A Rede Sustentabilidade entrou com um recurso contra a decisão do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, que, na semana passada, manteve a nomeação de Moreira Franco (PMDB) como ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República. O PSOL, que também tem uma ação contra a nomeação, já havia entrado com recurso na sexta-feira passada. Celso de Mello, quando anunciou sua decisão, havia dito que, se houvesse recurso, remeteria o caso ao plenário – o que ainda não fez.
Em 24 páginas, a Rede, representada pelo advogado Márlon Reis – um dos propositores da Lei da Ficha Limpa – contesta a argumentação de Celso de Mello de que "a prerrogativa de foro não confere qualquer privilégio de ordem pessoal a quem dela seja titular" e que não leva a nenhum tipo de obstrução de processos.
Leia mais
PSOL recorre da decisão de ministro do STF que manteve Moreira Franco ministro
Quem são os ministros de Temer já citados em delações da Lava-Jato
Temer vê com "tranquilidade" decisão de manter Moreira Franco como ministro
Também reforça a semelhança com o mandado de segurança contra a nomeação de Luiz Inácio Lula da Silva por Dilma Rousseff – que foi suspensa pelo ministro Gilmar Mendes, em liminar – e cobra que sejam divulgadas as informações que envolvam Moreira Franco nas delações homologadas da Odebrecht. O ministro aparece em planilhas, e em relatos, como sendo o Angorá.
O recurso da Rede cita o despacho em que o ministro Luís Roberto Barroso falou sobre "disfuncionalidade prática do regime de foro privilegiado", que "o sistema é feito para não funcionar" e que "se tornou uma perversão da Justiça". Barroso disse também que o foro "dá privilégio a alguns, sem um fundamento razoável". E que "Cortes Constitucionais, como o STF, não foram concebidas para funcionarem como juízos criminais de 1º grau, nem têm estrutura para isso."
O partido também cita dados do "Supremo em Números", projeto da FGV Direito Rio, apontando que, "de 404 ações penais concluídas entre 2011 e março de 2016, 276 (68%) prescreveram ou foram repassadas para instâncias inferiores porque a autoridade deixou o cargo. A condenação ocorreu em apenas 0,74% dos casos."
"Há sim fundamento relevante e urgência decorrente de que do ato impugnado pode resultar a ineficácia da medida, já que, conforme dados objetivos como os descritos acima, inclusive ratificados por Ministro operante na Corte e instituição de pesquisa jurídica de reputação nacional ilibada, indicam a baixa exequibilidade criminal e investigativa do Supremo diante de sua estrutura e excesso de processos, o que pode retardar ou frustrar o andamento das investigações e apurações em desfavor de Moreira Franco em atentado à moralidade, de interesse público relevante. Evidente, enfim, a presença de plausibilidade jurídica ("fumus boni juris") e a possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação ("periculum in mora")", diz a peça.
A Rede afirma que "nenhuma razão de interesse público justificava a elevação de uma Secretaria da Presidência à condição de Ministério, senão para a concessão de foro privilegiado para o cargo de Ministro recém criado". Diz também que isso seria uma "contradição ao discurso oficial de enxugamento" do governo interino.
Em relação à comparação entre as nomeações de Luiz Inácio Lula da Silva e Moreira Franco, o partido afirma que "o único ponto diferenciador é que, para Moreira Franco, um Ministério foi criado sem razões de interesse público que as justifiquem. O que sugere um indício muito mais alarmante de vício por desvio de finalidade". Afirmou também que a decisão de Gilmar Mendes no caso de Lula criou precedente.
Delação
A Rede Sustentabilidade também pede a divulgação dos trechos das delações da Odebrecht que mencionam Moreira Franco.
"Impõe-se por este colegiado o deferimento do pedido de acesso aos documentos investigativos que envolvam a pessoa do Ministro Moreira Franco nas operações investigativas da Operação Lava-Jato, tanto por dever republicano de transparência quanto para o efetivo e necessário deslinde desta demanda. São documentos que robustecem ainda mais a demonstração de relação entre a nomeação, a criação do ministério, e o andamento das investigações na Operação Lava-Jato", diz Marlon Reis, que assina a peça da Rede Sustentabilidade.
A peça também afirma que "a delação não é meio de prova, mas meio de obtenção de prova". "ê desnecessária a análise de quão grave é a situação processual penal de Moreira Franco nos autos que responde perante o Supremo. O que se precisa esclarecer é que o ato de homologação das delações (e não a mera existência da delação) sugere uma proximidade iminente de elementos de provas que podem culminar em atos investigativos relevantes e agressivos, porém necessários para a persecução penal: os pedidos de medidas cautelares penais (pessoais ou reais) e o oferecimento de denúncias. Por isso a pressa na criação do Ministério. Por isso a relação de desvio de finalidade", diz a Rede.
*Estadão Conteúdo