No momento mais dramático de seus 371 dias de governo, Michel Temer enfatizou em pronunciamento que não deixará o Palácio do Planalto. Com o presidente gravado pelo empresário Joesley Batista em uma conversa para avalizar a compra do silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sete pedidos de impeachment protocolados na Câmara, as reformas congeladas e o senador Aécio Neves (PSDB-MG) afastado do mandato, o país aguarda o desfecho da nova etapa da crise política, enquanto o Congresso já discute eleições diretas ou indiretas e possíveis substitutos de Temer, mesmo que, por ora, ele assegure que não capitulará.
– Não renunciarei. Repito: não renunciarei – afirmou Temer com o dedo em riste.
Escoltado por líderes da base e ministros, Temer falou por cinco minutos na tarde desta quinta-feira, depois de uma maratona de reuniões e especulações sobre seu futuro, questionado desde a noite de quarta-feira, quando a delação da JBS foi revelada pelo jornal O Globo. No mesmo salão onde empossou seus ministros após a abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff, em maio do ano passado, o presidente ergueu o tom de voz e bateu o punho no púlpito para afirmar que não teme delações e classificar a gravação como "clandestina", apesar de especialistas considerarem os áudios legais.
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– Não comprei o silêncio de ninguém – frisou Temer.
O pronunciamento freou os comentários sobre renúncia, intensificados depois que o ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou inquérito para investigar Temer. Mais cedo, o policial militar João Baptista Lima Filho, amigo do presidente, foi um dos alvos de operação da Polícia Federal, cujo principal atingido foi Aécio. Policiais fizeram buscas em endereços do tucano, que teve a irmã presa e foi afastado por Fachin do mandato – o ministro negou o pedido de prisão feito pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Pressionado por legendas aliadas a renunciar, Temer foi convencido do contrário pelos ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral). Em reuniões com a presença de deputados e outros ministros, os dois garantiram que o governo tem condições de suportar o turbilhão provocado pelo conteúdo da delação, que teve o sigilo retirado por Fachin.
– Não há dentro nem fora da política um sucessor natural a Temer, capaz de pacificar o país. Essa ausência vai ajudar a segurar a base e a acalmar os empresários. Se a base ficar, o mercado fica conosco – projeta um estrategista do presidente.
Foco é manter a base
Pelos próximos dias, o esforço no Planalto será para sustar a debandada da base, lembrando que uma nova troca de comando no país sustará a recuperação da economia. Minutos depois do pronunciamento, Temer chamou ao gabinete ministros do PSDB para pedir que permaneçam nos cargos. Os tucanos, contudo, têm o desembarque pronto, inclusive com fala de Fernando Henrique Cardoso favorável à renúncia de Temer caso as explicações não sejam convincentes.
O partido aguarda o impacto nas ruas da divulgação das gravações, movimento que será repetido por PP, PR, PSD, PTB e DEM. A bancada do PPS divulgou nota anunciado a saída da base governista, apesar de Raul Jungmann permanecer na pasta da Defesa – Roberto Freire pediu demissão na Cultura.
Sem popularidade e sob suspeição, Temer mantém a aposta na aliança com o Congresso para se sustentar no poder. A estratégia costurada é segurar a fidelidade de, ao menos, parte dos partidos. É o caso do DEM. Temer conta com a ajuda do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ) para rejeitas os pedidos de impeachment.
– Tenho certeza que Rodrigo não aceitará nenhum pedido de impeachment – disse Darcísio Perondi (PMDB-RS).
Pressão por renúncia continua
Nesta quinta-feira, deputados e senadores de diferentes siglas da base consideravam implodida a governabilidade do peemedebista, considerando sua queda "questão de tempo". A oposição incentivava o coro pela renúncia ou pelo avanço de um processo de impeachment.
– Quanto mais Temer se apegar ao cargo, mais grave fica situação do país – destacou Alessandro Molon (Rede-RJ).
A articulação em favor de eleições diretas será intensificada pela oposição, que já conta com o apoio de centrais sindicais e prepara um roteiro de manifestações pelo país. Na base governistas aparecem dissidentes pró-voto direto, com o argumento de que o atual Congresso não tem condições de escolher um presidente.
– A situação tende a se agravar, diante da perspectiva de que a delação da JBS aumente a relação de parlamentares investigados – prevê um integrante do PP.
Reunido para analisar a crise, o PT considera a cassação no TSE o caminho mais curto para eleições diretas, com a possível candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
– De acordo com a minirreforma eleitoral, se houver renúncia é eleição indireta, mas se a chapa for cassada é eleição direta – lembra Luiz Marinho (PT), ex-prefeito de São Bernardo do Campo (SP).