Em 175 páginas, o recurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) questiona a neutralidade do juiz Sergio Moro, contesta a página no Facebook "Eu MORO com ele" e pergunta por que se desconsiderou o depoimento de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) no processo.
Os pedidos de esclarecimento aparecem em meio a supostas 38 omissões, 16 contradições e cinco obscuridades apontadas pela defesa do petista no acórdão publicado no início de fevereiro. Com poucas chances de reverter a condenação, os embargos protocolados na última terça-feira servem como antessala para o recurso especial que deve ser levado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Na prática, o mecanismo opera como pré-requisito para futuros questionamentos em tribunais superiores. Por isso, pouca novidade apresenta em relação às contestações retumbadas pelos advogados de Lula antes mesmo da sentença assinada por Moro — o documento cita, por exemplo, o pedido de suspeição do procurador da República Deltan Dallagnol devido à polêmica coletiva de imprensa ilustrada com um PowerPoint.
— É recorrente que os argumentos já tenham sido apresentados, mas, para a defesa, não foram devidamente tratados ou foram tratados de maneira contraditória ou obscura — explica o professor de Direito Penal da PUCRS Rafael Canterji.
Os recursos ao STJ e mesmo ao Supremo Tribunal Federal (STF), chamados de especial e extraordinário, precisam, como requisito jurídico, passar pela análise de admissibilidade no próprio tribunal regional. Para afastar o risco de tê-los negados, a defesa se esforçou em esgotar as indagações, analisa o advogado criminalista Aury Lopes Junior:
— Os embargos apresentam questões que, de certa forma, já foram afastadas em maior ou menor intensidade ao longo do processo. Não acredito que o TRF4 mudará o seu entendimento, mas deve melhorar a sua argumentação. Pela defesa, está claro o interesse em construir o caminho para os outros recursos. Estão sedimentando o caminho.
Estratégia comum à defesa de réus, o extenso documento protocolado pelos advogados do ex-presidente também carrega a tentativa de atrasar ao máximo o processo. Para além de seus interesses eleitorais, Lula, que tem mantido agenda de candidato, como na última quarta-feira, em Minas Gerais, corre o risco de ser preso. Segundo o entendimento da Corte regional, a pena deve ser executada logo após o fim do caso em segundo grau.
— Há uma tentativa de tornar a rapidez no julgamento o mais constrangedor possível. Ao se despejar teses, a defesa adia o máximo possível o prazo de conclusão da análise. E, quanto mais empurrar com a barriga, um dia de liberdade a mais — acrescenta o advogado Andrei Schmidt, professor na PUCRS.