Autodeclarada mulher travesti, Natasha Ferreira, 36 anos, foi eleita vereadora de Porto Alegre com 4.718 votos no domingo (6). Esta foi a segunda vez que ela concorreu a uma vaga no Legislativo da Capital. Em 2020, ficou de suplente e chegou a tomar posse por uma semana, em 2021. Além dela, a Câmara também vai contar com outra travesti neste mandato, Atena Roveda (PSOL), eleita com 4.260 votos.
Natural de Novo Hamburgo, no Vale do Sinos, foi lá que Natasha ingressou na vida política, aos 13 anos, no movimento estudantil. Em 2018, ela foi candidata a deputada estadual pela primeira vez pelo PCdoB.
Ativista por direitos humanos e pelas pessoas LGBTQ+, Natasha se mudou definitivamente para Porto Alegre em 2019. No ano seguinte, concorreu à vaga na Câmara da Capital pelo PSOL, quando ficou de suplente.
Na ocasião, ela se tornou a primeira travesti a assumir uma vaga no Legislativo municipal, quando substituiu Roberto Robaina, que precisou se licenciar por uma semana em junho de 2021. À época, ela tinha como meta apresentar dois projetos para o estabelecimento de cotas para pessoas travestis e transexuais no serviço público e nas empresas privadas contratadas pela prefeitura.
Antes dela, uma mulher trans, Luísa Stern (PT), também suplente, assumiu o mandato por três dias, em 2018. Ela explica que usa o termo mulher travesti em vez de mulher trans devido a uma diferença conceitual.
— Uso o termo travesti porque é um termo brasileiro e latino-americano. Então, eu sempre adotei, porque é um termo muito estigmatizado. Eu quero desconstruir essa ideia de que as travestis só vão falar da expectativa de vida baixa que a gente tem em um país que é extremamente violento. O mais violento do mundo para essa população, aliás. É uma questão mais conceitual do termo mesmo.
Ela também foi a primeira travesti nomeada como assessora na Assembleia Legislativa do RS, durante o mandato da deputada Luciana Genro.
Em 2022, ela se candidatou a deputada federal, ainda pelo PSOL, mas não foi eleita. Nas duas candidaturas, ela foi apontada como a travesti mais votada do sul do país. No pleito deste ano, Natasha voltou às raízes e concorreu pelo Partido dos Trabalhadores (PT).
Por uma Câmara propositiva
A vereadora diz que pretende participar ativamente das discussões sobre o Plano Diretor da Capital e defender a pauta climática e do meio ambiente. Outra preocupação dela é com o orçamento municipal e a educação que precisam nortear, em sua visão, os debates do Legislativo.
— Precisamos debater a falta de vagas em creches, não banheiro unissex. Tem escolas em Porto Alegre que sequer têm banheiro. Quero uma Porto Alegre em que as pessoas não tenham medo de eleger pessoas como eu, mas sim de ter pessoas pedindo comida na porta de supermercados, algo que acaba sendo naturalizado.
Além do aval do presidente Lula, ela recebeu apoio de figuras históricas do PT gaúcho e nacional como o ex-governador Tarso Genro, o ministro Paulo Pimenta e a presidente da sigla, a deputada federal Gleisi Hoffmann.
Reconstrução, saúde e educação
Em sua campanha, Natasha defendeu pautas como o fortalecimento do sistema de proteção contra enchentes. Além disso, ela propõe uma política municipal para dar suporte psicológico às pessoas atingidas pelas cheias.
— Queremos que o nosso mandato seja o porta-voz da luta pela reconstrução de Porto Alegre. Isso passa por reconhecer que a nossa população não está bem mentalmente. Os relatos dos trabalhadores do SUS que temos ouvido indicam que casos de depressão, ansiedade e estresse pós-traumático estão mais frequentes. Precisamos de um plano estruturado para lidar com esse problema, e essa é uma das primeiras discussões que queremos levar à Câmara — diz.
Natasha também defende a ampliação e melhoria do atendimento educacional especializado para estudantes com deficiência e a inclusão das pessoas LGBTQ+ no orçamento público da cidade.
— Para falar sobre LGBTs, políticas para mulheres, mães solo, para os negros, eu parto do princípio de que a gente precisa levantar dados sobre essas pessoas — frisa.