O comandante Eduardo Villas Bôas, líder do Exército Brasileiro, descartou punir o general gaúcho Antônio Hamilton Mourão, que sugeriu uma intervenção militar caso o Judiciário não "retire os corruptos da vida pública".
Em entrevista na noite de terça-feira (19) ao programa Conversa com Bial, da TV Globo, Villas Bôas ressaltou que já conversou com Mourão "para pôr as coisas no lugar", mas que "punição formal não vai haver".
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O comandante afirmou que Mourão teve o discurso descontextualizado e que não fala pelo alto escalão, mas disse que as forças militares têm, sim, autorização para intervir a qualquer momento. Ele citou, como exemplo, o uso de militares para reforçar a segurança pública no Espírito Santo e no Rio de Janeiro.
— O Exército se destina à defesa da pátria e das instituições. E essa defesa das instituições, dos poderes constituídos, pode ocorrer também na iminência de um caos — diz o general.
No entanto, o artigo 142 da Constituição Federal, que rege a atuação das Forças Armadas, regulamenta que a autoridade suprema é o presidente da República e que os militares têm, como objetivo, "a defesa da Pátria, a garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes (poderes constitucionais), da lei e da ordem", sem menção a uma "iminência de caos".
Questionado por Bial sobre a declaração de seu subalterno, o líder do Exército afirmou que Mourão "é um grande soldado, uma figura fantástica, um gauchão" e que a maneira como o general gaúcho se expressou "deu margem a interpretações em um espectro bastante amplo".
Mourão afirmou, na última sexta-feira (15), em encontro de maçons em Brasília, que uma "intervenção militar" pode ser adotada no país caso o Poder Judiciário "não solucione o problema político" – a crise generalizada de corrupção nos altos escalões governamentais. Segundo Mourão, seus "companheiros do Alto-Comando do Exército" entendem que essa "imposição não será fácil" e avaliam que ainda não é o momento para a ação, mas admitem que ela poderá ocorrer.
Esta não foi a primeira declaração polêmica do general gaúcho. Mourão perdeu o posto de chefe do Comando Militar do Sul em outubro de 2015 após criticar o governo Dilma e deixar que ocorresse em Santa Maria homenagem de subordinados seus a um dos símbolos do regime militar (1964-1985), o coronel Brilhante Ustra.
Ustra, já falecido, foi comandante do DOI-Codi do II Exército, em São Paulo, onde teriam morrido 45 prisioneiros. Ele foi transferido para a Secretaria de Finanças do Exército, em Brasília.
Veja o trecho da entrevista de Pedro Bial com Eduardo Villas Bôas sobre a polêmica com o general Antônio Hamilton Mourão
Ele (o general Mourão) não quebrou hierarquia, não desrespeitou o regulamento disciplinar do Exército? Não vai ser punido pelo senhor ou pelo ministro Raul Jungmann?
A maneira como o Mourão se expressou... O Mourão é um grande soldado, uma figura fantástica, um gauchão. Soldado. A maneira como ele se expressou deu margem a interpretações em um espectro bastante amplo. Mas ele inicia a fala dizendo que segue as diretrizes do comandante. E nossas diretrizes têm sido que a nossa atuação, desde o início das crises, no impeachment, era de promover a estabilidade, pautar sempre pela legalidade e preservar a legitimidade do Exército. Ele começou pautando isso.
Mas depois...
Depois, como eu disse, ele dá margem a interpretações... Mas se você recorrer ao que está na Constituição, no artigo 142, sobre a atribuição das Forças Armadas, diz que as Forças podem ser empregadas na garantia da lei e da ordem por iniciativa de um dos poderes. Isso tem acontecido recorrentemente, no Rio de Janeiro, no Espírito Santo, em Brasília. O texto diz que o Exército se destina à defesa da pátria e das instituições. Essa defesa poderá ocorrer por iniciativa de um dos poderes, ou na iminência de um caos. As Forças Armadas têm mandato para fazer. O que ele quis dizer, nós já conversamos, chamou a atenção para as expressões. As aproximações sucessivas, uma delas são as eleições. Isso foi o que ele quis dizer. Essa questão de intervenção militar ocorre permanentemente. Rio de Janeiro e Espírito Santo foram intervenções.
Mas aí ele está falando de uma intervenção militar... O que eu entendi e grande parte dos leitores e espectadores entendeu é que, se o Judiciário não tomar providência sobre a corrupção em outro poder, a intervenção será necessária. Como militar da ativa, ele está opinando sobre assuntos políticos.
Temos que contextualizar. Ele estava num ambiente fechado, foi provocado em uma pergunta...
Mas não é a primeira vez que ele fala, né?
É, já tinha se manifestado em outra vez. Mas já conversamos. Ele não fala pelo Alto-Comando, quem fala pelo Alto-Comando e pelo Exército sou eu. Mas é uma questão que está sendo resolvida internamente.
Punição não vai haver?
Não. Nós já conversamos para colocar as coisas no lugar, mas punição formal não vai haver.