A hipótese de que Pinto Bandeira pode perder a independência como município e voltar a ser um distrito de Bento Gonçalves causou alvoroço entre a população de pouco mais de três mil habitantes na Serra gaúcha. A esperança dos moradores é de que seja revertida a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4711 e considerou ilegal uma lei estadual de 2010 que permitiu a emancipação e instalação de novos municípios no Rio Grande do Sul.
Faz sentido a insegurança no município que conquistou a emancipação pela segunda vez em 2013 (já havia sido município entre 2001 e 2003, quando perdeu o posto por outra decisão do STF ). Nos últimos anos, a cidade conquistou reconhecimento regional por ser sede de grandes vinícolas e por produzir frutas cítricas de qualidade, o que levou a comunidade a receber o título de Capital Estadual do Pêssego de Mesa, por exemplo.
Além disso, Pinto Bandeira obteve destaque nacional devido aos investimentos na educação de crianças e adolescentes. De acordo com o Anuário Brasileiro da Educação Básica publicado em 2019, o município foi o que mais investiu recursos por estudante em todo o país, superando grandes cidades e regiões mais ricas.
O investimento em educação, por exemplo, está sendo possível porque Pinto Bandeira, como município, tem acesso à recursos que antes ficavam concentrados nos cofres da prefeitura de Bento Gonçalves. Ou seja, o imposto gerado pelas atividades econômicas agora fica na cidade. Pela primeira vez, a cidade terá uma sede própria para a creche municipal, que deve ser inaugurada até o final do ano.
A saúde também avançou desde a emancipação, segundo moradores ouvidos pela reportagem. O setor ganhará, até o final do ano, um amplo posto de saúde, que está em obras.
Moradores estão preocupados
Por esses e outros fatores é que a possibilidade do fim da autonomia gera desconforto aos moradores. João Darci de Oliveira, 64 anos, reside há duas décadas em Pinto Bandeira. Para ele, a decisão seria um retrocesso.
— A saúde está legal, tem transporte, tem tudo. Melhor que isso, não precisa. Não tem motivo para voltarmos a ser um distrito. Somos bem atendidos em termos de saúde. Se voltar (a ser distrito), como vai ficar? Essa é a nossa grande dúvida. A tendência é ficar bastante ruim — acredita Oliveira.
O aposentado Osmar de Souza, 67, já foi embora e voltou a morar na cidade. Para ele, Pinto Bandeira não pode perder a independência na gestão de orçamentos e recursos.
— Não é interessante, vai ficar muito ruim. Aqui temos o melhor atendimento e mais fácil. Se passar para Bento, vai ficar mais difícil, já foi assim em tempos anteriores. Temos nosso orçamento e não precisamos dividir com ninguém — defende Souza.
O comerciante Leandro Molon compartilha da mesma opinião.
— Acho que isso não vai ser uma boa, pelo fato de, como distrito, ficarmos em segundo plano. Toda a nossa renda, vai para eles (Bento Gonçalves). Vamos voltar a ser uma espécie de colônia, não teremos mais autonomia, isso é preocupante. Tomara que se repense essa decisão, pois ela afeta a todos nós — critica Molon.
Confederação Nacional dos Municípios (CNM) lança nota sobre o tema
O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) Paulo Ziulkoski, se manifestou sobre a decisão do STF. A entidade entende que a decisão não torna inválidas as Leis de criação de 29 Municípios gaúchos cuja emancipação ocorreu na década de 90.
Segundo a CNM, as leis foram consideradas pela Suprema Corte revogadas após 13 de setembro de 1996, sendo que a criação dos 29 Municípios gaúchos ocorreu em 16 de abril de 1996. Logo, no ato de sua criação, as normas estaduais estavam em pleno vigor e de acordo com a redação constitucional da época.
Dessa maneira, a entidade garante que a emancipação política desses e de outros Municípios brasileiros com absoluta segurança jurídica.
Vereadores estão mobilizados
Em breve conversa por telefone, o presidente da Câmara de Vereadores de Pinto Bandeira, Deonildo João Folador Angheben (MDB), informou apenas que o Legislativo está estudando a situação para buscar uma melhor avaliação sobre a decisão do STF e os caminhos a serem seguidos.
Atualmente, a Câmara conta com nove vereadores, que correm o risco de perder o mandato se o município for extinto. Parte deles e, o prefeito da cidade, Hadair Ferrari, foram até a Expointer nesta sexta-feira (10) para tentar encontrar o governador Eduardo Leite (PSDB) e conversar sobre o assunto. O chefe do Executivo Municipal e os parlamentares devem fazer uma manifestação conjunta, mas a data ainda não foi informada.
Deputado quer criar subcomissão em defesa dos municípios
Na sexta-feira (10), o deputado Carlos Búrigo (MDB) encaminhou requerimento para a Comissão de Assuntos Municipais da Assembleia Legislativa solicitando a instalação da Subcomissão em Defesa dos Municípios Atingidos pela ADI 4711. O pedido foi subscrito pelos deputados Elton Weber (PSB) e Beto Fantinel (MDB).
A ação ulgada pelo STF atinge 30 municípios gaúchos que foram emancipados a partir de 1996. Na Serra, seriam prejudicados, além de Pinto Bandeira, Coronel Pilar, Pinhal da Serra e Capão Bonito do Sul.
— Não tem cabimento uma discussão jurídica que se arrasta há anos determinar a extinção de 30 municípios gaúchos de um dia para o outro. Estamos falando de comunidades consolidadas há décadas, com suas raízes, suas características econômicas, sociais e culturais. Vamos em busca de alternativas jurídicas e legislativas para garantir a existência destas cidades e a normalidade destas comunidades que contribuem para o crescimento do nosso EEstado — avalia Búrigo.
O requerimento de instalação da subcomissão deverá ser votado na próxima reunião da Comissão de Assuntos Municipais. Além de proponente, o emedebista será o relator da subcomissão, que terá um cronograma de trabalhos com duração de quatro meses, e deverá apresentar, ao final dos trabalhos, um relatório para ser apreciado em plenário pelas bancadas da Assembleia gaúcha.