A tensão entre os integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação à possibilidade de execução de pena após decisão em 2ª instância vem crescendo nas últimas semanas e pode chegar ao ápice nesta quarta-feira (21). Há a expectativa de que, na sessão marcada para as 14h, a presidente Cármen Lúcia seja questionada por um dos 10 colegas sobre a inclusão na pauta de um novo julgamento sobre o assunto.
A ministra tem rejeitado rever a orientação definida pela Corte em 2016 e que abre caminho para a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas próximas semanas. Uma tentativa de resolver o embate nesta terça-feira (20), longe dos holofotes, acabou frustrada.
Estava prevista uma conversa informal entre os magistrados à noite, o que acabou não ocorrendo. Ao longo do dia, ministros deram versões diferentes sobre o episódio.
Qualquer ministro poderá chamar uma questão de ordem sobre duas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC), que contestam a prisão após a 2ª instância e estão prontas para serem votadas. De acordo com Celso de Mello, o encontro informal, sugerido por ele, tinha o intuito de evitar embates públicos, o que criaria “constrangimentos inéditos” para Cármen Lúcia.
A sugestão para a agenda teria sido feita na última semana, no gabinete do ministro. Questionado sobre os motivos para que a agenda não fosse realizada como previsto, Celso de Mello foi lacônico:
— Se não houve convite por parte da presidência, isso significa que ela não se mostrou interessada.
No entanto, Cármen Lúcia chegou a citar o encontro em uma entrevista à Rádio Itatiaia, de Minas Gerais, no início da semana. Nenhuma explicação oficial foi dada pela assessoria do STF, que havia confirmado a agenda, mas não se manifestou sobre o cancelamento. Nos bastidores, uma das hipóteses para o fracasso da tentativa de reunião seria um mal-entendido entre Celso de Mello e a presidente, que pensaram que seria o outro a enviar os convites.
Celso de Mello é um dos magistrados que mais tem comentado abertamente o tema. Favorável à prisão de condenados somente após o trânsito em julgado de ações no STF, isto é, a 4ª instância, defende publicamente a inclusão do tema na pauta para nova discussão. O comportamento é visto como forma de pressionar Cármen Lúcia, responsável por pautar os processos que serão julgados pela Corte.
A mesma postura é adotada por Marco Aurélio Mello. Questionado sobre o tema por jornalistas, clamou por uma solução para o impasse e pontuou que o Supremo não pode continuar “dividido como está”.
— Aí, o habeas corpus ganha sabor lotérico — comentou, lembrando que colegas costumam se posicionar de forma diferente sobre as prisões em 2ª instância em suas decisões.
Cármen Lúcia é contrária à revisão da regra e afirmou, em diversas oportunidades, que não iria pautar o tema. Na primeira manifestação sobre o assunto, citou diretamente a situação de Lula, mencionando que definir um novo julgamento a partir do caso específico do ex-presidente seria “apequenar” o Supremo.
Nesta quarta, está prevista uma sessão administrativa entre todos os ministros do STF após a sessão plenária normal. De acordo com a assessoria da Corte, o encontro ocorre sempre após convocação da presidente e tem pauta predefinida, embora ainda não tenha sido divulgada. A agenda será aberta ao público, o que poderá inibir debates acalorados sobre temas polêmicos, focando a discussão em questões que fogem ao mérito de processos.
Fachin nega recurso
Ainda nesta terça-feira, o ministro Edson Fachin negou recursos apresentados contra o acórdão da decisão de 2016, que permitiu o cumprimento de pena após condenação em 2ª instância. Os embargos de declaração apresentados no último dia 14 pediam a revisão da regra.
Na decisão, o magistrado afirmou que qualquer alteração de entendimento deve ser realizada após novo julgamento da ação, que ainda não tem data definida pela presidente Cármen Lúcia. Ele também negou enviar a decisão sobre os recursos para o plenário. Os embargos foram apresentados em duas ações já liberadas pelo relator, Marco Aurélio Mello, para julgamento.
Em 2016, o placar pela prisão após a 2ª instância foi apertado, vencendo a antecipação da execução das penas por 6 votos a 5. No entanto, Gilmar Mendes, que à época votou a favor da tese vencedora, anunciou que se posicionará de forma contrária quando o tema voltar ao plenário, revertendo a interpretação do tema.
No entanto, como uma forma de blindar o STF, o ministro Dias Toffoli sugeriu, informalmente, uma via intermediária. A prisão de condenados só seria efetivada após a confirmação da pena pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), isto é, a 3ª instância.