A Polícia Federal (PF) pretende concluir na próxima semana o inquérito sobre a Operação Coroa, que desmantelou uma quadrilha apontada como a principal fornecedora de cocaína na Serra. O alvo da investigação é o morador de Caxias do Sul Maicon Carvalho Souza, 27 anos, o Abacaxi, que segue recolhido no Mato Grosso do Sul. Ele foi preso em Ponta Porã (MS) no dia 29 de agosto com outros dois investigados, Ronei Ojeda e Osmar Andre Gimenez Cano, que seriam contatos dele naquele Estado, perto da fronteira com o Paraguai. Os três, conforme a investigação, negociavam com Jarvis Chimenes Pavão, um dos principais narcotraficantes da América do Sul e que está preso naquele país.
Os passos de Souza eram monitorados há pelo menos dois anos. Nos bastidores, Polícia Federal e Polícia Civil já tinham informações que apontavam ele como uma peça relevante no tráfico de drogas em Caxias e região. A suspeita é de que Souza seja o elo de ligação entre o Rio Grande do Sul e o Primeiro Comando da Capital (PCC), o que explicaria a relação com Pavão.
A fronteira entre Juan Pedro Caballero — cidade paraguaia com 100 mil habitantes — e Ponta Porã é uma posição valiosa para organizações criminosas por ser a principal porta de entrada da cocaína que é escoada da Colômbia, da Bolívia e da Peru para o Brasil. Desde junho do ano passado, quando um líder rival foi assassinado, a região estaria sob domínio da facção brasileira e de Jarvis Pavão.
O caxiense seria o responsável por transportar a droga da facção até o solo gaúcho. Esses serviços ocorreriam paralelamente ao esquema de tráfico que Souza liderava em Caxias e que foi desmantelado pela Operação Coroa. No entanto, a PF optou por não se manifestar sobre o possível envolvimento de Souza com o PCC.
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Apesar do esquema criminoso em que aparenta estar envolvido, Souza passava quase despercebido em Caxias. A ficha dele possui registros de lesão corporal, ameaça, porte de droga e porte ilegal de arma de fogo. O delito mais grave ocorreu em 22 de junho deste ano, quando Souza foi flagrado pela Brigada Militar (BM) negociando armas numa lancheria às margens da BR-116, em Ana Rech. Souza foi conduzido à delegacia com outros dois homens. Um deles era Michel Pacheco, investigado na Operação Coroa e apontado como braço direito de Souza. A dupla foi registrada como suspeita na ocorrência e liberada.
Souza seria preso novamente em 29 de agosto, quando a PF deflagrou a Operação Coroa. O morador de Caxias foi encontrado em Ponta Porã e resistiu a ação policial. Houve troca de tiros, mas ninguém se feriu. A PF também cumpriu mandados de busca em imóveis de Souza em Caxias.
Braço direito já cumpriu pena
Se Souza era a ligação com traficantes internacionais, quem recebia o carregamento de cocaína em Caxias era Michel Pacheco, apontado pela PF como o gerente operacional em Caxias do Sul. Na Serra, a droga era vendida para dezenas de traficantes, que espalhavam a cocaína por pontos de tráfico e negociavam com usuários. A Polícia Civil é a responsável por esclarecer o alcance da rede criminosa e indiciar os traficantes locais.
Na Operação Coroa, Pacheco foi preso em casa, no bairro Pôr do Sol, e segue recolhido na Penitenciária Estadual no Apanhador. De acordo com seus advogados Andrei Felipe Valandro e Fernando de Souza Alves, Pacheco é um autônomo que compra e vende carros e nega veemente qualquer prática criminosa.
— Qual narcotraficante que mora lá no bairro Pôr do Sol e dirige um Palio? Ainda mais com esta quantidade de drogas que o apontam como responsável. Traficante ostenta poder, mas o Michel é um miserável. O Palio apreendido era o que ele utilizava para levar seu filho à escola — afirma Valandro.
Essa é a terceira acusação de tráfico de drogas contra Pacheco. Em 2004, ele foi condenado e já cumpriu a pena. Em 2011, foi novamente preso com drogas pela Brigada Militar (BM). O flagrante foi incluído em uma investigação da Polícia Civil que resultou no indiciamento de nove pessoas. O processo segue em tramitação. A reportagem não obteve retorno dos advogados de Souza.
"O Pavão está sendo perseguido"
Apontado como herdeiro do traficante Fernandinho Beira-Mar, Jarvis Chimenes Pavão (foto ao lado) já foi alvo de cinco investigações da Polícia Federal no Rio Grande do Sul desde 2010. A primeira delas, batizada de Matriz e que também passou pela Serra, resultou no pedido de extradição de Pavão para o Brasil, o que pode ocorrer até o final do ano.
Apesar de ser descrito como um barão da cocaína, Pavão possui apenas uma condenação de oito anos de prisão, e é por esta sentença que ele está recolhido no Paraguai em uma penitenciária de segurança máxima controlada pelo Exército paraguaio. É com este argumento que o advogado de Pavão afirma existir uma perseguição da PF contra o seu cliente.
— Para engrossar as investigações e levar ao Judiciário, a Polícia Federal, principalmente a do Rio Grande do Sul, tem colocado o nome do Pavão como se ele tivesse participação nestes crimes de tráfico. O meu cliente não conhece as pessoas da Operação Coroa. A PF não tem dado o direito de esquecimento ao meu cliente — afirma Jean de Menezes.
De acordo com o advogado, as investigações da PF buscam alguém que “conhece ou que tem um telefone” para incluir Pavão e “transformar as investigações em um espetáculo”.
— Querem trazer o nome dele para uma investigação pequena e torná-la maior. Só que no presídio em que está, o Pavão não tem possibilidade alguma de gerenciar algo. É até um desrespeito com o Exército paraguaio que faz a custódia dele. Meu cliente está sendo perseguido e vamos comprovar.
Menezes, que assumiu a defesa de todos os processos de Pavão no Brasil, ressalta que seu cliente nunca teve relação com o Rio Grande do Sul — Pavão é natural de Ponta Porã. A contratação de uma defesa jurídica no Estado é explicada como uma decisão da família diante de tantas acusações que repercutem na imprensa.
— A família achou que era necessário falar. O meu cliente não tinha voz, apenas a Polícia Federal estava se manifestando. O Pavão está muito chateado. É um homem que está cumprindo sua pena. Parece que a Polícia Federal quer exterminar ele — reclama o advogado.
De acordo com a PF, Pavão é o maior fornecedor de cocaína do Brasil na fronteira entre Juan Pedro Caballero e Ponta Porã. A investigação aponta Ronei Ojeda e Osmar Cano como os responsáveis por receberem a droga e organizarem o transporte até a Serra Gaúcha – que ocorria em carros de luxo conduzidos por mulas (pessoas a serviço do tráfico), caso de um homem flagrado com 80 quilos de pasta base de cocaína em Veranópolis, em abril deste ano.