Chegou a hora de voltar às urnas. Quatro anos depois da última eleição nacional, mais de 156 milhões de brasileiros estão aptos a indicar quem gostariam que fossem seus representantes nos cargos de presidente, governador, senador, deputado federal e estadual. Em Caxias do Sul, segundo maior colégio eleitoral do Estado, são 343.453 eleitores. Destes 10,36% têm direito ao voto facultativo. São adolescentes com 16 e 17 anos, idosos com mais de 70 anos e analfabetos.
No entanto, o convite da democracia é aceito por milhares deles que fazem questão de se deslocar à seção eleitoral independente de não terem o dever de votar. São jovens motivados pela curiosidade da primeira vez, idosos com a oportunidade de serem notados e pessoas com deficiência (PCD's) que se manifestam para que a acessibilidade, garantida em dias de votação, seja um direito respeitado diariamente.
O voto da experiência
Quando Olga Gentil Zolet Zanella nasceu, em 1º de junho de 1920 as mulheres ainda não tinham direito a voto. Foi só 12 anos depois, em 24 de fevereiro de 1932, depois do então presidente Getúlio Vargas instituir o Código Eleitoral, que as mulheres passaram a exercer o direito de votar e serem votadas. Dona Olga não lembra da primeira vez que votou e ainda era uma criança quando as mulheres ficavam de fora das decisões políticas, mas recorda de um episódio da década de 1940 quando saiu de Antônio Prado, sua cidade natal, para votar ao lado da família em Caxias.
— Foi quando o Enrico Gaspar Dutra se elegeu. Fui visitar meus pais em Antônio Prado e a enchente fez o rio subir muito. Naquela época era por balsa, pegamos um barquinho para conseguir sair de lá e votar em Caxias — lembrou.
Dona Olga faz parte do grupo que não espera que seus representantes mudem o país sozinhos. Seja em oração nas missas assistidas pela televisão ou com trabalho voluntário, a lúcida eleitora de 102 anos faz sua parte além do voto. Com cinco filhas, sete netos e três bisnetos, a centenária moradora do bairro Panazzolo ainda atua na comunidade em que vive costurando pequenas roupas para serem doadas aos recém-nascidos do Hospital Geral.
Entre esquecimentos sobre quem era o presidente em determinada época, não deixa que a falta de memória atrapalhe a conversa e foca no presente. Para ela, votar é importante para sentir-se cidadã, parte de um todo responsável por suas escolhas. É claro que sair do apartamento em que mora, acontecimento cada vez mais raro devido as dores nas costas, já é um bom motivo para pôr a bolsa a tiracolo e acessar sua zona eleitoral, na Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF) Catulo da Paixão Cearense.
— Pra mim é importante, sempre votei. É um direito da gente e um exemplo para meu três bisnetos, os únicos da família que ainda não podem votar — contou a senhora, que vota acompanhada da filha Isabel Zanella, 60.
O voto da estreia
Para estrear como eleitora, Vitória Manera Toscan, 17, fez o dever de casa para entender a atuação de um senador, por exemplo. Aluna do 2º ano do Ensino Médio, Vitória emitiu o título de eleitor pela internet e, por incentivo dos pais, irá à urna neste domingo.
— Acho que se não votasse, eles ficariam um pouco tristes. Eles sempre dizem que depois não tem do que reclamar, afinal eu deixaria outros escolherem por mim. Mas eu também quero, eu posso, então eu sinto que é um dever — contou a estudante, que priorizará candidatos com propostas em prol da educação e saúde.
Também por incentivo da família, mas um pouco assustado de ter que decidir pelos candidatos, Giovanni Nicoletto Panitz, 16, foi ao cartório em junho para emitir o documento eleitoral. Com a possibilidade do voto, os jovens de 16 e 17 anos entram oficialmente para o debate político, sentem-se responsáveis pelas suas decisões e admitem que a escolha não é fácil. Estrearão em uma eleição nacional com cinco representantes a serem escolhidos. Se na escola a prática da cola é reprovável, em frente a urna a consulta será uma necessidade.
— É difícil, é muita proposta. Se meu representante fizer mal para o país, vou me sentir um pouco culpado. É interessante fazer parte, nem tinha me ligado que já era domingo, vou ter que anotar os números para levar — confidenciou Panitz.
O voto da acessibilidade
Para que seus associados tivessem contato com as urnas antes da eleição, a Associação Farroupilhense de Deficientes Visuais (Afadev) promoveu, nesta quinta-feira (29), um exercício de votação no Cartório Eleitoral.
Com o auxílio de fones de ouvido, 14 eleitores participaram de um treino em que foram conduzidos por uma voz eletrônica que indica para qual dos cinco cargos é preciso digitar o número correspondente. De acordo com o presidente da Afadev, Pablo Barretti, o número cinco no centro do teclado é fundamental para direcionar o cegos à ordem correta. Além disso, cada uma das teclas conta com os sinais de braile e pessoas com baixa visão também podem solicitar os fones aos mesários.
Há dois anos sem ter contato com a urna, Ana Maria Zini Migon, 54 aprovou o teste. Como em outras oportunidades, a eleitora que perdeu por completo a visão aos 35 anos, testará a boa memória para digitar o número dos cinco representantes que diz já ter escolhido.
— Eu memorizo, todos os telefones dos meus conhecidos e familiares estão na cabeça. Tem que ser assim, no papel escrito não vou a lugar nenhum — contou Ana Maria, que ainda não se adaptou por completo ao braile, o sistema de escrita tátil usado por pessoas cegas ou com baixa visão.
Para Graziele Gonçalves, 27, o desafio de ser direcionada às teclas vai além e soma-se à baixa audição. Foi chegando bem próximo da tela que a jovem acompanhou o passo a passo indicado pela urna.
— Eu me sinto mais segura pela visão do que pela audição, eu uso aparelho, é como um microfone, mas meu problema é interpretar o som, não precisa ser alto, depende o tom de voz — explicou Graziele que, mesmo com baixa visão, descartou o uso dos fones.
— É bom conhecer já, pra gente chegar no dia e saber como vai ser. Achei legal que tem braile e as teclas são grandes. Só não consegui enxergar o nome dos suplentes, mas o resto foi tranquilo — avaliou.