Catapultado pela força da direita e do presidente Jair Bolsonaro no Rio Grande do Sul, Onyx Lorenzoni (PL) chegou na frente no primeiro turno da eleição para governador. Após 100% das urnas apuradas, Onyx somou 2.382.026 votos (37,50% dos válidos), enquanto assistia a uma briga cada vez mais parelha entre Eduardo Leite (PSDB) e Edegar Pretto (PT) pela segunda vaga. O resultado contrariou a maior parte das pesquisas de intenção de voto, que o colocavam em segundo lugar, atrás de Leite, e dá vantagem ao candidato do PL na largada para a fase decisiva da eleição estadual.
Sem coligação com grandes partidos, Onyx rompeu uma tradição histórica no Rio Grande do Sul, que sempre levou ao turno decisivo candidatos da tríade PT-MDB-PSDB. A despeito da fama de ser um Estado conservador, também é a primeira vez desde a redemocratização que um concorrente declaradamente de direita se classifica ao segundo turno.
O candidato do PL acompanhou a apuração dos votos junto de familiares e chegou ao comitê no bairro Santana, em Porto Alegre, às 19h15min. Saudado efusivamente pelos apoiadores que aguardavam desde as 17h e acompanharam a apuração, o candidato deu um longo abraço na vice, Cláudia Jardim (PL), e falou rapidamente com os jornalistas antes de ir para uma sala reservada.
Pouco antes das 21h, ainda sem saber quem enfrentaria no segundo turno, Onyx fez um pronunciamento sobre a vitória parcial.
— Não estamos olhando para o lado. Não importa com quem vamos disputar o segundo turno. Nos importa a vida das famílias gaúchas — declarou.
O candidato pediu que a esposa, Denise, fizesse uma oração em agradecimento ao resultado. Durante a prece, ela verbalizou o que outros aliados já admitiam em conversas reservadas: a votação surpreendeu a própria campanha.
— Agradecemos por esse resultado, que não esperávamos. Nos surpreendeu.
Onyx não respondeu perguntas e encerrou o pronunciamento cantando o Hino do Rio Grande do Sul. Mais tarde, apoiadores do candidato cantaram o "Parabéns gaúcho" para saudar o aniversário do candidato, que completa 68 anos nesta segunda-feira.
Em conversa com a imprensa na saída do comitê, Onyx disse que pretende procurar outros candidatos "do mesmo campo" para conversar sobre possível apoio no segundo turno e criticou as pesquisas eleitorais. Ele também indicou que não deve traçar nova estratégia de campanha para o turno decisivo:
— Será a mesma estratégia de sempre: a verdade, fé em Deus, humildade e muito trabalho. E mostrar que o Rio Grande terá um novo caminho. Não é pela força humana que chegamos aqui: é pelo poder de Deus.
Pilares
A vitória do candidato do PL no primeiro turno pode ser explicada pela efetividade de uma campanha ancorada em três pilares notórios: a identificação com Jair Bolsonaro, o alinhamento a valores conservadores e o antagonismo ao governo Leite.
A ligação com o presidente foi explorada ostensivamente por Onyx na propaganda eleitoral, nos eventos públicos e nas redes sociais. Desde a pré-campanha, o candidato do PL disse por onde passou que a "transformação" feita por Bolsonaro no governo federal serviria de espelho para suas atitudes no Piratini.
Para isso, valeu-se do histórico de ter sido o coordenador da campanha presidencial vitoriosa de 2018, articulador da transição de governo e chefe de quatro ministérios — o que lhe rendeu o apelido de "curinga" por parte do chefe.
De sua parte, Bolsonaro sempre deixou claro que seu candidato preferido a governador era Onyx, embora nunca tenha dito isso com todas as letras para não melindrar o senador Luis Carlos Heinze (PP), outro aliado que também tentou chegar ao Piratini. Isso pôde ser percebido tanto nas demonstrações de intimidade com Onyx quando esteve no Rio Grande do Sul, em setembro, quanto em suas manifestações nas lives em que pedia votos para aliados de todo o país.
— Vocês sabem que eu tenho alguém de preferência — repetia o presidente.
O temor de uma divisão de votos da direita entre Onyx e Heinze logo foi dissipado com a divulgação das primeiras pesquisas eleitorais, que sempre mostraram o candidato do PL com intenções de voto significativamente maiores do que o progressista. A oratória desenvolta de Onyx citando dados positivos do governo federal e a qualidade dos programas de rádio e TV, que raramente deixaram de citar o presidente, completaram o serviço.
A propaganda eleitoral também foi acionada para reforçar a imagem de Onyx como representante do eleitorado conservador, preocupado com assuntos como a valorização da família, a proteção às crianças e a promessa de ser um governador que ficará "ao lado da polícia".
A estratégia também fez uso de um componente religioso — em alguns momentos, considerado exagerado por alguns companheiros do ex-ministro, temerosos de afugentar o eleitorado mais jovem. Em praticamente todas as entrevistas, Onyx declarou que considera a eventual eleição ao governo como uma "missão".
Um dos principais aliados do ex-ministro no Rio Grande do Sul, o vice-prefeito de Porto Alegre, Ricardo Gomes (PL) admite que, em muitos casos, a campanha priorizou o destaque de alguns valores conceituais ao detalhamento de propostas.
— O Onyx teve uma campanha muito caseira, sem grandes espalhafatos e sem um marqueteiro de renome, com base em valores e princípios. Muitas vezes, não foi possível apresentar projetos específicos. No segundo turno, teremos um outro espaço, com igualdade de condições, para falar mais sobre o plano de governo — aponta Gomes.
Por fim, Onyx adotou desde o início da campanha uma postura crítica a Eduardo Leite, buscando ocupar o lugar de antagonista do tucano. Os apupos passaram pela postura de Leite durante a pandemia (que contrastou com a de Bolsonaro no plano federal), pela promessa descumprida de não concorrer à reeleição e, por último, pelo uso de recursos contabilizados para a área da educação no pagamento de servidores inativos.
Em sua participação no Jornal do Almoço, ao ser questionado sobre as críticas a Leite, o candidato do PL sintetizou o desapreço pelo adversário:
— A diferença minha para ele é falar a verdade. Ele mente. E segundo, eu cumpro a palavra. Ele não tem palavra. A diferença é simples.
Para reforçar as críticas à administração tucana, incorporou inclusive algumas posições defendidas por partidos de esquerda, como a rejeição ao regime de recuperação fiscal (RRF), acordo fechado por Leite com o governo federal para a retomada do pagamento da dívida com a União. Autointitulado liberal, Onyx também tece críticas aos modelos de concessões de estradas e da privatização da Corsan, além de prometer reduzir a alíquota previdenciária de policiais militares que ganham salários maiores, elevadas no atual governo.
Perfil
De perfil centralizador, o próprio Onyx assumiu oficialmente o papel de coordenador de sua campanha. Chegou a abrir conversas com o União Brasil e o MDB, oferecendo a ambos a indicação do vice, mas nos dois casos acabou preterido por Leite. Ao final, firmou aliança apenas com o Republicanos e os nanicos Pros e Patriota.
Percorreu municípios do interior em eventos com simpatizantes e concedendo entrevistas a veículos de imprensa locais. Dono da campanha mais cara dentre todos os concorrentes ao governo, também ajudou a custear material de campanha de candidatos a deputado de sua coligação, atrelando seu nome ao dos aliados nos santinhos e adesivos.
Com poucos assessores, o candidato do PL raramente divulgou a agenda de campanha ou distribuiu informações de suas atividades à imprensa. O coordenador de comunicação foi o publicitário Daniel Ramos, seu assessor de longa data, enquanto a gestão das redes sociais ficou a cargo da publicitária Karin Rowell, especialista em Marketing Estratégico.
Para o segundo turno, Onyx conta mais uma vez com a força de Bolsonaro, que obteve 48,89% dos votos válidos no Rio Grande do Sul.
Como a disputa nacional também será definida no final do mês, Onyx vai atrelar sua campanha ainda mais à de Bolsonaro, tentando avançar sobre o eleitorado gaúcho que votará no presidente. Ao mesmo tempo, deverá tentar ligar Leite à candidatura de Lula, empurrando o PSDB para a esquerda.
— Agora vamos ter tempo de mostrar o que ele fez lá (no governo federal) e contar como ele vai fazer aqui — sintetizou o coordenador de comunicação, Daniel Ramos.
Além de sair em vantagem em relação ao adversário, Onyx tem a seu favor o componente histórico: jamais o eleitorado gaúcho reelegeu um governador.
Como chegou
Candidato de Bolsonaro
O principal elemento do discurso de Onyx foi a identificação com o presidente Jair Bolsonaro. Coordenador da campanha vitoriosa de 2018, ele comandou a transição de governo e foi ministro em quatro pastas. Conseguiu apresentar-se como o candidato do presidente no Estado, prometendo repetir no Piratini o que fez por Bolsonaro no Planalto
Antagonismo a Leite
Onyx muniu-se de números e informações para criticar a gestão de Eduardo Leite. Adotou tom crítico ao tucano a respeito da gestão da pandemia e do acordo da dívida com a União, além de relembrar o fato de Leite ter renunciado.
Vida real
Com menos que o dobro do tempo de Leite em rádio e TV, Onyx apostou em gestão das redes sociais e em uma campanha baseada em conceitos. As propostas concretas que conseguiu detalhar atendem dificuldades que afetam a vida das pessoas, como a criação de um programa de regularização fundiária e a atenção especial à primeira infância.