O texto da reforma trabalhista aprovado na Câmara opõe entidades empresariais e sindicalistas, mas também gera divergência entre especialistas na legislação. Para quem defende os empregados, as alterações retiram direitos e deixam as empresas mais fortalecidas. No outro lado da trincheira, as mudanças são vistas como favoráveis aos negócios no país por trazerem mais segurança jurídica e garantirem flexibilizações que também seriam favoráveis aos trabalhadores.
Para a advogada Karla Schumacher Vitola, especialista em direto do trabalho e sindical, um dos principais pontos é a prevalência do negociado sobre o legislado em um contexto de enfraquecimento dos sindicatos. O resultado, para ela, será a perda de força dos trabalhadores para manter direitos e benefícios. Karla lembra que é preciso considerar o contexto de mudança nas aposentadorias:
– Vem aí a reforma da Previdência, que fará as pessoas terem de trabalhar mais. Mas isso será em condições piores e com vínculos mais frágeis. Vai haver maior rotatividade nas empresas. Isso vai diminuir o tempo de contribuição, com os trabalhadores ganhando menos na aposentadoria.
No ramo empresarial, a advogada Renata Zanardi, sócia do escritório Andrade Maia, vê a reforma de outro ângulo. Para ela, as alterações livram o país do engessamento de uma legislação antiga, que não acompanhou as mudança no mundo do trabalho:
– Muitas pessoas preferem fazer o intervalo de almoço de apenas meia hora para chegar mais cedo em casa. Essas mudanças também terão efeitos positivos para a economia porque hoje, com a legislação atual, muitas empresas resistem em contratar.
A sobreposição do acordado sobre o legislado, diz Renata, servirá para que empregados e empregadores possam decidir necessidades específicas de cada setor e categoria, sem mexer em temas como férias, 13º e FGTS.
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Veja a opinião das especialistas sobre alguns pontos que podem ser alterados:
A divergência em torno da proposta de reforma trabalhista não se resume aos políticos e se estende ao meio jurídico. Para Karla, que é especialista em direto do trabalho e sindical, haverá precarização. Já Renata entende que os trabalhadores também serão beneficiados.
Jornada de trabalho
Contra: a crítica se refere à possibilidade de os trabalhadores virem a ter jornada maior, sem contrapartida no vencimento, uma vez que hoje a nona e a décima horas são remuneradas com 50% a mais.
A favor: seria uma forma de abrigar na legislação algo que na prática já existe, diminuindo o número de ações trabalhistas, uma vez que na prática haveria muitos casos de jornada maior, mas sem registro. O trabalhador poderia receber de forma correta pelo trabalho após a jornada usual.
Jornada 12 x 36 horas
Contra: a liberação de jornada maior para todos traria aumento de carga horária mesmo para categorias onde não haveria justificativa, o que poderia significar redução de direitos dos trabalhadores.
A favor: com essa alteração, a jornada mensal soma 176 horas, enquanto que a atual, de 44 horas semanais, soma 196 horas por mês. Portanto, pode ser um benefício ao trabalhador.
Terceirização
Contra: há risco de precarização das condições de trabalho, salário e responsabilização da empresa. A contratante passa a responder pelas questões trabalhistas apenas após esgotar as possibilidades de responsabilizar a terceirizada, o que alonga o caminho para o funcionário buscar seus direitos na Justiça.
A favor: a garantia de que o trabalhador não será demitido e contratado como terceirizado para realizar as mesmas tarefas é positiva e seria uma proteção ao trabalhador sob a CLT.
Contribuição sindical
Contra: levaria a enfraquecimento dos sindicatos, que com menor receita ficariam fragilizados em sua estrutura de defesa das categorias, com reflexo nas negociações coletivas.
A favor: o benefício seria dar ao trabalhador o direito de escolher pagar ou não a contribuição.
Férias
Contra: muitos trabalhadores já serão submetidos a jornadas maiores e, ao mesmo tempo, vulneráveis pelas alteradas, podem ser pressionados pelas empresas para tirar um período menor de férias, sem terem o descanso necessário.
A favor: seria uma prática que agora passaria a ser prevista em lei. Como é feita por negociação, pode ser feita de acordo com as necessidades do próprio funcionário. Além disso, retira a obrigação de pessoas com mais de 50 anos necessariamente terem férias de menos de 30 dias.
Gestantes
Contra: a gestante poderia se sentir pressionada a forçar a permanência no trabalho e, com isso, ocasionar acidentes de trabalho que coloquem em risco mãe e bebê. Seria uma proteção que ficou fragilizada.
A favor: a mudança poderia abrir mais mercado de trabalho para mulheres em setores que hoje teriam receio de contratá-las devido à limitação atual. A garantia de que não haveria risco à saúde viria do atestado médico.
Rescisão contratual
Contra: a possibilidade de o trabalhador fazer a rescisão sem a intermediação do sindicatos pode fazer com que muitos, sem conhecimento dos seus direitos ou coagido, faça acordo desfavorável para ele e, no futuro, limite a busca por alguma diferença na Justiça.
A favor: o trabalhador poderá ser beneficiado com maior agilidade na homologação, recebendo de forma mais rápida verbas rescisórias e ter acesso a outros benefícios, como o seguro-desemprego e FGTS. Eliminaria problemas como demora muito grande para agendar homologação nos sindicatos.