O placar apertado na aprovação da terceirização irrestrita do trabalho ligou o alerta no Palácio do Planalto e levantou dúvidas no mercado sobre a força do governo para emplacar as reformas da Previdência e trabalhista. Apesar da ampla base de apoio ao presidente Michel Temer, o projeto passou com 231 votos a favor e 188 contra, uma diferença de 43 parlamentares. Se o tema fosse objeto de proposta de emenda à Constituição (PEC), como a reforma da Previdência, teria sido derrotado. Mudanças constitucionais exigem, na Câmara, o aval de 308 dos 513 deputados.
No dia seguinte à votação, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, tentou minimizar o placar. Segundo ele, a reforma da Previdência é um projeto distinto e os parlamentares vão levar em conta o impacto das alterações na recuperação da economia.
– A Previdência Social é outro projeto, outra discussão. Estamos trabalhando arduamente para conseguir que seja aprovado – disse Meirelles.
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O otimismo demonstrado pelo ministro não reflete a avaliação de quem atua na articulação política do governo. Desde a semana passada, líderes dos principais partidos que apoiam Temer falavam que a terceirização seria um "teste" para conferir o tamanho da base em iniciativas polêmicas, com reflexo direto na vida dos trabalhadores. Por isso, embora suficientes por ora, os 231 votos obtidos na quarta-feira preocupam.
Como a oposição reúne cerca de cem parlamentares, o Planalto contabiliza mais de 80 traições, inclusive no PMDB, legenda de Temer. Dos 44 peemedebistas que participaram da votação, 10 foram contra a terceirização, entre eles o gaúcho José Fogaça.
Os principais aliados também registraram defecções. No PSDB, foram 11 deputados a negar apoio ao governo. Sigla do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, o DEM teve sete votos contrários, mesma soma do PP, partido do líder do governo, Aguinaldo Ribeiro.
– O Planalto não tem votos para mudar a Previdência. A votação da terceirização mostra que a pressão de fora para dentro do Congresso é mais eficaz do que a pressão exercida pelo palácio com cargos – afirma a deputada Maria do Rosário (PT-RS).
Na estratégia para viabilizar as reformas, o Planalto avalia votar primeiro alterações na legislação trabalhista, feitas em um projeto de lei, cuja aprovação exige menos votos do que uma PEC. O cronograma do governo prevê apreciar a proposta no final de abril.
No caso da Previdência, o Planalto confia em aprovação fácil na comissão especial e mapeia o apoio à votação decisiva, em plenário, prevista para maio. Temer já recuou nesta semana ao excluir da reforma servidores estaduais e municipais. O cenário indica novas flexibilizações. É provável que o governo aceite mudanças em aposentadoria rural, regra de transição, período de contribuição e benefícios de prestação continuada.
Além de desidratar a versão original da PEC, o governo pretende enquadrar os deputados, barganhando cargos na máquina federal. O caminho é tido como o mais viável para vencer a resistência de parlamentares, preocupados com a repercussão das propostas junto aos eleitores a pouco mais de um ano das eleições.