Neste ano, completam-se 10 anos em que a vacina contra o HPV (o papilomavírus humano) está disponível pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Em abril, o Ministério da Saúde anunciou uma mudança no imunizante: o público-alvo, formado por meninos e meninas entre nove e 14 anos, passa a receber uma dose única, e não mais duas. Caxias do Sul e todos municípios da Serra disponibilizam a vacina dessa forma. Assim como ocorre com outras campanhas de vacinação, o desafio é vencer as notícias falsas e aqueles que rejeitam mais essa importante proteção. Em Caxias, um cenário é de que 83% das meninas do público-alvo estão vacinadas, contra apenas 47% dos meninos. Os dados são de 2023.
Já em 2024, de acordo com painel do Estado, 70,70% das meninas do público-alvo estão imunizadas em Caxias com uma dose. Entre os meninos, a faixa de vacinação é de 39,99%.
Como destaca o Ministério da Saúde, o vírus do HPV é responsável pela infecção sexualmente transmissível mais frequente do mundo, estando quase sempre associada ao câncer do colo de útero e outros tumores em mulheres e homens. O sexo é o principal meio, mas não é o único. Como explica a médica patologista Alessandra Guerra, há 200 tipos deste vírus, sendo que cerca de 160 desses têm como resultado verrugas em partes secas da pele. Os outros 40 são os que proliferam nas partes úmidas do corpo, como regiões genital, anal, boca e garganta.
— E aí, dentro desses 40, a gente vai ter um grupo deles que tem uma chance maior de provocar câncer e outros com uma chance menor. A gente chama, então, HPV de baixo risco, baixo risco de provocar câncer ou alto risco, alto risco de provocar câncer. De qualquer forma, têm que ser evitados e tratados. No mínimo, monitorados — esclarece a médica.
Atualmente, não existe uma medicação para o HPV. Nos casos de contaminação, o paciente recebe um tratamento indireto para fortalecer a imunidade e o próprio corpo expulsar o vírus. Um grande desafio em relação ao vírus, como destaca Alessandra, é que 90% das pessoas que o pegam não têm sintomas e podem não ficar sabendo. A faixa de 10% é que pode ter uma lesão como uma verruga (chamada de condiloma), uma lesão grave provocada pelo vírus ou até um câncer. A médica informa que o HPV é responsável 99,9% dos tumores de colo de útero, 80% dos encontrados na região anal e 50% dos cânceres de pênis.
— O HPV é um vírus muito democrático. Ele vai em qualquer um. Não importa a cor, raça, classe social, idade. Basta só transar. Não precisa mais nada. Teve esse contato com alguém que teve. Esse é o caminho. As pessoas que têm a lesão, ali no condiloma é o local onde a gente tem maior quantidade de vírus. Então é um lugar infectante. Quem entrar em contato com aquela lesão ali vai ter uma chance maior de se contaminar — explica a médica.
Por isso que, como lembra a médica, a vacina é feita para evitar essa contaminação e que a infecção torne-se algo pior.
O tabu
Em Caxias do Sul, 83% das meninas do público-alvo e 47% dos meninos já se vacinaram. Um dos tabus vistos pelos especialistas é de pais e mães recusando a imunização por ser um vírus sexualmente transmissível. A médica patologista lembra que assim como qualquer vacina, como a da gripe, a melhor idade para aplicação é na infância e adolescência pela produção de anticorpos.
— A gente tem um calendário de vacinas enorme para crianças e adolescentes porque é justamente a fase da vida onde o organismo pequenininho tem a maior capacidade de produzir anticorpos. Eles são muito bons em produzir anticorpos. E essa capacidade vai diminuindo ao longo do tempo. Então, vacinar adultos funciona, sim, mas não tão bem quanto vacinar adolescentes. A adolescência é o melhor momento para a gente vacinar — acrescenta Alessandra.
Adultos que quiserem também podem se vacinar, mas neste caso o imunizante deve ser procurado na rede privada. O valor varia de R$ 350 a R$ 900. A proteção também é menor do que receber a vacina na adolescência: na faixa etária do público-alvo, ela chega a 90%, enquanto que, após os 40, fica na faixa de 60%.
— Não é uma coisa desprezível. Não é tão bom quanto adolescente, mas não é desprezível — observa a especialista.
A vacina disponibilizada no SUS é a quadrivalente, com proteção aos quatro tipos mais comuns do vírus.
Meninos também
Pela anatomia do corpo masculino, como esclarece a médica, o homem tende a ficar menos tempo com o vírus. Porém, ele também pode ser atingido e também pode ser um semeador do vírus - especialmente aqueles não sabem que estão contaminados.
— O vírus se aloja na mulher e na vagina, que é escuro, úmido. E a gente não lava com água e sabão por dentro. Já no caso dos homens, vocês esfregam água, sabão e deu. Então, o vírus tem mais dificuldade de ficar com os homens. Normalmente, o vírus fica um tempo menor com os homens. Os homens eliminam mais rápido. Eles transmitem de uma pessoa para a outra. Mas elimina rápido. Já a mulher, não. Como é escondido, escurinho, úmido, ele fica lá, dois, três, quatro anos. É muito difícil a gente pegar um homem com uma infecção tão longa — conta a especialista.
Proteção é a vacina
É básico que o sexo precisa de proteção, até para prevenção a outras doenças. Ao mesmo tempo, toda comunidade deve manter a higiene em dia. Mas, para prevenir o HPV, a principal forma ainda é a vacina. A especialista explica que o vírus é de superfície. Ou seja, um preservativo dará proteção de cerca de 70%. Outra dica da médica patologista é cuidar da imunidade:
— Cuidar da imunidade quer dizer estilo de vida. Comer bem, dormir no mínimo seis horas por noite, fazer um pouco de exercício, duas horas de exercício por semana, e um pouco de sol. Isso garante que a tua imunidade vai estar boa. Ela estando boa, o vírus vem e sai. Acabou. Não faz bagunça. Então, a gente quer que esse contato seja o mais rápido possível. Entrou em contato, eliminou, tchau. A pessoa só vai produzir um câncer quando ela ficar muito tempo com o vírus no seu corpo.
Vacina contra o HPV
O imunizante pode ser encontrado em Caxias do Sul nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) para o público-alvo, que é de meninas e meninos entre nove e 14 anos, e os grupos prioritários. Confira abaixo os públicos indicados pelo Ministério da Saúde:
- Vítimas de abuso sexual de 9 a 14 anos ( homens e mulheres) que não tenham tomado a vacina HPV ou estejam com esquema incompleto administrar conforme a indicação da situação vacinal uma ou duas doses.
- Vítimas de abuso sexual de 15 a 45 anos ( homens e mulheres) que não tenham tomado a vacina HPV ou estejam com esquema incompleto administrar conforme a indicação da situação vacinal , completando três doses da vacina HPV (0, 2 e 6 meses)
- Meninas e meninos de 9 a 14 anos, com esquema de duas doses. Adolescentes que receberem a primeira dose dessa vacina nessas idades poderão tomar a segunda dose mesmo se ultrapassados os seis meses do intervalo preconizado, para não perder a chance de completar o seu esquema;
- Mulheres e Homens que vivem com HIV, transplantados de órgãos sólidos, de medula óssea ou pacientes oncológicos na faixa etária de 9 a 45 anos, com esquema de três doses (0, 2 e 6 meses) , independentemente da idade.
Em abril, o Ministério da Saúde fez uma recomendação de ampliar o público-alvo para até 19 anos. A Secretaria Estadual de Saúde (SES) explica que a orientação vale, inicialmente, para o norte do país. Conforme a Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização (CTAI), a região é a que tem a menor cobertura vacinal contra o vírus no país.
Fonte: Ministério da Saúde
*Colaboração de Bruna Marini, repórter da RBS TV.