O Conselho Tutelar da Região Norte de Caxias do Sul programou uma série de atividades para marcar o Dia Nacional do Conselheiro Tutelar, celebrado nesta quinta-feira (18). A data foi instituída pela Lei nº 11.622, de 19 de dezembro de 2007. A programação começou ainda na terça-feira(16) e segue até segunda-feira (22). Os cinco conselheiros responsáveis pelos atendimentos de bairros da Zona Norte, Marjorie Sasset, Maurício Abel, Josue Orian, Wagner Padilha e Gilmar Ferreira, visitaram escolas, centros de convivência e unidades básicas de saúde (UBSs). Os encontros foram destinados às crianças, adolescentes e aos profissionais que também identificam quando é necessário acionar o Conselho Tutelar.
Durante a manhã desta quarta-feira (17) a reportagem acompanhou os conselheiros Marjorie Sasset e Maurício Abel em visita ao Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) Irmão Sol, no loteamento Campos da Serra. Lá, são atendidos 80 crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Sentadas em um círculo, todos ficaram atentos quando Abel questionou se sabiam o que é o Conselho Tutelar e em que momento é acionado.
— Se a criança não vai para a escola, o Conselho Tutelar tira dos pais — disse um menino.
Outra menina ergueu a mãozinha e disse que se desobedecer, o Conselho Tutelar "pega". Os demais seguiram na mesma linha, demostrando que sentem certa apreensão em relação ao nome.
— Minha mãe foi chamada — contou uma adolescente.
Conversa para descontruir mitos
O conselheiro Maurício Abel conta que em todas as visitas aconteceu a mesma reação:
— Nós instigamos e eles participam, levantam a mão, mas sempre têm o conceito com sentido pejorativo. Eles não vêem o Conselho Tutelar como proteção. Virou um instrumento de ameaça tanto dos pais que amedrontam os filhos quanto dos filhos, especialmente, os adolescentes que, quando não querem obedecer, dizem que vão denunciar os pais por violência psicológica.
A conselheira Marjorie assumiu a conversa para explicar às crianças e aos adolescentes que eles têm direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e que os Conselheiros Tutelares têm de garantir que eles tenham acesso ao que está previsto na lei.
— Vocês sabem quais diretos têm?
As crianças ergueram a mão e enumeraram deveres:
— Lavar a louça — diz uma menina.
Um menino complementou:
— Arrumar as roupas, guardas os brinquedos.
Marjorie explicou, porém, que eles têm direito a uma vida digna:
— Vocês têm direito a alimentação saudável, higiene, roupas, escola, saúde. Ajudar nas atividades domésticas, por exemplo, não é trabalho infantil. Vocês podem ajudar os pais, mas um adolescente, um de vocês deixar de estudar para trabalhar o dia todo ou para cuidar dos irmãos mais novos não pode — esclareceu.
As crianças continuaram com a interação:
— Não pode ficar sozinha em casa e nem na rua.
Outro menino disse que bater em criança (gesticulando com as mãos como se fossem tapas), é ilegal:
— Isso mesmo, é um crime bater em crianças e adolescentes — explicou a conselheira.
Um menino acrescentou:
— É como se fosse a Maria da Penha das Crianças.
O bate-papo continuou e a conselheira explicou que todos têm direito a estar numa família em que se sintam seguros:
— Vocês têm que conviver numa família que cuide de vocês, que proteja, onde ninguém seja violento. Existe agressões que machucam o corpo, e outros ferem o coração e a alma. A agressão física deixa marcas, mas a psicóloga ninguém vê e muitas crianças e adolescentes passam por isso. Vocês sabem o que é violência psicológica? — questionou ela.
As repostas chegaram ao mesmo tempo:
— Xingar.
— Falar nome.
— Chamar de burro.
"Queremos criar um vínculo para que eles confiem na gente e peçam ajuda quando precisarem"
A conselheira Marjorie Sasset explica que a ideia surgiu para realizar intervenções preventivas nos serviços que demandam atendimentos. Além disso, os conselheiros querem fortalecer a rede e proporcionar esse momento dinâmico de escuta e diálogo com as crianças e os adolescentes
— Há muitos estereótipos e mitos sobre o que é o Conselho Tutelar. Levamos cartazes nas escolas e entregamos cartilhas também para desmistificar esses conceitos.
Marjorie explica que eles reproduzem as falas dos adultos e que isso acaba afastando as crianças e os adolescentes, que temem denunciar que estejam passando por situações de maus-tratos, abusos ou violência.
— São as falas dos pais que intimidam eles. Isso distancia eles cada vez mais e eles não relatam as situações que vivem. Queremos criar um vínculo para que eles confiem na gente e peçam ajuda quando precisarem. Temos que trabalhar na infância porque os adultos têm opinião formada. Nosso objetivo é que confiem em nós.
Serviço é essencial para o bem-estar das crianças e adolescentes
Qualquer pessoa pode acionar o Conselho Tutelar para denunciar situações que acreditam que precisam ser averiguadas pelo bem-estar das crianças e adolescentes. As escolas, os serviços de convivência e as entidades recorrem aos conselheiros em casos que consideram sérios e precisam de resolução. Para essas instituições, há um formulário para documentar e formalizar a denúncia, que tem mais peso no momento em que é apresentado ao Ministério Público (MP):
— São casos em que o profissional percebe que há necessidade de acionar o Conselho Tutelar, que os direitos daquela criança ou adolescente não estão garantidos e nos aciona. Eles mesmos fazem a escuta, e então não precisamos ouvir novamente a criança, evitando que ela passe novamente pela situação de reviver aquilo que aconteceu com ela — destaca Marjorie.
A coordenadora do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) Irmão Sol, Fernanda Osório Borges, ressalta que os principais casos registrados são de negligência e relacionados à educação, uma vez que não há escola no loteamento Campos da Serra, e os jovens frequentam sete escolas da região, e até o sexto ano tem transporte pago pelo município, mas depois é por conta da família.
— Temos casos principalmente de abandono, sem alimentação, sem higiene, e envolvem crianças e adolescentes de várias idades. Sempre que percebemos que há uma situação que precisa de intervenção, o educador faz o relato e acionamos o Conselho Tutelar e o Cras (Centro de Referência em Assistência Social) também para buscar uma solução. Geralmente, quando se trata de escola, a resposta chega logo. Nos demais casos, os educadores observam e relatam e tentamos buscar mais informações — explica Fernanda.
Números da Região Norte
A Zona Norte tem alto índice de denuncias encaminhadas para o Conselho Tutelar. De acordo com o levantamento de janeiro a setembro deste ano, foram realizados 619 atendimentos na sede. Em todo o ano passado foram 747. Também foram registradas 348 averiguações no local contra 501 em todo 2020. O plantão atendeu 293 ligações neste ano, e 371 no ano passado. O número de denúncias em 2021 até o momento é de 804 e em 2020, foram 926.
O que é o Conselho Tutelar
É um órgão administrativo que atua com base em informações provenientes de denúncias anônimas ou com base em formulários repassados por escolas, serviços de convivência ou entidades. O conselheiro tutelar deve ouvir e entender as situações que lhe são apresentadas e, então, depois da análise das situações específicas de cada caso, aplica as medidas necessárias à proteção dos direitos da criança ou adolescente.
Como acionar?
A população pode denunciar pelo Disque 100, onde a ligação é gratuita e pode ser anônima. Em Caxias, as denúncias também podem ser feitas pessoalmente na Rua Augusto Pestana, 26, no bairro São Pelegrino.
Conselhos Tutelares
Conselho Tutelar Macrorregião Norte
Telefone: (54) 3227-7150
email: ctnorte@fascaxias.rs.gov.br
Conselho Tutelar Macrorregião Sul
Telefone: (54) 3216-5500
email: ctsul@fas.caxias.rs.gov.br
Plantão
Telefones: (54) 98408-0066 ou (54) 99104-7998.
Segunda a sexta: das 12h às 13h30min e após às 17h30min.
Sábado, domingo e feriado: 24 horas.