Estabilidade é uma definição adequada para o segundo turno do prefeito e candidato à reeleição Sebastião Melo (MDB). Na primeira etapa da disputa pela prefeitura de Porto Alegre, Melo conquistou 49,72% dos votos válidos. Faltaram cerca de 1,9 mil votos, num universo de 694,6 mil eleitores que escolheram um candidato, para vencer na primeira rodada. A proximidade do triunfo poderia causar relaxamento, mas Melo vacinou a equipe desde o início. Exigiu foco e manteve ritmo nas agendas de campanha, fazendo caminhadas em bairros e regiões de comércio, desde o Sarandi até o Centro Histórico e Ipanema.
Também percorreu zonas populosas empoleirado na caçamba de uma caminhonete. No segundo turno, uma das apostas foi colocar Melo em semáforos de forte circulação, onde surpreendia motoristas ao fazer corpo a corpo. Tudo intercalado com uma agenda recheada de entrevistas a meios de comunicação e gravações em praças para os programas da propaganda eleitoral. A avaliação da campanha é de que não houve, na etapa final da disputa com Maria do Rosário (PT), nenhum fato novo que pudesse acender alerta de reviravolta.
— O exemplo arrasta. Se o líder está mobilizado indo para os semáforos, é um símbolo para a militância de que ela precisa estar junto — afirma André Coronel, coordenador-geral de campanha.
Outro aspecto que manteve a caminhada sólida foi o alargamento do arranjo político. Oito partidos o apoiam desde o princípio, mas, no segundo turno, o prefeito conseguiu se reaproximar do governador Eduardo Leite (PSDB) e do vice-governador Gabriel Souza (MDB). Ambos declararam apoio a Melo, com quem tinham relação tensa e distante desde a eleição de 2022. Naquela ocasião, Melo se arriscou ao fazer campanha para Onyx Lonrezoni (PL) na disputa pelo Palácio Piratini, indo contra a candidatura do seu partido, o MDB, que tinha indicado o vice de Leite.
Agora, com arestas aparadas, houve gestos públicos de reconciliação. Sobretudo a pacificação com Leite é agregadora: o tucano fez quase 70% dos votos na Capital no segundo turno de 2022.
— Todos os apoios são importantes, mas esses (Leite e Gabriel) zeraram um assunto que não estava totalmente resolvido politicamente — reconhece Coronel.
Melo recebeu o esperado endosso de Felipe Camozzato (Novo), que anotou 3,83% dos votos válidos no primeiro turno. O PDT de Juliana Brizola declarou apoio a Rosário, fruto de uma orientação nacional, mas o partido está rachado. Parte das lideranças locais trabalha por Melo. Mesmo no PSB, coligado com Rosário, há dissidências em direção ao prefeito: uma delas é do vereador Airto Ferronato, que publicou vídeo demarcando posição.
No segundo turno, Melo fez uma pausa na estratégia de equidistância do bolsonarismo radical, já que tem esse voto cristalizado, para participar de um ato público com a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. Ainda no campo das alianças, recebeu apoio de 18 prefeitos da Região Metropolitana, entre atuais mandatários e eleitos. São atos que reforçam o slogan de Melo, o de fazer “juntos”, tentando empurrar para o PT a pecha da dificuldade de se relacionar com o conjunto da sociedade.
Na propaganda de TV, Melo seguiu destacando realizações, combinando com promessas para um segundo mandato, sobretudo na saúde. Depoimentos de outras lideranças políticas foram usados pela primeira vez na quinta-feira (24), penúltimo dia de veiculações. Houve críticas a Rosário, incluindo alegações de distanciamento da cidade por exercer mandato de deputada federal em Brasília, mas nada que se compare à fervura das inserções de rádio. Rosário elevou o tom ao citar episódios de corrupção no governo Melo, na Secretaria da Educação (Smed) e no Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae). A campanha do prefeito levou ao ar peças chamando a adversária de “Mariazinha” e a vinculando a escândalos pelos quais sequer foi acusada.
Pesquisas qualitativas mostram que, quando se ataca o adversário, o eleitor desaprova. Uma coisa é ter iniciado os ataques. Outra é responder. Nunca tivemos a iniciativa. Fizemos campanha propositiva.
ANDRÉ CORONEL
Coordenador-geral de campanha
Um olhar para a arrecadação remove qualquer dúvida sobre a articulação de Melo com os setores empresariais. Até a tarde de quinta-feira (24), ele havia declarado o recebimento de R$ 1,6 milhão em doações de pessoas físicas, com diversas contribuições da elite econômica da Capital. No mesmo recorte temporal, Maria do Rosário informou ter recebido R$ 25,7 mil em doações de pessoas físicas.
Os fatos refletem a costura de Melo: cultiva a figura simples que transita nas periferias, mas sem deixar de lado a nata do empresariado. Um retrato da ginga pode ser extraído da agenda da última segunda-feira (21) de campanha. À tarde, Melo foi ao humilde bairro Bom Jesus para gravações de TV. À noite, esteve em um dos metros quadrados mais caros da cidade, na Rua Dinarte Ribeiro, no restaurante Asiana, para um jantar de arrecadação. Cerca de 120 pessoas compareceram, com ingresso individual a R$ 5 mil. O mesmo chapéu de palha que protege do sol na vila passou de mão em mão no Moinhos de Vento, amealhando fôlego financeiro para o final do segundo turno.