A promessa da prefeitura de Flores da Cunha de cobrar na Justiça a manutenção do passe livre para moradores do entorno no pedágio se confirmou. O município protocolou a ação contra o Estado e a concessionária Caminhos da Serra Gaúcha (CSG) no fim da tarde de sexta-feira (10). No início do dia, o prefeito César Ulian (Progressistas) acreditava que o encaminhamento poderia ficar para esta segunda-feira (13) porque a Procuradoria Geral do Município (PGM) ainda estudava a linha que seria adotada na ação. Até as 11h de segunda, o pedido ainda não havia sido analisado pelo judiciário.
O município decidiu ingressar com a ação após as conversas com a CSG e o governo do Estado não evoluírem. Até o dia 31 de janeiro, quando as cancelas eram operadas pela Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), moradores de quatro comunidades do entorno tinham passagem livre. O benefício era concedido a partir de um cadastro realizado na prefeitura que também poderia se estender a outras localidades.
Com o início das operações da CSG no último dia 1º, porém, as isenções foram derrubadas. O motivo é que o novo modelo de concessão não prevê passagens livres para comunidades locais, condição que havia sido apresentada nos debates públicos. O contrato de concessão, inclusive, impede a concessionária de beneficiar usuários em detrimento de outros.
Inicialmente, o município buscou a CSG, que disse não poder adotar o benefício. Diante da negativa, as conversas passaram a ser mantidas junto ao governo do Estado. Em reunião entre Ulian e o secretário de Parcerias e Concessões, Pedro Capeluppi, na última semana contudo, o titular da pasta informou que medidas governamentais para garantir o passe livre precisariam ser analisadas pela Assembleia Legislativa.
O prazo para a tramitação nesse caso poderia superar um ano, o que faria qualquer medida perder efeito. Isso porque o pedágio será deslocado em cerca de três quilômetros até o fim de 2023, deixando de isolar as comunidades em relação ao centro de Flores da Cunha. Moradores ouvidos pelo Pioneiro disseram, inclusive, que aceitam pagar a tarifa no novo endereço.
A prefeitura de Flores da Cunha não informou a linha de argumentação adotada na ação, mas a decisão segue o exemplo do município de Portão, que também tentou manter as isenções na Justiça ainda no primeiro dia de operações da CSG. O juiz Eduardo Pereira Lima Zanini, da 1ª Vara Judicial da Comarca de Portão, no entanto, negou o pedido. Ele acatou os argumentos do Estado e da CSG de que a medida causaria o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato. A prefeitura vai recorrer da decisão.
A CSG disse que ainda não foi notificada. Já o Estado adiantou que vai responder aos questionamentos legais e jurídicos da ação.
Escoamento da safra pelo desvio
Um dos principais argumentos do prefeito César Ulian para ingressar com a ação judicial é a necessidade de produtores de uva utilizarem a rodovia para o escoamento da safra. Em entrevista ao programa Gaúcha Hoje da Gaúcha Serra na sexta-feira, ele disse que produtores precisam fazer mais de uma viagem por dia para garantir as entregas.
O contrato de concessão da CSG prevê cobrança todas as vezes que o motorista passar pelo pedágio, independentemente do sentido ou da quantidade de viagens em um único dia. O único benefício previsto é o desconto de usuário frequente (DUF), que oferece reduções escalonadas de até 20% dependendo da quantidade de tarifas pagas dentro de um mês. A regra vale para pagamento automático, por meio das tags.
A opção dos produtores, então, é utilizar o desvio pela Estrada das Indústrias. Bastante conhecido pelos moradores da região, o trajeto de seis quilômetros é pavimentado e apresenta boas condições de asfalto e sinalização. A via mantém, contudo, as características de estrada vicinal, com terreno acidentado, ausência de acostamento e pouca largura. Também há redutores de velocidade, dispositivos inexistentes no trecho desviado da RS-122.
Na manhã desta segunda-feira, o Pioneiro acompanhou o deslocamento do produtor rural Gilmar Pagno, 57 anos. Morador das proximidades da Capela São Vitor, no interior de Flores da Cunha, desde o início das operações da CSG tem utilizado o caminho alternativo. A viagem, porém, conta com dificuldades não enfrentadas pela rodovia estadual. A principal delas é um aclive que dificulta a subida de caminhões com quase sete toneladas de uva, como era o caso do veículo de Pagno. Para contornar a situação, os veículos precisam reduzir a carga que seria transportada.
— Poderia carregar um pouquinho mais, não muito porque o meu caminhão não é muito maior. Mas pelo pedágio eu coloco só terceira (marcha). Aí tu ganha tempo e não castiga o motor do caminhão. Conseguiria vir mais rápido e economiza em combustível também. Eu levo a base dos quarenta minutos. Quarenta, 45, 35, depende. Se não achar um caminhão na frente, não achar nada que vai mais devagar que eu, vai pouco mais rápido. E pelo pedágio seria mais rápido porque não pega morro nenhum. Dá pra fazer uns 10 minutinhos mais rápido — relata.
O pagamento da tarifa não é uma opção para Pagno porque ele aumentaria muito o custo da entrega sem nenhum tipo de compensação.
— Fica ruim pra gente porque já estamos meio exprimidos no lucro da nossa uva — revela.