Darcísio Perondi tem um jeito peculiar de responder aos interlocutores. Seja o assunto complexo ou desimportante, ele aspira o ar com força, contrai os músculos da face e esbugalha os olhos por trás dos óculos de aros finos. Ao soltar a respiração, a resposta vem em rompantes. Nos últimos meses, o cacoete vem sendo praticado à exaustão pelo mais experiente parlamentar gaúcho na Câmara.
Aos 70 anos e no sexto mandato consecutivo de deputado, Perondi se notabiliza pela ostensiva ação na tropa de choque do Planalto, ora montando barricadas na defesa, ora atuando como aríete na tentativa de derrubar a denúncia de corrupção contra o presidente Michel Temer.
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Perondi sempre foi um militante carbonário. Em 1964, quando os militares tomaram o poder, era um estudante secundarista em Ijuí e, junto com alguns colegas, comandava um programa de rádio com uma hora de duração aos sábados. Três dias após o golpe, abriu o programa com um editorial contundente contra o novo regime. Ficou menos de 20 minutos ao microfone.
– Os militares vieram fechar a rádio – contou a ZH em 2007.
Esse ímpeto só arrefeceu nos anos 1970, quando percebeu que a política estudantil estava atrapalhando os estudos de Medicina na UFRGS. Afastado do diretório acadêmico, concluiu o curso e a especialização em pediatria. De volta a Ijuí, despontou como um dos mais atuantes médicos da comunidade e não tardou a assumir a presidência do hospital de caridade do município.
O cargo lhe deu projeção regional, mas também causou sua única condenação em 30 anos de vida pública. Em 2011, teve a sentença confirmada pelo Tribunal Federal Regional da 4ª Região por supostamente permitir que médicos cobrassem por consultas do SUS. Perondi ingressou com recurso especial no Superior Tribunal de Justiça, previsto para ser julgado em 8 de agosto. Se perder, pode se tornar inelegível.
Essa não é sua única preocupação eleitoral. No partido, colegas creditam a forma explosiva com que defende o governo às dificuldades enfrentadas nas urnas. Em 2014, embora tenha feito 109 mil votos – sua segunda maior votação em seis eleições –, foi o menos votado na bancada do PMDB gaúcho. Como fixou residência em Brasília, as visitas ao Interior são cada vez mais raras.
– Ele sempre foi meio outsider, mas agora quase ninguém está entendendo esse comportamento. Pode ser um álibi para depois cobrar a fatura em um novo governo, caso não consiga se reeleger – comenta um conhecedor do PMDB.
Pela Câmara, é comum encontrar parlamentares reclamando da forma hostil, por vezes agressiva, com a qual Perondi confronta a oposição ou até mesmo aliados que não defendam Temer com ênfase. Ao final da leitura do relatório de Sergio Zveiter (PMDB-RJ), no qual o deputado foi favorável à ação penal contra o presidente, Perondi acusou-o de atuar como promotor de Justiça. Houve uma altercação e Zveiter, faixa-preta de jiu-jitsu, ameaçou agredi-lo. Mais tarde, o gaúcho diria que o contendor fez apologia ao nazismo. Informado que Zveiter é o único judeu na Câmara, retratou-se.
Embora tenha 22 anos de Câmara, Perondi nunca foi expoente na Casa. Agora, diz aos mais chegados que deixou o baixo clero e vai todos os dias ao palácio "dar um abraço no Michel". A proximidade com o presidente começou no final de 2015, quando o PMDB pôs em marcha o impeachment de Dilma Rousseff. Com Osmar Terra (PMDB-RS), Perondi cabalava votos contra Dilma e atualizava planilhas de votos. Chegou a subir em caminhão de som e discursar durante protesto em frente ao Planalto. Então no auge da popularidade, ambicionava uma eleição ao Senado em 2018. Em acordo informal com Terra, ficou acertado que ambos reivindicariam a vaga no PMDB e o mais prestigiado internamente teria o apoio do outro.
Cassada a petista, Terra virou ministro, e Perondi ficou na Câmara, defendendo as reformas. Estava com Temer no Planalto quando eclodiu o escândalo da JBS, tendo ouvido com o presidente a gravação feita por Joesley Batista. Com o acirramento da crise política, foi para a linha de frente do governo, seja vergastando a oposição, os delatores da JBS e a Procuradoria-Geral da República, seja tentando convencer investidores internacionais, com a ajuda de um tradutor em conferências via Skype, de que "o país está no caminho certo". Seus passos são ensaiados. Todos os meses, usa R$ 7,2 mil da verba de gabinete para contratar conselhos do cientista político Paulo Kramer.
– Praticamente todo o PMDB defende Temer, mas vai até certo ponto e pisa no freio. O Perondi, não – diz um assessor parlamentar.