Uma velha discussão volta à pauta da comunidade de Canela. Nesta quarta-feira (15), às 19h, uma audiência pública está marcada na Câmara de Vereadores para discutir o projeto de lei 06/2023. A proposta da prefeitura quer permutar o Centro de Feiras do município pela construção de um centro de eventos no Parque do Palácio das Hortênsias, sede da casa de verão do governador do Estado desde os anos 1950. O projeto tem resistência de parte dos moradores, que acreditam que área verde de nove hectares pode ser prejudicada com a construção.
De acordo com a proposta protocolada na Casa Legislativa, a justificativa da prefeitura é a lei que permitiu a doação do parque por parte do Estado para o município, em 2010. Na época, a lei assinada pela então governadora Yeda Crusius (PSDB) doava a área desde que a prefeitura construísse um centro de convenções e congressos no local. Caso contrário, o Estado tomaria de volta o bem.
A lei não estipulou um prazo. Agora, de acordo com o secretário de Governança, Planejamento e Gestão de Canela, Gilmar Ferreira, a prefeitura tem um acordo com a Casa Civil do RS de que a obra deve estar pronta até janeiro de 2025, para que a área fique com a prefeitura. A reportagem tentou confirmar esta informação com o governo do Estado, que não respondeu até a conclusão desta matéria.
— Qual foi a saída que o prefeito (Constantino Orsolin - MDB) encontrou? Nós temos uma área de aproximadamente 10 mil metros quadrados, no centro da cidade, onde está o antigo Centro de Feiras. Então, se decidiu alienar esse ativo da prefeitura para construção desse centro de congresso e convenções para atender essa exigência da doação — explica Ferreira.
Ainda conforme o secretário, o Centro de Feiras está avaliado em R$ 25 milhões e conforme o projeto de lei, todo valor, caso se confirme a venda, deve ser investido obrigatoriamente na construção da estrutura no Parque do Palácio. Para a prefeitura, a discussão no momento é focada nesta permuta, por conta do prazo que teria sido estipulado pelo Estado.
O vereador Jeronimo Rolim (PDT), que preside a Comissão de Constituição, Justiça e Redação Final (CCJ) - que convocou a audiência pública -, explica que quer ouvir a população antes da comissão dar o parecer. Rolim diz que não é contra a construção de um centro de eventos, mas não concorda com a estrutura a ser colocada no parque. Além desta obra, o projeto da prefeitura prevê ainda um estacionamento no local.
— Só de previsão de estacionamento, não teria local suficiente no Parque do Palácio. Não existe o porquê de fazer um crime ambiental com o centro de eventos. O prefeito defende isso porque diz que tem uma lei que precisa ter (o centro de eventos) ali. Mas lei a gente altera, conversa com os deputados e faz uma proposta diferente. Alternativas há várias para essa situação — declara Rolim.
O projeto de lei foi protocolado em regime de urgência. Além da CCJ, ele ainda passa pelas Comissões de Orçamento, Finanças e Tributação e de Desenvolvimento Econômico e Social, antes de ir a votação no plenário.
Entidade não aprova construção
Em 2018, a prefeitura de Canela tentou aprovar a construção a partir de outro projeto, que concederia o parque para o setor privado. Na época, a única empresa interessada queria também construir um hotel no local. A entidade Amigos do Parque do Palácio, em conjunto com a comunidade, se movimentou contra o projeto, que foi arquivado após pressão popular. Novamente, o grupo vê que a construção do centro de eventos é prejudicial aos biomas do Parque do Palácio e mudaria a proposta da área, de ser um parque aberto ao público.
— Lamentavelmente, é uma nova tentativa da prefeitura de utilizar a área, que tem três biomas nativos, tem uma diversidade enorme de fauna e de flora, e que a população utiliza, e (a prefeitura) tem o objetivo de transformar em um objeto que não é um parque aberto — afirma Fernando Gomes, membro da associação.
Em 2018, a entidade também ofereceu um projeto para a prefeitura, focado em dar infraestrutura ao parque, incluindo um anfiteatro a céu aberto - para atender a exigência do governo do Estado. A mesma proposta indicava caminhos para o investimento. Gomes afirma que o plano foi engavetado pela administração local.
— Trazia novos investimentos para o parque com o intuito de ter maior acessibilidade, maior aproveitamento, tanto na questão ambiental quanto cultural e artística, como o anfiteatro, de espaços de exposição, de educação ambiental, de receber as escolas com uma estrutura maior. Tínhamos propostas de financiamento, de busca de verba junto a órgãos ou entidades privadas que foram sondados e tinham interesse — conta Gomes.
Hoje, o Parque do Palácio está fechado ao público. A associação alega que o patrimônio é alvo de vândalos e virou local de drogadição. A assessoria da prefeitura informou que o local está fechado para a construção de trilhas e ajardinamento, e que, além disso, contou com instalação de cercamento e deve ter também instalação de iluminação.
Em caso de aprovação do projeto, a prefeitura pretende abrir uma licitação em regime de urgência. A liberação de uma licença ambiental, inclusive, ficaria a cargo de órgãos municipais. Ainda conforme a assessoria de imprensa da prefeitura de Canela, a Secretaria Municipal do Mei0-Ambiente não vê impeditivos para a obra.
— Deixando claro que não vai haver supressão de árvores, porque o parque tem um bioma diferente, que essa é a luta dos ambientalistas e nós respeitamos muito essa questão ambiental, até por isso se protelou — declara o secretário de Governança, Planejamento e Gestão de Canela, Gilmar Ferreira.
Ao mesmo tempo, o município de Canela está sendo investigado pelo Ministério Público (MP), desde 2021, a partir de inquérito civil sobre situação de abandono do Parque do Palácio.
Foco da discussão deve ser a troca de bens, diz presidente da Câmara de Vereadores
O presidente da Câmara de Vereadores de Canela, Jefferson de Oliveira (MDB), acredita que o foco, no momento, deve ser a discussão sobre o projeto de lei em si. Para ele, o debate será se os parlamentares aprovam ou não esta troca:
— O que está sendo discutido na Câmara é a questão da permuta. O objeto dessa lei só está pedindo se a Câmara troca o Centro de Feiras por R$ 25 milhões para construção do centro de eventos no parque. Não tem nada nessa lei falando da questão ambiental ainda. A lei pede a permuta das áreas, e aí depois, num próximo momento, acredito que o Executivo vai apresentar o projeto de construção e o estudo de impacto ambiental — disse Oliveira .