro voltou a dizer que a situação no Brasil e no próprio STF está muito confusa.
— Esta foi uma crise embrenhada, mal gerida pelo Supremo — avaliou na capital portuguesa, onde participou de uma série de eventos da área jurídica. — A única coisa que me conforta nisso tudo é que toda essa crise que estamos vivendo é fruto de uma desinstitucionalização criada pelo PT - declarou.
O ex-presidente Lula, conforme o ministro, está sendo vítima de sua própria obra, ao ter feito, entre outros coisas, más indicações para o Supremo.
— Foram péssimas indicações para o Supremo. Pessoas que não eram conhecidas foram indicadas, não tinham formação, não tinham pedigree. Eram para preencher vagas como de simpatizantes do MST, de causas, de grupo afro, sem respeitar a institucionalização do País, por ser amigo de algum político — enumerou.
Para o ministro, personagens como Sergio Moro e Deltan Dallagnol são "filhos de um cruzamento do PT com Luiz Francisco" Fernandes de Souza, procurador da República.
— Eles armaram isso tudo. Criaram uma desinstitucionalização. O aparelho que hoje existe, o mecanismo ou coisa do tipo, é este: delegado procurador, juiz... São essas ações articuladas e o Estado de Direito ameaçado — pontuou.
Perguntado sobre se mudar de voto no caso do habeas corpus do presidente Lula também não poderia ser avaliado como uma forma de fazer parte do "mecanismo", ele disse que a sua alteração não teve importância.
— Minha posição todos conhecem há muitos anos e tudo é fundamentado. Trouxe para o plenário a rediscussão sobre a necessidade de ter limites. Continuo a achar isso, não é possível simplesmente esperar o trânsito em julgado, porque isso não existe mais na prática — argumentou.
Mendes, conhecido por suas declarações fortes, avaliou que o país passa hoje por um "voluntarismo sem precedentes".
— Acho um absurdo essa ordem de prisão dada assim, sem sequer se exaurirem os procedimentos do tribunal. Não está publicada a decisão. A única coisa que me conforta a alma é que o PT, o que é muito raro, está pagando.
O ministro citou a frase do Victor Nunes Leal:
Acho um absurdo essa ordem de prisão dada assim, sem sequer se exaurirem os procedimentos do tribunal. Não está publicada a decisão. A única coisa que me conforta a alma é que o PT, o que é muito raro, está pagando.
GILMAR MENDES
Ministro do STF
— Tal é o poder da lei que a sua elaboração reclama precauções severíssimas. Quem faz a lei é como se estivesse acondicionando materiais explosivos. As consequências da imprevisão e da imperícia não serão tão espetaculares, e quase sempre só de modo indireto atingirão o manipulador, mas podem.
Para ele, neste caso, porém, o PT, apontado como o articulador dos "materiais explosivos", acabou também sendo uma vítima. "Isso é raro. Em geral, o legislador que faz as trapalhadas não é atingido pela explosão. Mas agora foi."
Ao falar sobre sua avaliação de que a ordem de prisão de Moro trata-se de um ato de despotismo judicial, ele disse que o País passa por uma onda de autoritarismo penal que varre o País. "Isso tem que ser denunciado e cobrado", disse.
Questionado sobre se Moro poderia sofrer algum tipo de punição, no entanto, disse que não discutiria o assunto.
— Só digo que é fruto de uma má... essa mixórdia que se fez - disse, usando um termo bastante lusitano que significa o mesmo que bagunça.
Mendes reforçou que o Partido dos Trabalhadores deixou como "notório legado" uma Corte institucional mal formada, mal indicada, com ministros, de acordo com ele, sem perfil, sem compromisso histórico, sem conhecimento da máquina.
— Daí gera essa bagunça que está aí. Fizemos um experimentalismo maluco e o resultado está aí - afirmou, criticando mais uma vez a condução da pauta da ministra Carmen Lucia no caso do julgamento do HC de Lula. Para Mendes, os ADCs deveriam ser analisados na mesma ocasião.
— Fico com vergonha de estar vivendo um momento de totalitarismo policial, judicial. Esse decreto da prisão do Lula representa isso. Meu consolo é que isso é fruto das maquinações do PT, da intenção de venezuelar o Brasil - voltou a criticar.
Na avaliação do ministro, o risco de o Exército tomar conta do governo é bem menor hoje do que o de outras áreas da sociedade.
- Na verdade, não é o Exército. Quem tem ameaçado o governo são os promotores, os juízes, são nomeações como a da Cristiane Brasil, não é o exército. Trata-se de um governo fraco que vem enfrentando abusos. A Corte não está à altura do Brasil - finalizou.