É por meio da análise de cadastros no sistema de saúde e de orientações que equipes de saúde de pequenas cidades da Serra têm conseguido identificar e atrair pessoas que recusam as vacinas contra a covid-19. Essa estratégia permite ampliar a imunização, o que vai ajudar a diminuir ainda mais o número de pacientes hospitalizados em razão da doença na região.
Isso só é possível porque os municípios de menor porte conseguem controlar quantos e quem são os moradores que ainda não se vacinaram. A busca ativa inclusive vem sendo aplicada com sucesso para completar o esquema vacinal daqueles que estão com a segunda dose em atraso.
A reportagem contatou 30 cidades com menos de 4 mil habitantes (segundo estimativas do IBGE) para verificar em quais há esse controle (confira abaixo). Cotiporã, por exemplo, tem 3.824 moradores e 46 deles recusaram a vacina.
Entre os argumentos científicos usados pelas equipes para convencer os moradores, é citado o fato de que 75% das pessoas de cada faixa etária precisam estar imunizadas com as duas doses (quando o tipo de vacina assim exigir) para diminuir a circulação do vírus.
Os profissionais elencam uma série de outros motivos, baseados em estudos, que apontam as vacinas como um caminho seguro para prevenir o adoecimento, além de considerar que os efeitos colaterais tendem a ser leves ou inexistentes após a aplicação. Há também uma justificativa simples, mas verdadeira: quanto mais pessoas imunizadas, maior a chance de a vida retomar ao normal.
Em Cotiporã, 46 pessoas se recusaram a serem vacinadas
As 46 pessoas que recusaram as vacinas contra a covid-19 em Cotiporã assinaram um termo de recusa. Outros 55 não compareceram para se vacinar, mas depois de uma nova busca, 19 decidiram ir até a unidade básica de saúde para receber a primeira dose do imunizante. Há também 21 pessoas que foram infectadas e estão cumprindo 30 dias de intervalo entre o início dos sintomas e o dia da vacina
— Os agentes comunitários de saúde e os recepcionistas da Unidade Central contataram esses moradores para que fossem se vacinar. O número então baixou para 36, já que 19 foram até o posto de saúde — explica a coordenadora do Departamento de Saúde, Aricele De Villa.
Ela afirma que foram feitos três dias de chamamento aos faltosos, e quatro pessoas que haviam assinado a recusa voltaram atrás. Dos demais, a maioria é do mesmo núcleo familiar.
— Elas estão cientes que havia essa oportunidade, que tinha vacinação, e não buscaram a aplicação. Nós vamos considerar como recusa de recebimento de doses porque temos certeza que receberam a informação e eles já foram convocados em outras ocasiões. O que percebemos nessas recusas que ainda não foram assinadas é que são famílias. São pessoas que residem na mesma casa, é um núcleo familiar. São casos bem pontuais, e a maioria famílias completas.
Por outro lado, a população acima de 60 anos atingiu 75% de cobertura da vacina contra a covid-19 em Cotiporã. Isso significa que essa faixa etária alcançou o índice que impactará positivamente no contágio.
Já foram aplicadas 3.119 doses da vacina, sendo que 1.714 pessoas já recebem a segunda dose, e 80 a dose única. Assim, 81% da população geral já receberam ao menos uma dose e mais de 50% completaram o esquema vacinal. Até o momento foram registrados 849 casos, sendo que há nove ativos. O município também registrou quatro mortes em decorrência de complicações do vírus, sendo que a última foi registrada em 1º de abril deste ano.
"Os casos começaram a diminuir e vi a eficácia da vacina", conta agente comunitário
André Nicolau, 28 anos, é um dos 10 agentes comunitários de saúde de Cotiporã. Morador da localidade de Morro do Céu, mesmo trabalhando na área, ele estava resistente à vacinação.
— No começo eu não queria fazer porque falavam muitas coisas. Estava resistente porque a vacina foi feita em pouco tempo e havia muita informação contraditória.
Com o tempo, ele conta que percebeu a eficácia da vacinação:
— Comecei a ler, entender, conversar com os colegas. Os casos foram reduzindo, as internações também e vi que estava funcionado. Fiz há cerca de um mês.
Ele é um dos agentes responsáveis pela busca ativa:
— Estou esperando pela segunda dose. Tive também empatia porque havia muitas pessoas com receio e, como moro no interior, tenho mais tranquilidade e pensei em deixar quem estava mais apreensivo ir antes.
Nicolau vive com os pais, Mário, 66, e Ana, 61 anos.
— Meus pais eu levei assim que abriu para a faixa etária deles. Aqui em casa ninguém pegou porque tínhamos todos os cuidados, como uso de máscara e respeito aos protocolos. Sabia que tinha que fazer, mas há um tempo para tudo — ressalta ele.
A cidade também segue a aplicação das segundas doses. Nesta quarta-feira (8), a coordenadora Araceli De Villa, aplicava as doses na UBS. Entre as vacinadas, estava Elis Regina Lazzarotto, 58.
— Me sinto mais segura e tranquila. Fico até emocionada — contou ela ao receber a aplicação da segunda dose do imunizante.
Vila Flores reduziu pela metade o número de pessoas que não queriam a imunização
Vila Flores vem se destacando na campanha contra a covid-19 e recebeu R$ 50 mil na primeira edição do Te Vacina, prêmio do governo do Estado para reconhecer os municípios que mais imunizaram no RS. A cidade realiza rastreamento individualizado dos moradores para conscientizar cada um deles sobre a importância de estarem vacinados.
São sete agentes de saúde que trabalham para que as pessoas mudem de ideia. De acordo com dados da secretaria de Saúde, 30 pessoas se recusaram a tomar a vacina, o que equivale a 0,88% da pessoas acima de 18 anos. Desses, 12 têm acima de 60 anos e vivem na zona rural do município — a cidade tem 3.407 moradores
— Alguns mudaram de ideia ao perceber que a vacina é segura e eficaz. Os agentes de saúde passaram novamente na casa de cada um daqueles que não quiseram se vacinar. Com esse contato, a equipe conseguiu convencer as pessoas a receber a vacinação e tivemos de 20 a 30 pessoas que mudaram de ideia — afirma a secretária de Saúde, Elenice Pertile.
Além de perceber que a vacina tem impacto no número de óbitos e reduz a quantidade de internações hospitalares, a população se sente mais segura, segundo a secretária.
— Um dos motivos para aceitarem ser vacinadas foi o emprego. Eles sabem que há chance que a empresa passe a exigir a vacina. Depois de conversar com as equipes, decidiram voltar atrás, o que é muito positivo.
Elenice ressalta que toda a equipe se empenha, desde o começo da campanha, para garantir a segurança dos moradores:
— Acredito que é uma porcentagem boa, a nossa ideia sempre foi ter poucas doses na geladeira, para ter todos aplicadas em cada um dos moradores conforme avançavam as faixas etárias.
"Estamos felizes por ver o resultado porque tivemos todo o cuidado para chegar a todos os moradores", diz enfermeira de Vila Flores
A enfermeira responsável pela Vigilância Epidemiológica de Vila Flores, Alexandra Spagnolo Grapegia, ressalta que os dados são resultado do engajamento de toda a equipe:
— Desde o motorista que buscou as doses na coordenadoria (5ª CRS), a quem conferiu as notas, registrou as doses nas planilhas, aplicou as vacinas, lançou os dados, verificou quem não se vacinou, foi até cada um deles. Teve um trabalho muito forte de equipe, bem como da administração que autorizou horas extras para que a vacinação fosse feita mais rápido.
Alexandra conta que houve remessas que chegaram no sábado pela manhã e, à tarde, a equipe estava pronta para as aplicações.
— Não apenas para aplicar as doses, mas também para lançar os dados no sistema. Temos uma responsável só para digitar os dados, então as vacinas são aplicadas e o sistema é atualizado em seguida, o que nos garantiu a premiação — lembra ela.
Alexandra ressalta que a equipe teve um misto de sentimentos ao longo dos meses:
— Estávamos ansiosos para atingir as metas, cumprindo o cronograma certo, seguindo todo o processo. Depois disso, intensificamos a busca ativa. A equipe dos agentes de saúde tem esse controle, então fomos até cada um dos moradores para tentar convencê-los a mudar de ideia.
A enfermeira ressalta ainda que, entre os que fizeram a primeira dose, nenhum recusou a aplicação da segunda.
— O número é baixo. Estamos felizes por ver o resultado porque tivemos todo o cuidado para chegar a todos os moradores. Os que foram vacinados estão com esquema vacinal completo — finaliza ela.
Na faixa etária acima de 60 anos, a cidade já atingiu mais 75% de aplicação das duas doses da vacina contra covid-19. Foram vacinadas 3.053 pessoas, o que equivale a 90,2% do público-alvo com a primeira dose. Por outro lado, 51.7% do público-alvo, que são 1.751 pessoas, completaram o esquema vacinal. Desde o começo da pandemia, Vila Flores teve 838 de covid-19, sendo que apenas quatro estão ativos. Também foram registradas 14 mortes de vítimas da doença.
Em Protásio Alves, número de recusas foi baixo
Com 1.929 habitantes, Protásio Alves tem 10 pessoas que não quiseram a vacina. Esse número já foi o dobro até pouco tempo. .
— Passamos reforçando da importância em todos os que haviam se negado e conseguimos baixar de 20 para 10 pessoas. Entre esses, tem um morador que é uma recusa temporária por prescrição médica — explica o secretário de Saúde, Ivan Pimentel.
A equipe conta com cinco agentes comunitários de saúde que se desdobram para tentar convencer o público.
— Eles foram de casa em casa. Esse controle começou quando chegaram as primeiras remessas de vacina. Fomos fazendo o levantamento e vendo quem não procurava a vacinação para ir até lá e conversar — destaca ele.
Pimentel ainda tem esperança de que esse grupo resistente mude de ideia:
— É um índice positivo, é 0,5 por cento da população acima dos 18 anos.
O município já vacinou 1.590 pessoas, o que equivale a 81,7% da população geral. Destas, 977 pessoas já receberam duas doses ou dose única. Isso significa que 50,2% estão com o esquema vacinal completo. Além disso, foram 125 casos e cinco mortes em virtude da doença.