Um dia depois de a Fundação de Assistência Social (FAS) ter esvaziado a calçada da Rua Plácido de Castro, no bairro Exposição, em frente à Metalúrgica Abramo Eberle (Maesa), em Caxias do Sul, novos moradores de rua passaram a transitar pelo espaço durante a quinta-feira (20). Os dois "antigos moradores" aceitaram serem levados a casas de acolhimento disponibilizadas pelo município. Segundo a FAS, eles permaneciam fora da rua até a noite de quinta. No entanto, conforme relato de moradores das proximidades, a via voltou a receber movimentação de outras pessoas durante o dia, fato confirmado pela reportagem. No começo da noite, porém, a presidente da FAS, Katiane Boschetti, passou pelo local e observou que não havia mais ninguém.
— Só tinha algumas coisas, estamos averiguando a limpeza do espaço. Há pessoas que passam por ali, aproveitam a sombra, mas não dá para dizer que a rua voltou a ser utilizada como residência — diz Katiane.
Por volta das 20h30min, no entanto, a reportagem voltou ao local e um homem dormia na calçada.
Nos últimos tempos, a calçada da antiga Maesa havia passado a ser local de abrigo para algumas pessoas em situação de rua na cidade. Por vezes, eram montadas estruturas improvisadas no passeio público. Na quarta-feira (19), parte do material foi retirado do local depois que os dois homens que estavam ali foram convencidos a ir até as casas de acolhimento. Na quinta (20), quem estava na Plácido de Castro durante a tarde era Tiago dos Santos, 42 anos, que confirmou que o local é um dos melhores para estar em Caxias do Sul.
— Porque é calmo, não passa ninguém — admitiu ele.
Na rua há 20 anos, Santos diz ter vontade de viver outra vida, mas já não parece conhecer outra realidade senão a vivida nas calçadas. Ele diz não conseguir permanecer por muito tempo nos abrigos públicos e passa os dias dependendo da caridade de outras pessoas.
— Os moradores não se incomodam, até ajudam, dão bóia (comida) para nós — confirma ele.
Mas a intenção das pessoas em ajudar é vista com outros olhos pela FAS:
— A comunidade deve saber que o poder público tem uma rede forte de ajuda às pessoas em situação de rua. Mesmo que com boa intenção, acaba incentivando a permanência dessas pessoas nesses locais — afirma a presidente da FAS, Katiane Boschetti, que lembra do Projeto Todos na Mesa.
A iniciativa, que funciona desde a segunda metade do ano passado, oferece refeições diárias dentro de espaços comunitários e atende demandas em outras áreas que necessitem de intervenção. O "Todos na Mesa" ocorre nas segundas, quartas e sextas na Igreja Pentecostal, da Rua Pinheiro Machado, 2458. E nas terças, quintas e sextas, no Restaurante Popular do bairro Lourdes, Rua Sinimbu, 96.
Segundo dados do Cadastro Único da FAS, atualizado no final de dezembro do ano passado, são 644 pessoas em situação de rua no município, sendo a maioria de homens. O número é maior que o percebido no início da pandemia, em abril de 2020, quando 354 pessoas ocupavam as ruas da cidade para morar, conforme números divulgados na época. O mesmo material, disponibilizado pela prefeitura, informa também que, no início de 2020, eram 741 sem-teto na cidade.
No cargo desde janeiro do ano passado, a presidente da FAS, Katiane Boschetti, diz não reconhecer os dados sobre a população em situação de rua e qual a metodologia utilizada nos números de 2020. Segundo ela, com base no cadastro do órgão, eram 643 pessoas morando de forma improvisada em ruas e calçadas do município em abril daquele ano.
— As informações que usamos são baseadas no Cadastro Único, tanto para o dado mais recente, de dezembro do ano passado, como para os de abril de 2020. Mesmo assim, os números do Cadastro Único mudam bastante porque a população vem ou sai da cidade — explica Katiane.