Os dados oficiais do Tribunal de Contas do Estado (TCE) sobre os gastos do Rio Grande do Sul com pessoal e com pagamento da dívida com a União são dois dos principais entraves para os planos do governo José Ivo Sartori de aderir ao regime de recuperação fiscal. Conforme os atuais cálculos do TCE, os problemas nas contas públicas gaúchas não seriam suficientemente grandes para que o Estado se enquadre nas regras do socorro fiscal.
Pelas normas impostas pela União, os Estados interessados no auxílio precisam ter ao menos 70% de suas receitas correntes líquidas comprometidas com as duas despesas. Entretanto, certidão anual do TCE, que será emitida nos próximos dias, apontará que o comprometimento da receita com pessoal em 2017 atingiu o índice de 54,7%. Mesmo se somados os gastos da dívida com a União, no ano passado, o índice sobe para 58,4%, distante do percentual exigido.
O governo do Estado, por sua vez, defende que o cálculo para gastos com pessoal deve seguir os critérios da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), que considera outras despesas com pensionistas, imposto de renda e abono permanência. Cálculos extraoficiais de uma fonte com acesso privilegiado aos dados indicam que, consideradas essas despesas, o comprometimento da receita do Estado com pessoal atingiria 69,9% – ainda abaixo do necessário.
Para ultrapassar o percentual mínimo exigido, a Secretaria da Fazenda (Sefaz) do Estado também passou a contabilizar como valores despendidos (empenhados e liquidados) em 2017, as parcelas não pagas da dívida da União. O Estado obteve uma liminar no Supremo Tribunal Federal (STF), em agosto do ano passado, suspendendo o pagamento das parcelas. Segundo cálculos extraoficiais da mesma fonte, se considerados nos gastos de 2017 essas parcelas, o comprometimento da receita líquida do Estado chegaria a 72,8% – o que, então, comprovaria um caos fiscal para viabilizar a adesão.
O secretário da Fazenda do Estado, Giovani Feltes, aponta que a contabilização das parcelas não pagas da dívida no cálculo é uma orientação da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e da Câmara de Conciliação com a União. Feltes admite que, pelos critérios atualmente usados pelo TCE com gastos de pessoal e dívida, os índices mínimos não são atingidos e confirma que o entrave se resolveria se outros cálculos fossem aceitos.
Por conta das divergências de cálculo, o governo do Estado encaminhou uma consulta ao TCE, no fim de janeiro, provocando a corte a se manifestar sobre os critérios utilizados. Entre as questões feitas ao TCE, o governo deseja saber qual a repercussão na análise das contas do governador, caso os critérios da STN sejam utilizados, o que poderia levar o atual governo a, de uma hora para outra, estar em descumprimento com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
— Esperamos que o TCE se manifeste em relação a isso em 60 dias e, daí, estejamos maduros com a STN e com a União para assinarmos a adesão ao regime de recuperação fiscal. Não tenho dúvida de que vamos assinar o acordo com brevidade — projeta Feltes.
Uma mudança nos critérios, apesar de resolver os problemas do governo para aderir ao regime, poderia impactar no fechamento das contas de municípios gaúchos e de outros órgãos e poderes, especialmente Judiciário e Ministério Público.
No fim do ano passado, o governo gaúcho, sem conseguir atingir as exigências da União para o pré-acordo, voltou de Brasília com um protocolo de intenções, que ainda não oferece benefícios ao Estado. O pré-acordo, por sua vez, se assinado, garantirá a suspensão do pagamento da dívida e a permissão para que o Estado contraia empréstimos bancários.
Politicamente, o governo já obteve uma vitória: a autorização da Assembleia Legislativa para adesão do Estado ao regime, na semana passada. Entretanto, há outros obstáculos, mais difíceis, como a exigência da União para que o Estado venda ativos. O governo quer oferecer a venda de três empresas do setor energético: CEEE, Sulgás e CRM. Para isso, no entanto, precisa aprovar na Assembleia propostas para acabar com a atual exigência de realização de plebiscito para venda das três, mas não tem apoio político para isso.