A aprovação na conquista da primeira habilitação não impede que muitos condutores ainda fiquem tensos na hora de sentar no banco do motorista, ligar a chave e sair dirigindo um veículo pelas ruas. Tarefa que fica ainda mais difícil quando a buzina de outros automóveis acaba soando como mais um modo de pressão a quem dirige. Para superar esses desafios e conduzir o carro de forma mais tranquila, a estudante Danielle Stolfo Donati, 21 anos, adotou uma iniciativa inusitada no trânsito de Caxias do Sul: fixou um adesivo no vidro traseiro do veículo alertando aos motoristas sobre a sua falta de experiência ao volante.
Danielle conta que tirou a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) há mais de dois anos, logo quando completou a maioridade, mas, como não tinha carro, não praticou a direção tão logo recebeu a aprovação do documento. Situação essa que mudou em novembro do ano passado quando comprou um automóvel para, principalmente, ir de casa ao trabalho. Por isso, se considera uma recém-habilitada, reaprendendo comportamentos básicos para quem precisa conduzir um veículo.
Logo nos primeiros momentos, os desafios da nova condição apareceram.
— Comecei dirigindo bem, mas no terceiro dia, antes ainda de passar a valer o seguro, bati com o carro no portão da garagem de casa. E isso me deixou muito mal, comecei a desenvolver um trauma que foi aumentando na medida que eu estava mais na rua com o carro — explica ela, que está no sétimo semestre do curso de Psicologia.
A primeira saída encontrada pela estudante para superar essa dificuldade foi procurar por aulas particulares de direção — uma dica recomendada pelos especialistas (leia mais abaixo). Os resultados começaram a aparecer rapidamente e ela conta que se sentiu mais tranquila na condução do automóvel. Mesmo assim, Danielle ainda tinha outro desafio: se atrapalhava e deixava o carro apagar na rua, situação que rendeu buzinas e xingamentos de outros motoristas.
No último Natal, depois de relatar aos primos as suas experiências traumáticas no trânsito, ela recebeu um presente da família: um adesivo amarelo formado por letras pretas com o alerta “Recém-habilitada. Tenha paciência: se eu ficar nervosa, o carro morre”. Mais do que uma atitude corajosa, ela define a decisão de avisar a falta de experiência ao volante como um alívio e recomenda que outras pessoas também adotem essa iniciativa.
— Começou como uma brincadeira, mas disse para os meus primos que queria mesmo colocar o adesivo e eles foram atrás. Em nenhum momento tive vergonha. Penso que, como motorista, sou responsável por quem está comigo ao meu lado e também pelos demais que estão na rua. A partir do momento que eu aviso que não tenho prática, faço com que o outro motorista tenha mais empatia com a minha dificuldade. Se ele quiser buzinar e reclamar mesmo assim, é uma escolha dele — define.
Danielle percebe que as relações no trânsito mudaram depois que fixou o aviso. Além de mais confiança ao volante, ela entende também que os motoristas no seu entorno estão mais pacientes. Salvo exceções, como em uma tarde na BR-116, próximo ao bairro Planalto, quando se deparou com um caminhão à sua frente e não conseguiu fazer a ultrapassagem, irritando motoristas que estavam atrás dela. Além disso, percebeu que muitas pessoas param próximo ao seu carro e fazem fotos do adesivo, algo que ela diz gostar da repercussão.
— Prezo muito pelo senso de humor e isso ajuda bastante também nesse processo. Está tudo bem não ter prática, não tem mal nenhum em admitir isso e o aviso torna público esse meu pensamento. Estou aprendendo a cada dia e, quem estiver perto, pode ajudar e não atrapalhar — conta a jovem, que diz não ter visto nenhum outro carro na cidade com um adesivo semelhante.
Para ela, empatia é uma palavra-chave no trânsito, seja para novos ou experientes motoristas.
— Todo mundo tem um começo. O trânsito é perigoso, mas a gente pode tornar ele melhor tendo mais empatia com os outros. Coloquei o adesivo para que fiquem menos estressados comigo quando apago o carro. Melhorei bastante nisso (risos). Estou tentando fazer a minha parte para que as coisas fiquem mais leves — afirma.
"Receio da avaliação dos outros", diz psicólogo
Apesar de também acreditar que o trânsito devesse ser um espaço menos estressante e mais empático, o psicólogo e mestre em psicologia clínica pela Universidade de Caxias do Sul (UCS), William Fiuza, avalia que atitudes como essa, de avisar sobre a falta de experiência, são bem-vindas.
Segundo ele, que apresentou tese no mestrado sobre o medo de dirigir em mulheres, a ansiedade e a preocupação com a opinião alheia acabam deixando o processo mais difícil e se tornando uma fobia.
— O nervosismo ao dirigir está muito associado ao receio da avaliação dos outros do que com o ato de dirigir em si. Optar por colocar um aviso demonstra como nós nos preocupamos com os outros e como vão reagir caso façamos algo errado na condução do veículo. Não é que a pessoa não saiba dirigir, é a condição de nervosismo que vai impedir — analisa.
Além do aviso, Fiuza recomenda outras práticas que ajudam aos motoristas que precisam de ajuda para conduzir um veículo com mais tranquilidade. Ainda segundo ele, para ganhar confiança, a prática segue como a principal recomendação. Porém, é possível amenizar o processo.
— Dá para ir avançando aos poucos e desenvolvendo essa habilidade de dirigir. Mas é preciso se expor aos poucos, como dirigir em locais menos movimentados, ou com uma pessoa de confiança do lado, não dirigir em condições climáticas ruins. Tudo isso para poder ir evoluindo aos poucos — recomenda.