Considerada essencial para o reequilíbrio das contas públicas, a reforma da Previdência do governo Jair Bolsonaro tem, por enquanto, poucas certezas. No programa do presidente eleito, a única referência é a introdução gradual de um modelo de capitalização, sistema em que cada trabalhador recolhe para pagar a própria aposentadoria no futuro. Hoje, o país adota a repartição, na qual trabalhadores da ativa pagam o benefício dos inativos. O déficit da Previdência chegou ao recorde de R$ 268,8 bilhões no ano passado e, para 2018, o governo projeta rombo R$ 192,8 bilhões.
O posicionamento de Bolsonaro sobre o tema não foi claro na campanha. Ainda precisa ser esclarecida como seria a transição dos modelos de repartição e capitalização.
— As propostas são sem detalhes, estão no plano genérico — diz Fabio Klein, analista de finanças públicas da Tendências Consultoria.
Mesmo assim, Klein avalia a ideia de capitalização interessante. Um dos pontos positivos seria uma melhor relação entre o que a pessoa contribuiu com o que vai receber no futuro. Também forçaria o trabalhador a planejar melhor a aposentadoria e, como o dinheiro é administrado por fundos, os recursos poderiam ser utilizados para financiar investimentos no país.
Adepto de uma participação maior do Estado na Previdência, o professor Roberto Bocaccio Piscitelli, do Departamento de Ciências Contábeis e Atuariais da Universidade de Brasília (UnB), lembra que Bolsonaro mencionou que o principal problema da Previdência está no setor público.
— O problema é que ele se refere aos civis. Nos militares, não pretende mexer. Mas o que diferenciava essas classes praticamente deixou de existir — diz Piscitelli.
O professor do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) Victor Roberto Correa de Souza também faz ressalvas à capitalização devido ao risco de os fundos serem mal administrados. Outro ponto nebuloso, aponta o professor, é se haverá possibilidade de quem está na ativa poder migrar da repartição para a capitalização e se os recursos que faltariam no primeiro sistema seriam compensados.
— Precisamos discutir isso e dar uma resposta atuarial e jurídica ao envelhecimento da população. Mas o programa traz dificuldades de compreensão — pondera Souza.
Segundo especialista, é preciso estabelecer idade mínima para aposentadoria, mas o ideal é também obedecer a uma regra de tempo de vida e de contribuição.
A proposta em tramitação no Congresso, porém, parece estar descartada pelo governo Bolsonaro, apesar de o vice-presidente eleito, Hamilton Mourão, ter referido a possibilidade de aproveitar e votar o texto ainda neste ano. O projeto original tinha estimativa de R$ 800 bilhões de economia em 10 anos, mas devido a concessões ao longo das negociações, o valor caiu para cerca de R$ 480 bilhões.
Na área do trabalho, a principal proposta do presidente eleito é criar o que chamou de carteira verde-amarela. Será voluntária, pensada principalmente para jovens que tentam ingressar no mercado. Apesar da novidade, o empregado poderá optar pela carteira azul, tradicional, com todos os direitos.