A bola não está subindo para os jogos do Caxias Basquete no Ginásio do Sesi, em Caxias do Sul. Palco das partidas do time da Serra pelo Novo Basquete Brasil (NBB) e de outros eventos esportivos e shows, o espaço localizado na Rua Ciro de Lavra Pinto, 818, no bairro Interlagos, abriu as portas para receber os desabrigados pelas enchentes na região. O local já chegou a receber mais de 80 pessoas. Atualmente, este número caiu para 43, entre crianças e adultos, uma vez que muitos já retornaram aos seus domicílios.
É o caso de dona Jalene Settin, 69 anos, moradora do bairro Galópolis. A aposentada deixou tudo que tinha na casa, em uma das localidades mais atingidas em Caxias, para se sentir mais segura no ginásio.
— Por precaução decidi vir para cá. Cada um dos meus vizinhos foi para a casa de parentes. O acolhimento aqui foi ótimo. Providenciaram tudo o que a gente precisava — destaca ela, que está desde sábado no local e já sente falta de casa:
— Sou aposentada, então cuido do terreno, da minha horta, minhas fruteiras, e sinto falta do meu dia a dia. Quero voltar o quanto antes.
Jeferson Oliveira da Silva, 28, também está utilizando o ginásio do Sesi como lar provisório. Morador do bairro Fátima, o pintor teve que deixar a casa quando surgiu a primeira rachadura na parede. Agora, está aproveitando também o tempo livre para ajudar quem está em situação semelhante. Foi iniciativa dele, por exemplo, montar uma sala de cinema, no cantinho da quadra.
— Estávamos com a TV no meio do ginásio e atrapalhava um pouco o pessoal e as crianças brincando e correndo. Surgiu a ideia de fazer um cantinho especial para eles brincarem e assistirem. Foi só juntar duas mesas, colchões e umas mantinhas. Fácil demais — diz Silva, que completou:
— Não é porque eu preciso que os outros não precisam também. Estou sendo ajudado, mas eu também posso ajudar nesse momento. Temos que saber reconhecer o que eles fazem pela gente e a gente poder fazer também.
Voluntário caminha uma hora de São Pelegrino ao Interlagos
A solidariedade também pisou nas quadras do ginásio do Sesi. Frederico Mueller, o Fred, 32, é professor de Educação Física e atleta de futebol americano do Juventude. Como mora no bairro São Pelegrino, ele anda cerca de seis quilômetros e leva uma hora até chegar ao Sesi para dar sua contribuição para adultos e crianças desamparadas.
— Assim, já pratico o exercício de cardio do dia. E aqui no Sesi. Fazemos brincadeiras, diversas atividades recreativas com crianças, fazendo uma brincadeira de uma queimada e eu creio que elas estejam gostando. Todas as vezes que eu terminei os exercícios elas ficaram perguntando se eu ia voltar no dia seguinte — destaca ele, que emendou:
— Espero que as pessoas possam ver que, às vezes, mesmo não tendo condições financeiras, elas podem ajudar dando suporte, conversando, levando o pessoal para caminhar, passear e isso já facilita o retorno a uma vida normal.
Número de famílias atendidas diminui
As 43 pessoas que fazem do Sesi um lar provisório ainda recebem atendimentos especiais, como revela a coordenadora administrativa Aline da Costa.
— A gente tem uma parceria legal com muitos voluntários e instituições. A FAS organiza, mas o Sesi colocou à disposição toda a equipe de funcionários, com atividades. Como a parte de saúde mental, com psicólogas fazendo todo o acompanhamento individual das famílias. Também a saúde bucal, com dentista. São pessoas que vieram de Vila Cristina, Galópolis, algumas estão passando pela cidade também e não conseguiram se deslocar para os locais de destino e estão abrigadas no ginásio — aponta ela.
A quadra passa a ser uma extensão de uma sala de casa, onde se forma uma grande família, que recebe três refeições diárias, com direito a lanche da tarde, roupas e conforto. Mais do que isso: as pessoas criam laços de amizade em meio à tragédia que ocorre fora dali. E para provar a boa convivência, por decisão de todos, as luzes do ginásio se apagam às 21h todas as noites. E ainda há espaço para mais moradores que vivem drama parecido.
— Muitas famílias ainda estão em situação de risco, vulnerabilidade em algumas áreas e, se voltar a chover, pode acontecer de ficarem mais casas com risco de desmoronamento. Estamos preparados para receber mais pessoas, se for o caso — finaliza a coordenadora.