Se entre acadêmicos e profissionais pairam dúvidas sobre o futuro do Ensino Médio, entre os estudantes não é diferente. As dúvidas dizem respeito aos obscuros caminhos que irá trilhar o Ensino Médio no Brasil a partir da reforma instituída pelo governo federal, através da Medida Provisória (MP) publicada há uma semana no Diário Oficial da União. Isso porque as meras duas páginas do texto oferecem mais dúvidas do que respostas, e mesmo as questões de interpretação mais acessíveis não são menos controversas.
Leia mais:
Governo deve anunciar nesta quinta proposta que altera o formato atual do ensino médio
Saiba como as escolas de Caxias do Sul querem manter ou melhorar resultados
Nas últimas semanas, o assunto pautou discussões em salas de aula de colégios de Caxias do Sul, como a Escola Estadual Evaristo de Antoni, no bairro São José. Nesta instituição, o Pioneiro ouviu dois adolescentes do 3º ano que apresentam visões diferentes sobre a educação. Contudo, há pontos em comum, como a necessidade de tornar a metodologia de ensino mais atraente, e da escola formar, acima de tudo, o ser social.
Adriano Quevedo, 18 anos, é aluno do 3º ano da Escola Evaristo de Antoni. Quando terminar o ensino médio, quer cursar Análise de Sistemas, pois considera um emprego que pode dar uma boa remuneração. Por isso, terá de se esforçar para aprender bastante matemática, disciplina que não é o seu ponto forte. Jordi da Silva tem 21 anos e é apaixonado por ciências. Gosta de discutir sobre temas científicos com os amigos e quer ser professor de Física. Para o ano que vem, projeta fazer um curso pré-vestibular para tentar passar no vestibular da UFRGS. Confira abaixo o que ambos consideram a respeito da reforma do Ensino Médio:
Jordi da Silva, 21 anos
Qual a tua posição a respeito da flexibilização do currículo que consta na reforma do ensino médio proposta pelo governo federal?
Sou contra. Eu considero todas as matérias importantes, pois não posso ir para a escola só para aprender aquilo que eu gosto. Mesmo para ser um cientista, eu preciso saber me expressar em bom português, ter um conhecimento de língua estrangeira. Ter o conhecimento de História, por exemplo, é necessário para ter um posicionamento político e ajudar a definir o futuro do país. O ensino médio irá gerar um profissional para o futuro e te preparar para entrar no ensino superior, por isso precisa ser abrangente. Depois disso, tu vai focar em alguma coisa.
Tu consideras que as disciplinas de Sociologia, Filosofia, Educação Física e Artes, que passarão a ser flexibilizadas, devem ser obrigatórias?
Sim, nós precisamos delas, pois Sociologia e Filosofia formam humanos melhores e com mais conhecimento da sociedade, assim como o conhecimento artístico ensina a sensibilidade que precisamos ter e educação física nos ensina sobre o próprio corpo.
Qual tu esperas que seja o principal papel que a escola exerça na tua vida? Preparar para o mercado de trabalho ou para ser um cidadão melhor?
O papel da escola é um só: o de ensinar a socializar. Tu podes aprender tudo sobre ser um bom cidadão e fazer matérias profissionalizantes a partir de casa, mas tu não vai socializar se não estiver na escola. Por isso tu será alguém mais tímido, menos articulado. E futuramente, isso vai fazer falta. Considero que o papel principal da escola é mais do que preparar para o trabalho, mas ensinar a socialização.
O que pode melhorar na metodologia de ensino utilizada pela tua escola? Há métodos defasados?
A escola poderia se modernizar mais. Parece algo impossível hoje com a economia do país, mas acho que a utilização maior da tecnologia e da internet para o ensino facilitaria para que o ensino ocorresse com maior facilidade. O professor teria uma caixa de ferramentas gigante para dar uma aula melhor. Hoje, o que ele tem? Só um livro, uma caneta e um quadro. O Brasil precisa dar uma importância maior para a escola, e principalmente aos professores. É isso que se faz nos países de primeiro mundo e aqui não poderia ser diferente.
Adriano Quevedo, 18 anos
Qual a tua posição a respeito da flexibilização do currículo que consta na reforma do ensino médio proposta pelo governo federal?
Sou a favor, mas não da forma como está sendo feito. A ideia é legal, mas deveria ser construída aos poucos, e não largada de uma vez só. O ensino hoje em dia está fraco. Tu vem pra aula e só quer saber do lanche e da Educação Física, e só pensa em completar logo o ensino para poder entrar na faculdade e ir tendo chance de conseguir um emprego melhor.
Tu considera que as disciplinas de Sociologia, Filosofia, Educação Física e Artes, que passarão a ser flexibilizadas, devem ser obrigatórias?
Pra mim, elas devem ser obrigatórias, sim, mas devem ser melhoradas. Hoje em dia, para fazer um trabalho na escola, é só ir na internet pesquisar, decorar e apresentar. Depois da nota, tu não quer mais saber daquilo. Isso que está errado, porque essas matérias deveriam ter uma influência maior. Uma aula de matemática, por exemplo, te faz estudar e prestar bem atenção para resolver um cálculo. Mas essas, como Sociologia e Filosofia, só te fazem ir pra internet e não são nem atrativas, nem desafiadoras. Da mesma forma, tu vai pra aula de Educação Física e não aprende coisas novas, só passa o tempo, se diverte. Seria uma chance de aprender atividades diferentes.
Qual tu esperas que seja o principal papel que a escola exerça na tua vida? Preparar para o mercado de trabalho ou para ser um cidadão melhor?
Acho que é ensinar a viver na sociedade. Tu já sai de casa sabendo respeitar, mas no contato com os outros alunos tu vai saber conviver com opiniões diferentes, ter a tua própria. E por outro lado, tem a questão do emprego. Tu estuda pra terminar o ano, fazer uma faculdade e conseguir um emprego.
O que pode melhorar na metodologia de ensino utilizada pela tua escola? Há métodos defasados?
Principalmente no primeiro e no segundo ano, o aluno não vem para a escola para levar a sério, vem para brincar. O professor tenta criar coisas novas, mas isso não influencia o aluno, não o convence de que aprender um conteúdo vai ser interessante e divertido. Se ele não sai do celular e do Facebook, tenta usar aquilo a favor do aprendizado. Mostra que o celular pode ser útil para aprender mais sobre a matéria que ele está ensinando. Se eu fosse o professor, tentaria ser sério e divertido ao mesmo tempo, sabendo interagir. Onde eu trabalho tem muita matemática, mas na escola eu aprendo e esqueço, enquanto que lá aprendo e absorvo aquilo.