Em depoimento nesta quinta-feira (19), em Caxias do Sul, o réu Maykon Marcelino da Silva, 33 anos, confessou ter jogado líquido inflamável contra Lucilene Fonseca, hoje com 34 anos, mas alegou não ter a intenção de matar e não ter visto que a afilhada Isabella Theodoro Martins, oito meses, estava no colo de sua ex-esposa. A bebê morreu dois dias depois. Lucilene teve 70% do corpo queimado, permaneceu 101 dias num hospital e foi submetida a dezenas de cirurgias. O crime aconteceu na madrugada de 4 de novembro de 2017.
A sessão se iniciou às 9h30min e, após o sorteio dos jurados, foi aberta ao público. A primeira a ser ouvida foi Lucilene, que relatou ter ouvido um barulho naquela noite e, por isso, desceu ao porão, onde foi surpreendida e atacada com o líquido inflamável. Segundo a vítima, Silva era um marido ciumento: ela lembrou, durante o depoimento, que havia sido agredida e ameaçada por ele três dias antes deste ataque, quando acionou a polícia e solicitou medidas protetivas de urgência.
Na sequência aconteceu o depoimento do réu. Silva contestou a acusação e afirmou que foi até a casa da ex-esposa com o consentimento dela. Ele alegou que eles discutiram e ele desceu para o porão para fumar. Quando a mulher desceu, Silva afirmou ter "jogado a primeira coisa que pegou", mas admitiu saber que o líquido deveria ser inflamável (no local funcionava uma gráfica).
— Fui lá para conversar. Não sabia que a criança estava lá e não ouvi choro nenhum. Estava escuro no porão. No que ela (Lucilene) desceu, joguei o produto. Não queria matar, nunca foi a intenção. Infelizmente aconteceu esta tragédia — respondeu o réu diante das perguntas do juiz Max Akira Senda de Brito.
O réu ainda afirmou que não sabe como o fogo começou e supôs que poderia ter sido provocado por um cigarro que fumava no momento do ataque. Silva afirma que tentou socorrer a ex-esposa, mas ficou assustado com os gritos dos vizinhos.
— Foi um minuto de bobeira. Corri para acudir, mas eles (vizinhos) gritavam que iriam me matar. Fugi a pé e fui até o posto (de combustíveis) e liguei para a minha mãe — conta Maykon Marcelino da Silva.
Sobre a agressão pela qual já foi condenado, o réu preferiu não se manifestar, alegando que estava preso durante o processo e que não teve a oportunidade de se defender. Questionado pelo Ministério Público (MP), o réu admitiu ter ciúmes da esposa:
— É normal (o ciúmes). Não tenho como explicar.
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Os debates se iniciaram pelo MP, que ressaltou que o acusado havia prometido matar a vítima na época da primeira agressão, conforme relato do boletim de ocorrência daquela época. O promotor Gílson Borguedulff Medeiros mostrou imagens que seriam do acusado pulando a cerca antes e depois do ataque à Lucilene.
— Não foi uma bobeira, ele já havia prometido (matar a ex-esposa) — afirma o promotor.
O júri foi paralisado às 12h23min para o intervalo de almoço. A sessão retornou no início da tarde com os argumentos da Defensoria Pública, que representa o acusado. O defensor público que atua no caso pediu para não ser identificado.
Pela morte de Isabella, Silva foi denunciado por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, recurso que dificultou a defesa da vítima e emprego de fogo). Em relação à Lucielene, o réu responde por tentativa de feminicídio quadruplamente qualificado (a violência doméstica é a quarta qualificadora).
O defensor público não pediu pela absolvição do réu. Em sua manifestação, sustentou que o crime foi em um ato de fúria, desta forma não foi premeditado e motivo torpe, e assim reduziria as qualificadoras da sentença e, consequentemente, a pena pelo crime.
— Não peço a absolvição, apenas um julgamento justo. É uma tragédia humana, mas ele também está passando o inferno da vida. Estar no presídio também é o inferno. Ele não viu mais os dois filhos. Também está pagando está tortura — argumentou.