Temer deixou Tietê em 1956, aos 15 anos, para estudar na capital. Tornou-se o filho ilustre da cidade – expressão eternizada em uma placa em frente ao coreto da praça central – e volta sempre que pode. Nas viagens particulares, geralmente chega de helicóptero, o que faz os moradores olharem para o céu diante de qualquer ruído semelhante à aeronave.
– Olha lá o Michel Temer – disse um gaiato, quinta-feira passada, grito que se ouviu do segundo andar da prefeitura.
Temer já foi visto desembarcando de helicópteros que pertenciam a uma firma de assessoria empresarial de São Bernardo do Campo e de uma agropastoril do Mato Grosso do Sul, de acordo com os registros do aeroclube local. Sempre que isso acontece, seus assessores exigem que ele não seja fotografado próximo ao aparelho.
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Neste ano, Temer esteve duas vezes em Tietê. Em janeiro, telefonou no fim da manhã para o prefeito Manoel David (PSD), perguntando se poderia visitá-lo. Uma hora e meia depois, chegou para o almoço, não sem antes se reunir com aliados no salão nobre da prefeitura, hábito construído nos seis mandatos de deputado federal, quando políticos da região formavam fila para despachar com ele no gabinete do prefeito.
– Estava precisando respirar uns ares de saudade, que me tragam ao meu lugar verdadeiro. Os eventuais inimigos que tenho em Brasília que se acautelem, pois com a força que levo aqui de Tietê ninguém nos derruba – discursou.
Reconhecido nas ruas, abandonado na urna
Apesar das cerimônias de beija-mão, Temer nunca foi unanimidade na terra natal. Na semana passada, dois moradores discutiam diante de um antigo comitê eleitoral, ainda hoje preservando a pintura decrépita de suas campanhas.
– Uma vez ele prometeu R$ 2 milhões para a Santa Casa, mas mandou só 10%. Temer ficou muito soberbo. Diante do que tinha na mão, fez muito pouco por Tietê – reclamou um deles.
– Não vai falar mal do Michel, senão aí mesmo que ele não manda nada para a cidade – argumentou o outro, ambos pedindo anonimato.
Em 2006, na última vez que concorreu a deputado, Temer nem sequer foi o mais votado do município – fez 3.627 votos entre os mais de 20 mil eleitores que foram às urnas. Como vice de Dilma, perdeu nos dois turnos de 2010 e 2014.
Nessa última disputa, a propaganda feita pelos correligionários de Tietê citava com discrição que Dilma era a cabeça de chapa. Não há uma única foto da candidata no panfleto de seis páginas, enquanto Temer aparece em 11 imagens. O material enumera investimentos federais na cidade, com o 13 do PT grafado na cor azul, e não no tradicional vermelho do partido. Segundo os idealizadores da propaganda, o objetivo era não desagradar os eleitores antipetistas. – O povo é muito ingrato. Temos mais de R$ 50 milhões em obras públicas e, sempre que apresento um projeto, Temer liga para o ministro da área, pedindo atenção especial a Tietê, dizendo que, do contrário, não poderia mais voltar aqui – relata Manoel David.Atualmente, a obra mais vistosa é uma ponte pênsil sobre o Rio Tietê. Apresentada em outdoors como a maior passarela em madeira do hemisfério sul, foi orçada em R$ 4,4 milhões e deveria estar concluída em junho deste ano. Entretanto, apenas os pilares de sustentação da obra foram erguidos, e os trabalhadores foram dispensados há um mês.