Analistas avaliam que é importante acompanhar a evolução dos bens dos políticos. Doutora em Ciência Política e professora da UFRGS, Silvana Krause comenta que, ao assumir um cargo público, um parlamentar constrói redes de influência, o que pode beneficiá-lo para aumentar o próprio patrimônio.
— O argumento do milionário que entra para a política como trunfo não faz sentido, porque pode sair ainda mais rico. E passar os bens para familiares pode ser estratégia. Em um país com alta desigualdade econômica, mostrar patrimônio tão grande pode ser agressivo aos eleitores — analisa Silvana.
Além disso, o político pode acabar atuando em benefício próprio, lembra Maria do Socorro Sousa Braga, pós-doutora em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) e professora da Universidade Federal de São Carlos (SP):
— O parlamentar irá trabalhar em favor das demandas de grupos de interesse, dos quais pode fazer parte. E a transferência de bens para familiares pode ocorrer para ludibriar o eleitor e disfarçar poder econômico adquirido. Mas o patrimônio segue na família e deveria ser algo do conhecimento da população.
Políticos não são obrigados a informar tudo que possuem
O patrimônio, aliás, pode ser ainda maior do que o apresentado à Justiça Eleitoral. Isso porque, ao fazer a declaração ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o candidato é quem decide quais bens irá relatar. Há, inclusive, casos de concorrentes à reeleição que não informam nem o saldo da conta corrente na qual recebem seus salários.
Não há punição em caso de discrepância em relação ao Imposto de Renda. Se os bens informados não baterem, basta o candidato atualizar, se for solicitado. O TSE e os tribunais regionais eleitorais (TREs) até podem checar os dados, mas há poucos servidores para o trabalho frente à quantidade total de candidatos no país (28,1 mil).
Na prática, a investigação costuma ocorrer por iniciativa da Receita Federal, que tem acordo com o TSE para receber as declarações de patrimônio, ou por pedido do Ministério Público.
Além disso, seguindo o mesmo critério da Receita, o valor dos bens não sofre correção de valorização. De junho de 2014 a julho de 2018, intervalo entre o mês anterior ao limite para as declarações de patrimônio dos candidatos em cada ano, a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), tido como parâmetro “oficial” no Brasil, foi de 28,3%. Um imóvel de R$ 200 mil declarado há quatro anos, por exemplo, aparecerá no mesmo valor no site do TSE, apesar de, agora, valer R$ 256,6 mil, após a correção da inflação. Isso sem contar a variação no preço dos bens. No mesmo período, o valor dos imóveis em Porto Alegre cresceu nominalmente em 9,12%, conforme cálculo do Sindicato da Habitação (Secovi-RS).
— A evolução de bens do candidato não é a única coisa a se observar porque há formas honestas de isso ocorrer, mas é importante acompanhar porque pode ser um indicador de que o parlamentar não representa apenas os cidadãos, mas utiliza a política como balcão de negócios. O patrimônio de candidatos deveria ser objeto de análise ainda mais rigorosa da Receita, já que ocupam ou buscam cargos de destaque. Há artifícios em que o candidato coloca os bens em nome de terceiros, em transações de gado ou mesmo nas empresas que possui — alerta o economista e presidente da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco.
A transparência do patrimônio dos candidatos foi assegurada pelo TSE no início de agosto. O órgão havia eliminado a exigência de detalhar o patrimônio, mas voltou atrás na decisão.
Agora, os concorrentes terão de completar as informações tal como se fazia em 2014 – na época, imóveis apareciam com endereço e terrenos, com o tamanho em hectares, minúcia que não está presente na declaração de todos os candidatos de 2018. Os concorrentes em todos os cargos terão de atualizar as informações.
Cabe aos eleitores pesquisar sobre seus escolhidos, o que pode ser feito no sistema DivulgaCand, do TSE (veja como acessar no quadro ao lado).