O início do ano letivo tanto na rede municipal de Caxias quanto na estadual está prestes a completar duas semanas, mas há pais buscando por novas vagas ou transferências. As preocupações se refletem na porta da Central de Vagas, na Avenida Júlio de Castilhos, em São Pelegrino. As filas menores em comparação às registradas semanas antes do começo das aulas são reflexo da adoção de atendimentos agendados, mas a dificuldade em encontrar uma escola para todas as crianças não só continua como aumentou.
Para conseguir atendimento, Patrik Salles, 31 anos, precisou retirar a ficha de agendamento no último dia 17. Na manhã desta quinta-feira (3) ele aguardou cerca de duas horas para tentar conseguir uma transferência para o filho de 11 anos, que foi designado para uma escola várias quadras distante da casa onde mora a família. A tentativa é realocar o menino para a escola onde estuda a filha mais velha de Salles, de 12 anos. Um outro filho de cinco anos, está na Educação Infantil em uma instituição também a poucos minutos de casa.
— Nem para a aula ele está indo. Nós confirmamos a matrícula na escola, mas porque íamos tentar a transferência — relata.
Já a auxiliar administrativa Leidiane Lopes, 40, busca vaga para duas filhas na rede municipal de Educação Infantil. Elas já mudaram de instituição, mas foram designadas para uma região muito longe de casa.
— Como as escolas estaduais mudaram de horário, fiquei sem van e vou tentar transferir para uma escola mais perto — afirma.
Antes do início das aulas, um acordo entre município, Estado e Ministério Público havia definido que todas as pendências seriam resolvidas em até duas semanas após o início do ano letivo. Agora, a secretária de Educação de Caxias do Sul, Sandra Negrini, já admite que não há possibilidade de cumprir o prazo. O motivo são novos pedidos de vagas que continuam chegando. Até janeiro, eram atendidos 150 pessoas por dia, número que dobrou em fevereiro. Segundo Sandra, um dos principais motivos da procura atípica neste ano é o retorno às aulas presenciais.
— Temos 290 crianças que aguardam designação, a maioria de quatro a cinco anos. Essas crianças não estavam atreladas a nenhuma escola da rede pública no ano passado — revela.
Além de crianças que migram da rede privada para a pública, existem ainda casos de famílias chegando à cidade e de troca de endereço dentro do próprio município, muitas vezes motivados por questões de trabalho dos pais. Todos esses fatores interferem na demanda. Nesta sexta-feira (4) está prevista uma reunião entre a Secretaria Municipal de Educação (Smed), 4ª Coordenadoria Regional de Educação (4ª CRE) e coordenações da Central de Vagas para buscar uma solução.
— Já abrimos muitas turmas, temos trabalhado em regime de cooperação. Tem uma série de fatores, muitos previsíveis e muitos não. Esse é um direito constitucional e não vamos nos furtar - afirma a secretária.
A reportagem não conseguiu contato com a Coordenadora da 4ª CRE, Viviane Devalle
Ministério Público acompanha situação
A promotora regional de Educação, Simone Martini, reforça que pedidos não esperados de vagas tem dificultado a distribuição dos estudantes entre as instituições seguindo a legislação, que determina distância de até dois quilômetros (ou transporte, caso exceda) e irmãos em uma mesma escola. Ela afirma, inclusive, que municípios que nunca enfrentaram problemas, como Nova Bassano, têm sofrido com falta de vagas devido à migração ocorrida na Serra.
Conforme Simone, em todos os anos ocorre uma acomodação com o surgimento de vagas pontuais por conta de alunos que não comparecem, por exemplo. No entanto, ela tem mantido conversas com o município com o objetivo de encontrar uma solução para o restante da demanda. A principal hipótese, por exemplo, é a abertura de novas turmas, mas isso demanda mais pessoal.
Onde tem estrutura pública, tem que abrir, mas esbarramos em outro problema que é a falta de professores. Até mesmo municípios estão começando a enfrentar falta de professores porque não tem disponível no mercado. São complicadores que nos dão um desafio maior do que gostaríamos de ter. É um tema para ontem, mas quando olhamos porque essas coisas acontecem, esbarramos nessas outras questões.
A promotora espera que a situação esteja bem encaminhada até o fim da próxima semana, caso contrário irá buscar outras medidas.
— Se não se resolver na via extrajudicial, vamos resolver na judicial — prevê.
Impacto também no Conselho Tutelar
Responsável por buscar o direito de crianças e adolescentes, o Conselho Tutelar também tem sido impactado com o gargalo na educação. Pais que não conseguem resolver as pendências na Central de Vagas tem buscado a instituição na esperança de uma solução. Muitas vezes, porém, eles também saem sem uma resposta conclusiva, já que a atuação do Conselho também tem limitações.
Na manhã desta quinta-feira, conselheiro da macrorregião norte se reuniram com a coordenação da Central de Vagas para tentar encaminhar uma solução para o problema. O que ouviram foi justamente a falta de vagas no momento.
— O problema todo é porque falta escola. As pessoas saem da Central e vão direto no Conselho porque não conseguem dar uma resposta para o povo — observa o conselheiro Maurício Abel.
Já o Conselheiro Wagner Padilha afirma que a instituição também fica de mãos amarradas diante da falta de estrutura para atender a todos os pedidos.
— O Conselho Tutelar trabalha na violação do direito. Tirando isso, não tem mais o que fazer a não ser cobrar o poder público — acrescenta.