O presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), apresentou, em sessão de quase sete horas de duração nesta quinta-feira, sua defesa no Conselho de Ética da Casa. Ele voltou a negar que tenha mentido durante a audiência da CPI da Petrobras, quando afirmou não ter contas no exterior em seu nome. Além disso, Cunha alegou que seu afastamento teve "objetivo oculto" por parte do Supremo Tribunal Federal (STF).
– Essa decisão foi construída para ter algum tipo de objetivo – afirmou.
Segundo ele, o tempo dirá qual era o "objetivo" da Corte. Cunha também voltou a dizer que foram erros no processo que adiaram a análise de sua denúncia.
– Querer me culpar do atraso do tempo do processo é me atribuir atos que não pratiquei – defendeu.
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A defesa do presidente afastado da Câmara terá agora prazo de cinco dias úteis para apresentar suas razões antes da apresentação final do relatório no Conselho. O advogado de Cunha, Marcelo Nobre, classificou o prazo como "absurdo", por não estar previsto no regimento interno. A defesa de Cunha também alega que a denúncia contra ele foi ampliada, o que não poderia ter sido feito.
Nobre afirmou que as acusações ligadas à Operação Lava-Jato apenas poderiam ser discutidas em uma nova representação, na qual a defesa teria tempo adequado e todos os demais elementos disponíveis para se defender. O presidente afastado concluiu seu depoimento, iniciado às 9h37min, por volta das 16h30min.
Conforme Cunha, a participação que tinha em um trust (tipo de negócio em que terceiros passam a administrar os bens do contratante) não representa patrimônio, mas "expectativa de direito". O peemedebista também utilizou a maior parte da apresentação de sua defesa para indicar supostas nulidades no processo contra ele por quebra de decoro parlamentar.
Ele defendeu que o relator do colegiado, deputado Marcos Rogério (DEM-RO), deveria ser impugnado da função, por ter mudado durante o processo do PDT para o Democratas, que faz parte do mesmo bloco partidário do peemedebista.
Assim que Cunha terminou de falar, o deputado Betinho Gomes (PSDB-PE) rebateu dizendo que não caberia o afastamento de Rogério, pois o que vale é a formação inicial do bloco, antes do início dos trabalhos. O colegiado investiga quebra de decoro parlamentar de Cunha por supostamente ter mentido à extinta CPI da Petrobras sobre a existência de contas no exterior em seu nome.
A presença de Cunha no Conselho encerra o período de oitivas e abre o prazo de dez dias para que o relator do processo, deputado Marcos Rogério (DEM-RO), apresente o parecer, que será lido e votado no Conselho de Ética. A expectativa da defesa é de que Marcos Rogério entregue o relatório antes mesmo do prazo final previsto, que seria o dia 30 de maio.
No último dia 5, o ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, determinou o afastamento de Cunha do mandato de deputado federal e da presidência da Câmara. A decisão liminar atendeu a um pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que acusou Cunha de tentar interferir na condução das investigações da operação.
Cunha diz que mantém "na íntegra" depoimento à CPI da Petrobras
O vice-presidente do Conselho de Ética, deputado Sandro Alex (PPS-PR), fez uma "brincadeira" durante seu questionamento ao deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) sobre possuir contas no exterior.
– Truste deve ser uma bênção, uma expectativa de vida, ele nasce, pena que não para todos os brasileiros – ironizou.
Cunha diz não possuir patrimônio, contas ou investimentos no exterior, e sim um truste.
– Aqui não há bênção do truste – respondeu Cunha a Sandro Alex. – Eu, como católico, acredito que bênção pode ser a boa gestão do patrimônio.
Indagado por Alex se gostaria de mudar a sua afirmação na CPI negando possuir contras na Suíça, Cunha disse que "mantém na íntegra todo o depoimento à CPI da Petrobras".
Ele não respondeu a pergunta de Alex sobre a sua relação com o lobista Fernando Soares, o "Baiano", que prestou depoimento no Conselho de Ética no último mês. Ao colegiado, Baiano contou que entregou cerca de R$ 4 milhões no escritório de Cunha, no Rio de Janeiro, e que frequentava a casa do parlamentar. Mais cedo, Cunha afirmou que Baiano "não o representa, nem representa o PMDB".
Durante a oitiva de Cunha, um de seus principais aliados, André Fufuca (PP-MA), fez uma comparação do caso de Cunha com Henrique Meirelles, atual ministro da Fazenda. Fufuca lembrou que Meirelles foi acusado em 2005 de evasão de divisas por ter um truste, mas o caso foi posteriormente arquivado pelo então procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza.
Cunha: me sinto injustiçado, mas sei que o processo é de "natureza política"
Em seu depoimento, Cunha disse que "nem uma criança acreditaria" que ele participou do esquema de corrupção da Petrobras.
– Em 2006 eu fiz oposição ferrenha ao governo Lula, como alguém ia me dar o controle do petrolão? – questionou.
Segundo Cunha, "é muito fácil tentar encontrar um suposto chefe do petrolão para esconder a sujeira debaixo do tapete". O peemedebista disse que rompeu com o governo Dilma Rousseff por ser alvo de "manipulações".
O presidente afastado da Câmara também questionou a confiabilidade das delações premiadas, usuais na Operação Lava-Jato.
– Se a moda de delação pega, uns 500 teriam denúncia aceita, incluindo Dilma Rousseff – disse.
Diversos membros do Conselho de Ética utilizaram depoimentos de lobistas e empresários, como Fernando Soares, o "Baiano", João Henriques e Ricardo Pernambuco Júnior, indicando que Cunha teria recebido vantagem indevida. O peemedebista, contudo, se recusou a responder perguntas que não estavam direcionadas à acusação de que ele mentiu sobre possuir contas na Suíça.
Em seu questionamento, Onyx Lorenzoni (DEM-RS) perguntou a Cunha se há uma conspiração contra ele e se existe, que essa conspiração é "planetária", já que "envolve STF, PGR, delatores, Edison Lobão, Nestor Cerveró e o Ministério Público da Suíça, entre outros". Cunha respondeu que "não fala que tem conspiração, apenas estranha a seletividade das investigações". O peemedebista comentou ainda que "obviamente" sofre "contestação política", mas que não era a sua intenção "fazer exposição de vitimização política" perante o colegiado.
Cunha afirmou também que se sente "injustiçado", mas que sabe que o processo é de "natureza política" e que buscará seus recursos. Ele voltou a dizer que identificou diversas nulidades no processo do Conselho de Ética, que podem "zerar" o processo.
Cunha diz que não fez indicações para o governo
Na tarde desta quinta-feira, durante embate com o líder da Rede, Alessandro Molon (RJ), Cunha se defendeu das acusações de que mesmo afastado estaria indicando aliados para atuar em setores importantes da gestão Michel Temer, como na nomeação de André Moura (PSC-SE) para a liderança do governo.
– Não tem um alfinete nesse governo indicado por Eduardo Cunha, mas não estou suspenso de exercer minha militância política – declarou.
O líder da Rede criticou as negativas de Cunha sobre a sua interferência no processo de escolha do governo Temer. O peemedebista, por sua vez, disse que Molon faz parte de "uma oposição sistemática e constante que, em sua ânsia e seu ódio, exagera no que quer".
– Não indiquei e não indico ninguém, mas se fizesse tenho legitimidade, pois é o meu partido que está no poder – afirmou.
Cunha disse ainda que os parlamentares não são "seus capachos".