A decisão de suspender o mandato de Eduardo Cunha e consequentemente alçar o deputado Waldir Maranhão (PP-MA) à presidência da Câmara foi recebida com surpresa não só por grande parte do universo político brasileiro como também pelo próprio parlamentar. Segundo um assessor, Maranhão, que até então não fazia parte do primeiro escalão da Casa, "não esperava" acordar no comando do parlamento – tanto que cancelou a sessão de ontem, acomodou-se na sala da presidência e convocou dezenas de colegas para "ver que caminho tomar".
Descrito por reportagem da revista IstoÉ em fevereiro de 2015 como "um parlamentar sem muita visibilidade em Brasília e com atuação discreta na área de educação", Maranhão não é dos mais ativos da Câmara. O site Atlas Político destaca quatro pontos ideológicos que marcam sua atuação : a defesa da exploração privada do petróleo, o posicionamento contra o aborto, o ambientalismo e o apoio ao parlamentarismo. O mais recente projeto de lei apresentado foi em maio de 2014, quando pediu alterações em uma lei de 1997 "para assegurar ao usuário (de celular) o direito de ser informado, antes de a chamada ser completada, sobre a incidência de despesas de interconexão".
Leia mais:
Assessores de Maranhão dizem ser "impossível" ele renunciar ao cargo
Maranhão se reúne com deputados para "ver que caminho tomar"
Deputado que assumirá a presidência da Câmara também é alvo da Lava-Jato
Os últimos pronunciamentos em plenário antes da votação do impeachment foram em 2015: em 24 de novembro, pediu respostas sobre o desastre de Mariana; cinco dias antes, declarou como "urgentes" medidas para a redução do consumo de drogas no Brasil; em outubro, homenageou o Bumba Meu Boi; em setembro, mostrou preocupação com os índices de violência no Maranhão e homenageou São Luís no aniversário de 403 anos da cidade.
Tornou-se vice-presidente da Câmara por meio de um grande acordo partidário no qual o PP ficou com a vaga. É filiado ao partido desde 2007 – antes, esteve no PDT (1985 a 1986), duas vezes no PSB (1986 a 1988 e 2005 a 2007) e no PTB (1988 a 2005).
No primeiro mandato, iniciado em 2006, quando foi eleito pelo PSB com 64.286 votos, 2,23% do total, licenciou-se para assumir o cargo de secretário Estadual de Ciência e Tecnologia do Maranhão, na gestão de Roseana Sarney (PMDB), entre maio de 2009 e abril de 2010, ano em que foi reeleito com 106.646 votos, já pelo PP. Entre os dois mandatos, tentou tornar-se prefeito da capital maranhense, São Luís, na coligação que reunia PP e PV, partido que indicou o vice, José William de Paula Souza Júnior. Maranhão recebeu pouco mais de 2,6 mil votos, cerca de 0,5% do total, e ficou em nono lugar entre os 10 candidatos – o pleito acabou vencido por João Castelo (PSDB-MA), que atualmente é colega de Maranhão na Câmara. Veterinário por formação, foi reitor da Universidade Estadual do Maranhão (Uema) antes de entrar na vida política.
Descrito por interlocutores como um dos muitos aliados de Cunha no Congresso, Maranhão não assume a pecha. A assessoria do deputado diz que ele não externa posicionamento sobre o presidente afastado – ainda que tenha sido eleito vice com o apoio do peemedebista. Em seu voto contra o afastamento da presidente Dilma, referiu-se a Cunha como "meu presidente querido".
Nas redes sociais, Maranhão chama o processo de impeachment de "golpe contra a democracia e contra a Constituição" – tanto que foi tratado como herói pelo governador de seu Estado, o comunista Flávio Dino (PC do B-MA) –, o que não impediu que ajudasse o ex-presidente da Câmara ao limitar a apuração sobre Cunha no Conselho de Ética, decidindo que o peemedebista poderia ser investigado apenas pela suspeita de que teria contas secretas no Exterior e de que teria mentido sobre a existência delas, e não pelas acusações de recebimento de propina.
– Ninguém nunca viu ele tomar café com Cunha, bater papo com Cunha. Ele foi eleito em uma chapa separada. Não é aliado, não é parceiro, não tem nada disso – disse um assessor, que preferiu não se identificar.
Investigado pela Lava-Jato, o presidente interino da Câmara também não se pronuncia sobre as denúncias de corrupção envolvendo seu nome, mas está "absolutamente tranquilo", conforme interlocutores. De acordo com as investigações, o doleiro Alberto Youssef, condenado por lavagem de dinheiro e investigado por outros crimes na operação da Polícia Federal, afirmou que Waldir Maranhão foi um dos políticos do PP que teriam recebido propina por meio de uma empresa usada pelo doleiro para distribuir verba oriunda de contratos da Petrobras. O deputado, contudo, ainda não se tornou réu, ao contrário de Cunha.
Além da investigação da Lava-Jato, Maranhão também é alvo de outros dois inquéritos que também tramitam no STF, nos quais é acusado de crimes como lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos ou valores – ele é citado, por exemplo, em inquéritos da Operação Miqueias, deflagrada pela Polícia Federal em 2013. Os processos, segundo a revista IstoÉ, narram possíveis relações entre o deputado e o doleiro Fayed Traboulsi, preso no final de 2013 por supostamente participar de um esquema de lavagem de dinheiro e desvio de recusrsos de fundos de pensão, esquema que movimentou R$ 300 milhões em um ano e meio. No processo, que possui mais de mil páginas, há ligações e conversas entre Traboulsi e Maranhão. O deputado do PP também traz no currículo outros questionamentos na Justiça Eleitoral. Ele teve contas de campanha de 2010 para a Câmara rejeitadas pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MA). Sobre as denúncias, Maranhão disse, em entrevista ao site Congresso em Foco, que as investigações deixariam claro que ele era inocente.
Em sua última declaração de patrimônio entregue ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2014, Maranhão disse possuir R$ 813 mil em bens, valor correspondente a uma casa avaliada em R$ 350 mil e um consórcio no valor de R$ 463 mil. Mesmo assim, o deputado declarou ter doado R$ 550 mil à sua própria campanha à reeleição, em 2014.