O juiz federal Sergio Moro voltou a defender a prisão após condenação em 2ª instância, na noite desta segunda-feira (26). Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, o magistrado da 13ª Vara Federal de Curitiba afirmou que "seria ótimo esperar o julgamento final" para executar a pena de um condenado, mas que os inúmeros recursos previstos na legislação brasileira acabam atrapalhando o processo:
— Essa generosidade de recursos consegue ser muito bem explorada por criminosos e poderosos, política e economicamente. São eles que podem contratar os melhores advogados (...) Uma revisão desse precedente (prisão após 2ª instância) teria um efeito muito ruim, passaria uma mensagem errada, passaria uma mensagem no sentido de dar um passo atrás — disse.
Já em relação ao julgamento do habeas corpus preventivo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que será analisado em 4 de abril pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o magistrado disse esperar que a Corte "tome a melhor decisão", mas que o tema da prisão após decisões de colegiados vai além da Lava-Jato – envolvendo, segundo ele, outros casos como estupro, peculato e pedofilia.
Sob a possibilidade de prisão do ex-presidente com a confirmação da condenação em 2ª instância, Moro disse que não tem escolha e que tem de cumprir a decisão. O magistrado destacou que todas as medidas serão tomadas para garantir a segurança do petista caso o pedido de detenção se confirme.
— A decisão não cabe a mim. Cabe ao Tribunal (TRF4). Eu particularmente sou apenas um cumpridor da ordem (...) Eu não tenho nem a opção, de cumprir ou não cumprir.
Veja outros temas abordados na entrevista:
Acusações
Moro também respondeu como lida com pessoas que o acusam de golpista em relação a sua atuação. O juiz afirmou que está "muito tranquilo" em relação às suas decisões nos processos da Lava-Jato.
— Sempre agi com a pretensão de fazer a coisa certa — afirmou, destacando que não se deixa influenciar pela fama momentânea, pois ele é apenas uma parte no processo:
— A Operação Lava-Jato não é o produto de uma pessoa só, não é resultado do meu trabalho. Existe todo um esforço institucional. Tem a Polícia (Federal), o Ministério Público — disse, também salientando ainda a atuação de outros juízes.
Foro privilegiado
Moro disse que esse instituto do foro por prerrogativa de função, o foro privilegiado, é "algo que não funciona muito bem" e que tem de ser eliminado ou reduzido.
— O Supremo não é preparado para julgar esses recursos.
Auxílio-moradia
Ao defender sua opinião favorável ao auxílio-moradia, o juiz voltou a dizer que o salário dos magistrados no Brasil não sofre reajuste há três anos, mesmo que a legislação preveja essa correção. Em fevereiro, o jornal Folha de S.Paulo divulgou que, mesmo tendo um apartamento de 256 m² em Curitiba, a somente três quilômetros do prédio da Justiça Federal do Paraná, onde trabalha, Moro recebe o benefício – cujo teto, hoje, é de R$ 4.377.
— Existe esse benefício (o auxílio-moradia) que é questionável, mas existe a previsão constitucional de que o salário dos juízes deveria ser reajustado anualmente, o que não ocorre há três anos — disse, acrescentando que o benefício tem de ser debatido de maneira mais abrangente.
Acordão
O juiz disse que não acredita em um acordo entre o STF e os poderes para livrar acusados na Lava-Jato:
— Como juiz, não posso acreditar em uma hipóstase dessas.
Vazamento de áudios
Moro comentou o vazamento dos áudios da conversa entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a então presidente da República Dilma Rousseff, em 2016, após o anúncio de que o petista seria o novo chefe da Casa Civil. No áudio, Dilma afirmava a Lula que estava lhe enviando o termo de posse para "caso de necessidade". A oposição afirmava que o trâmite visava apenas proteger Lula com foro privilegiado.
Ao defender a quebra de sigilo, Moro disse que entendeu que os áudios eram de "interesse público" e que não acha sua decisão equivocada, mesmo algumas pessoas, entre elas o ex-ministro do STF, Teori Zavascki, morto em 2017, discordarem:
— Eu não acho que errei. Agi com a pretensão de fazer a coisa certa.