O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enumerou, em ação de dezembro de 2015, em petição ao Supremo Tribunal Federal (STF), 11 motivos para o "necessário e imprescindível" afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), do mandato de parlamentar e de líder da Casa. Na manhã desta quinta-feira, o ministro do STF, Teori Zavascki, determinou o afastamento de Cunha do mandato de deputado federal, atendendo à ação de Janot.
No pedido, o procurador-geral apresentou um capítulo intitulado "Dos atos que visaram embaraçar e impedir a investigação de organização criminosa", no qual aponta as razões que justificam o afastamento de Cunha. Confira quais são elas:
1) Pressão para receber propina por meio de requerimentos na Comissão de Fiscalização referentes a Julio Camargo e o Grupo Mitsui
A PGR diz que dois requerimentos foram elaborados por Cunha, utilizando sua senha pessoal e login de rede, e que eles foram apenas inseridos no sistema da Câmara pela então deputada federal Solange Almeida. Após a autoria dos requerimentos vir à tona, Cunha exonerou Luis Carlos Eira do cargo de Diretor de Informática da Casa. Segundo a PGR, além do caso envolvendo as sondas, as práticas de "achaque" ocorreriam desde 2003.
2) Mesmos instrumentos de pressão utilizados contra o grupo Schahin
A PGR aponta que Eduardo Cunha estaria por trás de mais de 30 requerimentos e convocações feitas para pressionar os donos do grupo Schahin, com apoio do empresário Lúcio Bolonha Funaro. Salim Schahin descreveu com detalhes à Justiça a perseguição que a empresa teria sofrido dentro do Congresso, especialmente por parte de Cunha. A rixa ocorreria para beneficiar Funaro, que é adversário de Schahin.
3) Convocação da advogada Beatriz Catta Preta para a CPI da Petrobras
O objetivo dessa convocação, conforme a PGR, seria constrangê-la por ter auxiliado Julio Camargo a incriminar Eduardo Cunha. A PGR sublinha que o presidente da Câmara teria usado seus aliados para "constranger e intimidar quem ousou contrariar seus interesses". Beatriz é uma advogada criminalista que defendeu nove delatores da Lava-Jato.
4) Contratação da empresa de investigação Kroll pela Câmara por R$ 1 mi
A intenção de Eduardo Cunha ao contratar a Kroll, diz a PGR, seria descobrir algo para comprometer os acordos de delação premiada. A Procuradoria aponta que a Kroll tem "atuação controvertida no Brasil".
5) Pressão sobre o Grupo Schahin na CPI da Petrobras e convocação e afastamento do sigilo de parentes de Alberto Youssef
Cunha teria usado, segundo a PGR, a CPI para convocar parentes do doleiro Alberto Youssef como forma de pressão. Na delação premiada, o doleiro confirmou que Cunha recebeu propina oriunda da negociação de navios-sonda adquiridos da Samsung.
6) Manobras para viabilizar projetos de lei que poderiam evitar sua própria incriminação
A PGR afirma que Eduardo Cunha abusou do poder para mudar a lei e impedir que um delator corrija ou acrescente informações em depoimentos já prestados. É o projeto de lei nº 2755/2015, do deputado Heráclito Fortes (PSB-PI).
7) Retaliação contra que contrariam seus interesses
Com a demissão do diretor de informática da Câmara, Luiz Eira, Cunha teria demonstrado, ressalta a PGR, que quem o contraria sofre consequências. Membros da bancada do PSOL e da Rede Sustentabilidade estariam sendo retaliados pelo presidente da Casa por levarem adiante a representação pela cassação dele no Conselho de Ética.
8) Participação em atos legislativos para favorecer bancos e empreiteiras e receber vantagens indevidas
Para aprovar parte de Medida Provisória de interesse do banco BTG Pactual, de André Esteves – preso pela Lava-Jato –, Cunha teria recebido vantagens indevidas, sustenta a PGR. Isso teria ocorrido em pelo menos mais 10 MPs.
9) Manobras para evitar punições no Conselho de Ética
Cunha responde a representação por quebra de decoro parlamentar e, para escapar de penalizações, teria utilizado, de acordo com a PGR, "manobras espúrias" como obstrução da pauta e início de sessão com a presença de quórum abaixo do exigido para votações.
10) Ameaças ao ex-relator do processo de cassação no Conselho de Ética
Um dos parlamentares do Conselho de Ética relatou à PGR que Fausto Pinato (PRB-SP) teria recebido ameaças e que sua família sofrera constrangimento durante um trajeto realizado de carro em Brasília. O responsável, segundo a Procuradoria, seria Eduardo Cunha.
11) Novas ameaças e oferta de propina ao ex-relator do processo de cassação
Após o afastamento do processo de cassação de Cunha, Pinato disse que foi abordado por pessoas em um aeroporto e que sofreu ameaças, além de ter recebido, de maneira velada, ofertas de vantagem ilícita pela sua posição de relator.
CONTRAPONTO
O que disseram, à época, os advogados de Eduardo Cunha ao STF:
A defesa do presidente da Câmara afirmou em petição entregue ao Supremo que os "11 atos" em que se baseia o procurador-geral da República são "todos impertinentes".
"A petição inicial aponta 11 'atos' que ao ver do Procurador-Geral da República justificariam a providência cautelar. Os tais 'atos', todos impertinentes, sequer foram comprovados mediante prova idônea", diz a defesa do presidente da Câmara.
Janot aponta no documento um suposto 'modus operandi' de Eduardo Cunha que usaria seus aliados para 'constranger e intimidar quem ousou contrariar seus interesses'.
A defesa de Cunha aponta que, é "comum na administração pública em geral a mudança de seus ocupantes sem que isso represente qualquer indício de irregularidade".
Sobre o abuso de poder, citado por Janot em relação a Cunha, os advogados afirmam que, "o projeto de Lei nº 2755/2015 não se enquadra em nenhuma das hipóteses de apreciação e votação pelo Plenário da Câmara dos Deputados, de forma a tornar absolutamente ilegítima a insinuação de que o requerente, por meio de seu ato, buscaria subtrair do Plenário a competência para apreciação de tal projeto de lei".
Em resposta ao pedido de afastamento de Cunha do mandato de Deputado Federal e da Presidência da Câmara dos Deputados, a defesa aponta:
"Quanto ao ponto, ainda que fossem verdadeiros tais fatos – o que se admite apenas para argumentar – haveria necessidade de afastamento do ora requerente para fins de apuração dos ilícitos investigados nos Inquéritos nº 3983 e 4146 apontados como justificativa para o ajuizamento da presente medida cautelar? A resposta, sem sombra de dúvidas, é negativa. Não se pode perder de vista que a medida constritiva cautelar pretendida nessa ação deve possuir relação com o procedimento criminal de que decorre, ou seja, com a apuração de supostos desvios de valores decorrentes de contratos firmados pela Petrobras".