Em meio à crise institucional instalada a partir das apurações da Operação Lava-Jato, que investiga indícios de corrupção envolvendo políticos, incluindo integrantes do governo Temer, o ministro da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner de Campos Rosário, afirma que não há constrangimento na atuação do órgão que administra. Ele esteve em Porto Alegre nesta sexta-feira (18) para a posse do comando regional da pasta.
Responsável pelo setor que combate irregularidades dentro do serviço público federal, ele garante que possui a independência necessária para desempenhar a função.
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– Não me sinto constrangido. Quero deixar bem claro que o governo jamais teve qualquer tipo de influência descabida. Muito pelo contrário, temos o apoio muito grande para uma atuação independente – afirma.
O ministro defende a Operação Lava-Jato, dizendo acreditar que a “sociedade vai mudar seu comportamento” a partir do avanço das investigações. Sobre a atuação do Ministério da Transparência, ele destaca que a principal preocupação da pasta no momento é com a desburocratização e com a eficiência do setor público.
Rosário cita que há um pente-fino em andamento em quatro programas sociais, com potencial de cortes de R$ 10 bilhões referente a pagamentos indevidos. Contudo, não citou o montante de beneficiários atingidos com as suspensões.
– Tentamos auxiliar junto à tecnologia da informação, junto com os gestores, mostrar que a gente pode reduzir os gastos públicos de maneira responsável.
Convite
Antes de assumir o Ministério da Transparência, em 31 de maio, Rosário era o secretário-executivo do órgão. Ele foi alçado ao posto máximo depois que o antigo titular, Torquato Jardim, foi para o Ministério da Justiça e Segurança Pública, anteriormente chefiado pelo deputado federal Osmar Serraglio (PMDB-PR).
Serraglio chegou a ser convidado para o Ministério da Transparência, mas recusou o convite, voltando a assumir o mandato na Câmara Federal. Com isso, Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), político que foi flagrado recebendo R$ 500 mil em uma mala de executivos da JBS, deixou o Legislativo, perdendo o foro privilegiado. Ele chegou a ser preso preventivamente, mas foi solto menos de um mês depois.
Entrevista
Abaixo, os principais trechos da entrevista com o ministro da Transparência Fiscalização e Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner de Campos Rosário.
O Ministério da Transparência é estratégico no combate à corrupção. Como o senhor vê as indicações políticas em postos-chave no setor?
Ministro Wagner Rosário – Eu fui convidado pelo ministro Torquato Jardim, sou servidor da casa. Internamente, é claro que o ministro de Estado sempre tem uma visão de uma indicação política. Mas o funcionamento da casa como um todo é técnico. Todos os nossos chefes, das 26 regionais, são servidores de carreira. Todos indicados pela sua competência profissional. Fazemos nosso trabalho da forma mais imparcial possível, tentando sempre objetivar o interesse público. É um trabalho árduo e muito amplo.
O senhor chega ao comando da área no momento em que há uma crise ética e institucional no país, em que os próprios integrantes do governo respondem por diversos processos. O senhor se sente constrangido com essa situação?
Não me sinto constrangido. Quero deixar bem claro que o governo jamais teve qualquer tipo de influência descabida. Muito pelo contrário, temos o apoio muito grande para uma atuação independente. O governo tem reconhecido nossos problemas. Nós temos um sério problema orçamentário. O governo tem feito esforço para tentar recompor nossa atividade. Sempre que sou questionado sobre isso, sou muito claro. O trabalho que é tocado na CGU é de maneira independente. Não me sinto constrangido. Sou de um órgão que tenho um orgulho enorme de pertencer e tenho certeza de que vai contribuir muito para o crescimento do País.
Qual é a sua visão sobre a Operação Lava-Jato?
A Lava-Jato é a maior operação de combate à corrupção que nós já tivemos no País. Está abrindo à sociedade o funcionamento irregular de muitos organismos e da aplicação irregular do recurso público. Tenho certeza que toda a sociedade irá mudar seu comportamento a partir dessa operação. Acho que ela vai ter importância muito grande na mudança do nosso País.
Faltam servidores públicos para fiscalizar e controlar a aplicação de recursos federais?
A gente tem observado todo o cenário e acho que chegamos a um ponto, chegamos hoje numa crise fiscal sem precedentes, onde vamos ser obrigados a enxergar determinados custos, porque nós temos uma máquina pública que precisa se aprimorar. Tem que oferecer trabalhos consistentes, serviços para a sociedade com menor custo. Temos uma divisão errônea do efetivo de pessoas. Temos lugares com poucas pessoas para desenvolver atividades muito grandes e temos lugares que não têm uma importância estratégica tão grande com efetivo muito maior. Temos que racionalizar e a CGU é um importante parceiro para todos os órgãos. Temos que mostrar onde nós temos problemas, excesso de pessoas, de gastos e onde temos poucos recursos para trabalhar bem.
Onde faltam mais servidores?
Não tenho o levantamento de todos os ministérios, mas temos que melhorar o acompanhamento das políticas públicas, ou seja, os projetos. Ter uma visão de compliance(garantia de executar o trabalho em conformidade com as regras), integridade, gestão de riscos. O governo federal transfere o dinheiro para a ponta, mas às vezes não é feito um levantamento se aquela ponta tem condições de desenvolver aquele projeto. Muitas vezes você manda um recurso para a construção de uma escola, a escola é construída, mas, ao final, a prefeitura não tem condições de arcar com os custos de consumo, manutenção, professor. Então você tem a construção de uma escola, de uma creche e ao final ela não anda. É isso o que nós temos mostrado em vários trabalhos. Hoje, o nosso investimento tem sido mostrado para os ministérios. Fazendo um projeto mais consistente, sabendo que a ida do dinheiro vai com objetivo certo, e que a gente faça acompanhamentos mais pontuais. A redução da burocracia vai ajudar a gente a resolver esse problema.
O senhor pode trazer exemplos desses controles?
A CGU atua em várias áreas. Trabalhamos muito com os ministérios gestores para implementar a gestão de riscos. CGU, Ministério da Fazenda, Casa Civil, Ministério do Planejamento e os ministérios gestores estão cada vez mais juntos. Por exemplo, essas políticas que não estão andando. Por que elas não estão andando? Por que mesmo com o repasse elas não andam? Isso vai gerar racionalidade na execução dos recursos. Temos que nos unir e fomentar a participação da sociedade e temos que desburocratizar o serviço público. O decreto que trata do simplifique (conjunto de ações que regulam o atendimento em órgãos federais), a lei de proteção do usuário do serviço público, são avanços enormes, onde todo o cidadão vai saber que tipo de serviço público é prestado, fazer sugestões para melhorias com prazo de resposta. Esse conjunto vai mudar nossa realidade em um futuro próximo.
E as ações de economia?
A gente fez trabalhos que envolviam o Seguro Defeso, o Benefício de Prestação Continuada, o Auxílio-Doença e o Bolsa Família. Pegamos inconsistências cruzando bases de dados em um trabalho realizado junto com os ministérios mostrando quais são as fragilidades do programa. Nós identificamos um potencial de corte de gastos de R$ 10 bilhões. Exemplos: pessoas que estão no Bolsa Família e, quando cruzamos com outras bases, elas não cumprem o requisito de entrada no programa; em relação ao Seguro Defeso, quando a pessoa não é um pescador artesanal, tem outra profissão. Tentamos auxiliar junto à tecnologia da informação, junto com os gestores, mostrar que a gente pode reduzir os gastos públicos de maneira responsável.