A três meses das eleições, as prefeituras do Rio Grande do Sul enfrentam uma situação de penúria poucas vezes vista. A combinação entre a histórica desigualdade na divisão do bolo tributário com Estados e União, o aumento das despesas e a queda vertiginosa da arrecadação em razão da crise econômica esvaziou cofres e planos de gestão.
Em consequência da privação financeira, gastos e investimentos foram cortados, o que prejudica a prestação de serviços à população em áreas como saúde, educação e mobilidade. Ao mesmo tempo, faz com que cerca de um terço dos prefeitos aptos a concorrer à reeleição esteja disposto a abandonar a disputa pelo poder. Muitos cogitam até deixar a vida pública, tamanho o sentimento de desânimo.
Se dependesse apenas de dinheiro próprio – aquele que vem da cobrança de tributos locais, como o IPTU e o ISS –, nenhuma das 497 administrações espalhadas pelo Estado seria capaz de bancar suas contas. Isso ocorre porque menos de um quinto (18%) de tudo o que se arrecada no país pinga no caixa das prefeituras, tradicionalmente dependentes de repasses dos governos federal e estadual.
Esse problema crônico se agravou, nos últimos dois anos, à medida que o país mergulhou no abismo da crise: o valor arrecadado em tributos despencou, derrubando as remessas da União e dos Estados para as gestões municipais, enquanto as despesas aumentaram impulsionadas pela inflação em alta.
O descompasso se traduz em malabarismos contábeis para evitar déficits e, na prática, em menos dinheiro para melhorias. Significa ruas mais esburacadas, dificuldade para manter postos de saúde e construções pela metade.
Em 2015, a asfixia nas finanças fez com que 28,8% dos municípios gaúchos fechassem as contas no vermelho e 71% aplicassem menos de 10% de suas receitas em obras e outros benefícios – no Estado, o valor médio investido por habitante não passou de R$ 195. Em paralelo, o gasto com a folha de servidores superou o limite de alerta da Lei de Responsabilidade Fiscal em 37% das administrações.
Aflitos diante da perspectiva de piora nas condições para governar, muitos prefeitos se veem diante de um impasse. De 152 gestores autorizados a buscar o segundo mandato, 51 avaliam desistir da campanha, conforme levantamento da Federação das Associações de Municípios do Estado (Famurs). É o caso do prefeito de Dom Pedrito, Lídio Bastos (PMDB).
– A insônia foi uma companheira constante nesses últimos anos. Desisti – desabafa Bastos, que já anunciou a decisão de abandonar o palanque.
Elaborada a partir do cruzamento de mais de 5 mil registros contábeis de 2015 disponíveis no portal do Tribunal de Contas do Estado (TCE), a radiografia das finanças municipais marca o início da cobertura eleitoral em Zero Hora e a estreia do selo ZH Dados – Eleições 2016, que passará a identificar as reportagens produzidas com base na compilação e análise de grandes volumes de informações, sejam públicas ou privadas.