Maior líder popular da história recente do país, Luiz Inácio Lula da Silva foi recebido com entusiasmo por parlamentares petistas ao desembarcar de um Ford Edge na chapelaria do Congresso às 9h03min desta segunda-feira. Não havia, contudo, motivo para tamanha efusão. No plenário do Senado, minutos depois, ele assistiria impotente à derradeira tentativa de Dilma Rousseff preservar o mandato.
Hospedado desde domingo em um hotel de Brasília, Lula vinha tentado cabalar votos em prol da herdeira política. Conversou com senadores e aliciou líderes partidários, numa ofensiva frustrada para evitar o impeachment. O petista dedicou especial atenção ao senador e ex-ministro Edison Lobão (PMDB-MA), para o qual pediu os três votos da bancada maranhense. O apelo chegou aos ouvidos de Michel Temer, que neutralizou o movimento, deixando Lula sem margem para uma manobra de última hora. O fracasso do lobby já era esperado por aliados.
– Não existe ninguém que influencia todo mundo. Não é porque Lula veio para cá que vamos virar o jogo – admitia a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO).
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Trajando terno cinza e sem gravata, o petista acompanhou o depoimento de Dilma da segunda fileira de poltronas das galerias do Senado. Sentado entre o compositor Chico Buarque e o advogado Marcelo Lavenère, autor do pedido de impeachment de Fernando Collor, parecia vivenciar um pêndulo de sensações. Por ora, permanecia compenetrado nas palavras de Dilma, que poucos metros abaixo era inquirida pelo tribunal de senadores. Em outros momentos, cofiava a barba e balançava a cabeça, em sinal de contrariedade com as perguntas de seus adversários.
Pelo menos uma vez, recorreu a um bilhete para orientar a fala de Dilma, sugerindo que, diante das perguntas repetidas dos senadores, ela fizesse "uma fala para o Brasil". O recado já havia sido dado no domingo, quando o ex-presidente chegara à cidade para discutir com a sucessora o teor do discurso. Na ocasião, Lula pediu uma fala mais política do que jurídica, privilegiando a retórica do golpe em detrimento de explicações técnicas sobre a suposta legalidade das pedaladas fiscais.
Lula voltaria ao palácio na manhã desta segunda, para um desjejum com Dilma e o séquito que os acompanhariam no depoimento. Tão logo chegou ao Senado, o grupo esperou por cerca de meia hora numa sala cedida pelo presidente Renan Calheiros (PMDB-AL). Enquanto descansava em um sofá, Lula posou para selfies e participou de transmissões ao vivo pelo facebook. Depois de iniciado a interrogatório, o petista deixou o plenário poucas vezes.
No intervalo para o almoço, às 13h, voltou a estar com Dilma e a comitiva na área reservada da presidência do Senado. Serviu-se em um bufê oferecido pela Casa, no qual havia pene ao molho, legumes gratinados, escalopes de filé, estrogonofe de frango e salada.
Enquanto digeria a refeição, o petista fez uma avaliação positiva do discurso de Dilma. Concluiu que a presença em plenário da presidente afastada intimidou os senadores favoráveis ao impeachment, que teriam adotado um tom comedido para fazer as perguntas, e elogiou a firmeza exibida das respostas. Apesar das frequentes manifestações de solidariedade, Lula não cumpriu a promessa feita à mulher para a qual passou a faixa presidencial.
Quando o processo de impeachment foi deflagrado, ele havia garantido que iria percorrer o país denunciando o "golpe" e convocando à resistência as bases populares do PT. O que se viu, porém, a despeito de sua presença na antevéspera do final do julgamento, foi um ex-presidente abatido e resignado com a derrocada de seu projeto político.
*Zero Hora