Dentre todas as maneiras que existem de perder uma disputa, os aliados do governador José Ivo Sartori (MDB) nutrem a certeza de que ele alcançou a melhor delas: a de cair de pé.
Quando a vitória de Eduardo Leite (PSDB) já estava assegurada, Sartori ingressou no hall do Hotel Intercity, na zona norte de Porto Alegre, onde fez breve pronunciamento neste domingo (28) à noite, sob aplausos e efusivos cânticos do seu nome. Predominavam entre os apoiadores e coordenadores de campanha as expressões de dever cumprido e alívio, salvo a reação da filha Carolina, que, ao lado da primeira-dama Maria Helena Sartori, se emocionou ao ouvir as saudações ao pai.
O emedebista não conseguiu a reeleição, mas, em uma disputa acirrada, alcançou 46,38% dos votos válidos mesmo tendo passado por quatro anos de um governo de desgastes, sobretudo pelos sucessivos atrasos e parcelamentos de salários do funcionalismo público. Foram mais de 30 meses nessa situação, consequência da crise financeira do Estado.
— Estou honrado de chegar ao final desta eleição não só com uma votação competitiva, mas de poder olhar para os gaúchos e gaúchas e para a minha família de cabeça erguida — destacou Sartori.
Nos bastidores, a avaliação é de que o MDB terá de fazer uma análise sobre as escolhas de segundo turno. Houve decisão de buscar um atrelamento incondicional ao presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). O governador o apoiou sem qualquer ressalva, diferentemente de Leite, que manifestou voto em Bolsonaro, mas listou divergências com a sua plataforma política. O resultado foi que Sartori e Leite, do mesmo campo político, seguiram dividindo de forma mais equilibrada os apoiadores gaúchos do presidente eleito, mas a parcela que decidiu o pleito foi a de órfãos do PT e do PDT, siglas que, somadas, fizeram 1,7 milhão de votos na primeira etapa da disputa. E, ao perceber a adesão total de Sartori ao capitão da reserva, os eleitores de centro-esquerda se deslocaram em maioria em favor do tucano. Em relação ao primeiro turno, Leite aumentou seu desempenho em 984,7 mil votos. Sartori acrescentou 848,2 mil eleitores. O debate que se dará é se, de fato, um alinhamento mais moderado e crítico a Bolsonaro poderia ter rendido melhor resultado.
— O apoio ao Bolsonaro respeitou a decisão da grande maioria dos partidos e acompanhou o movimento da sociedade. Uma eleição é de erros e acertos, mas certamente esse não foi um erro nosso. Não estamos arrependidos — avaliou o chefe da Casa Civil, Cleber Benvegnú, um dos principais conselheiros e mentores da estratégia junto ao secretário da Segurança, Cezar Schirmer.
O MDB deverá iniciar, a partir desta segunda-feira (29), debate com os deputados estaduais e federais eleitos da sigla para discutir o posicionamento político diante do novo governo do PSDB, sigla que apoiou Sartori até o início de 2018.
— A minha opinião é de que o partido deve ficar na oposição. Como estamos no mesmo campo político, tem de ser uma oposição responsável. Mas, sim, oposição — diz o deputado federal reeleito Alceu Moreira, presidente do MDB gaúcho.
Tanto Sartori quanto Benvegnú cumprimentaram Leite pela vitória e asseguraram que o Palácio Piratini está pronto para iniciar a transição de governo, sinalizando pacificação após uma campanha de segundo turno em que ocorreram tensões agudas. Aqui e ali, no último ato de campanha, espocavam reclamações contra os institutos de pesquisa, que vinham indicando maior vantagem na disputa para Leite. Benvegnú salientou que o governo Sartori não irá paralisar atividades nos últimos dois meses antes da passagem de bastão. Uma das iniciativas previstas para os próximos dias é o lançamento do primeiro edital de concessão de estradas da gestão.
Por que sartori perdeu
- O apoio incondicional e sem nenhuma ressalva a Jair Bolsonaro (PSL) na eleição presidencial praticamente entregou a Eduardo Leite (PSDB) a maioria dos 1,7 milhão de eleitores que, em primeiro turno, votaram em Miguel Rossetto (PT) e Jairo Jorge (PDT). Leite teria se beneficiado por uma estratégia de apoio moderado a Bolsonaro, o que o deixou menos distante do público de centro-esquerda.
- O atraso e o parcelamento de salários do funcionalismo foi fator de desgaste permanente ao governo Sartori. Nos bastidores, aliados do governador avaliam que, não fossem os mais de 30 meses nessa condição de crise financeira com reflexo direto no bolso de servidores, o emedebista teria chances reais de sair reeleito. Emedebistas também acreditam que Leite conquistou mais apoio entre o funcionalismo por afirmar que colocaria os salários em dia no primeiro ano de governo, enquanto Sartori não fez tal sinalização.
— Ninguém tem bola de cristal para saber o que vai acontecer na economia no ano que vem. Como prometer isso? Sartori se negou a fazer isso. Se deu prejuízo eleitoral, me perdoem, vai falar aqui um amigo: talvez estejamos diante de uma figura diferenciada na média política brasileira. É um homem que prefere dormir tranquilo do que fazer uma promessa que eventualmente lhe dê votos — disse o chefe da Casa Civil, Cleber Benvegnú.
- O desgaste natural de um governo que conviveu durante quatro anos com a grave crise das finanças do Rio Grande do Sul, somado às dificuldades enfrentadas na economia nacional. Diante dos problemas, Sartori ficou marcado pela demora em tomar decisões e encaminhar resoluções, fator que foi explorado por Leite durante a campanha para criticá-lo e para defender a necessidade de mudança.