Dificuldades e demora para conseguir consultas com pediatras em postos de saúde tem preocupado mães que moram nos bairros Desvio Rizzo, São Victor Cohab, Planalto e Cruzeiro em Caxias do Sul. A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) confirma que faltam cinco pediatras na rede pública.
Na UBS do Desvio Rizzo, por exemplo, um dos dois pediatras se exonerou no mês de junho. No São Vítor, a pediatra da UBS está atendendo também no posto de Saúde do Planalto que está sem médica, já que a especialista está grávida e foi afastada. No Cruzeiro, um cartaz na porta já avisa que não há pediatra atendendo nesta terça-feira (24). A SMS afirma que no Cruzeiro tem pediatra que está em férias retorna nesta terça. No Bela Vista, que é próximo, tem pediatra, que presta apoio no bairro vizinho.
As mães, por sua vez, relatam que para garantir uma ficha para atendimento com pediatra é preciso chegar bem cedo e, mesmo assim, nem sempre se consegue a consulta. Patrícia Graminho, 43 anos, é mãe de Felipe, 13, Victor, sete e Daniel, cinco. A família morava no bairro Esplanada. Lá a mãe levava os meninos pelo menos duas vezes por ano ao pediatra, desde que o mais velho foi diagnosticado com um tumor ósseo na perna. No entanto, desde fevereiro eles vivem no Desvio Rizzo e, até o momento, ela não conseguiu marcar consulta.
— Meu filho mais velho tem um tumor ósseo na perna e por isso sempre fazemos o controle. Ele faz acompanhamento no hospital e está aguardando cirurgia desde maio. Esperamos que até dezembro ele possa fazer. Com o problema de saúde dele passei a levar os três ao pediatra no posto de saúde de seis em seis meses. Geralmente, os médicos me questionavam: "seu filho não tem nada, então por que trouxe para consultar?", eu me sinto mais segura levando eles. A UBS não é para prevenir? — questiona ela.
Patrícia ressalta que a preocupação só aumenta, porque quando conseguiu agendar a consulta, em seguida foi desmarcada.
— Como na UBS não tem pediatras, nos orientam a ir para a UPA e lá demora horas, sem atendimento, e já teve situações em que me senti até humilhada.
A situação fez com que ela começasse a fazer lives nas redes sociais. Além disso, ela criou um grupo com outras pessoas que enfrentam a espera por atendimento na saúde pública.
— No grupo trocamos informações e algumas pessoas acabam não falando das dificuldades para conseguir consultas porque têm medo. Afinal elas vão, assim como eu, precisar dos profissionais.
No São Vítor, uma mãe relata que a pediatra está atendendo também na UBS do Planalto que está sem médica, já que a especialista está grávida e foi afastada.
— Essa é a segunda semana que a pediatra aqui do bairro precisa dar apoio no Planalto. Nesta terça estamos sem pediatra, na quarta me passaram que tem poucas fichas, uma três ou quatro. Geralmente a pediatra solicita exames urgentes, então o retorno já fica agendado, e tem sempre uma vaga para os bebês do bairro que nasceram, e assim reduz os atendimentos —desabafa Sandra Scheffer Catel, 44, mãe de Rafaela, 11.
Ela ressalta que entende que a culpa não é da pediatra e tampouco da equipe, mas impacta a todos, principalmente, as crianças.
— Dificulta não só para as mães e quem cuida das crianças, mas também para as pediatras e para quem trabalha na UBS porque elas não conseguem se organizar. Pensa só quem foi hoje (terça-feira, 24) cedo para a fila sem saber que não tinha pediatra? As consultas têm sido remarcadas mais de uma vez com esse remanejamento, então acaba prejudicando todo mundo.
Outras mães relataram que precisam faltar ao trabalho ou chegar atrasadas para conseguir marcar a consulta, e não conseguem atendimento. A falta de profissionais prejudica também o Sistema Único de Saúde (SUS). Isso ocorre porque os pais buscam atendimento nos postos de saúde dos bairros, mas sem ter como consultar os filhos eles partem para os serviços de urgência e emergência, como a Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) Zona Norte ou Central, que lota, e não tem como atender à demanda. Os pais e as crianças, por sua vez, acabam convivendo com a dor e a incerteza do diagnóstico.
Apreensão entre as mães
Ketlen Romana Corrêa, 32 e Jéssica Schneider Geremia, 30, também não têm conseguido levar os filhos ao pediatra na UBS Desvio Rizzo. Ketlen é mãe de Vitória, de um ano e dez meses. A bebê tem meningomieloce , que é uma malformação na coluna.
— Minha bebê precisa se consultar sempre para verificar a medicação que toma e outros cuidados que temos que ter com ela. Ela foi a última consulta com um ano e três meses e toma medicação contínua — ressalta Ketlen.
Ela conta que tem notado a falta de pediatra desde o ano passado, sendo que, em mais de uma vez, marcou consultas e em seguida recebeu ligações da equipe do posto de saúde informando que o pediatra não tinha comparecido ou que seria remarcada para outro dia. Felizmente, para Ketlen, ela conseguiu a consulta na semana passada.
Jéssica também enfrenta dificuldades para marcar consulta para os filhos. Ela é mãe de Brenda 14, Heloa, 11, Roni 9, Ana Luiza 7, Tamires 4 e Maxsuel de dois meses. Ela morava no bairro Reolon e se mudou para o Desvio Rizzo há três meses. Com o bebê doente e, sem conseguir vaga, ela precisa ir até a UPA, mas tem enfrentado dificuldades.
— Falaram que o pediatra está de férias. Meu bebê está doente e eu não consigo consulta — lamenta.
O que diz a Secretaria da Saúde
A orientação da SMS é que as crianças podem ser atendidas por um médico da Saúde da Família, na UBS de referência. Conforme a secretaria, atualmente a rede pública conta com 46 pediatras. Destes, 41 estão ativos e os demais afastados por motivo de saúde ou gestação. Além disso, há 44 médicos de Saúde da Família, cuja atribuição inclui o atendimento de crianças.
Também deve ser homologada a contratação de profissionais aprovados em concurso público. Contudo, ainda deve demorar alguns dias até o atendimento iniciar nas UBSs, por conta do trâmite para a contratação dos pediatras. A expectativa é que nas próximas semanas seja publicado o edital de de nomeação.
Por nota, a SMS explica que:
"Nos últimos anos tem ocorrido diminuição de médicos pediatras no mercado de trabalho por uma menor procura por essa especialidade, bem como menos interesse por trabalhar no SUS. Desde 2017 foram nomeados pela SMS de Caxias 56 pediatras, sendo que somente 27 assumiram suas vagas e 16 se mantiveram trabalhando até hoje, que se somam a outros nomeados em períodos anteriores. A SMS realiza concursos frequentes para médicos pediatras e mantém contratos emergenciais abertos, mas a procura por parte desses profissionais é pequena.
Como estratégia, além de manter concursos e contratos emergenciais abertos, a SMS tem na Saúde da Família uma opção qualificada de atendimento às crianças. Os protocolos assistenciais e capacitações auxiliam os médicos generalistas e enfermeiros a atender as crianças com situações de saúde não complicadas. Assim, nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) que contam com equipe da Saúde da Família, as crianças são atendidas por médico ou enfermeiro da Saúde da Família, com apoio de pediatra na própria Unidade ou naquela mais próxima. Logo, os pediatras atendem suas agendas e servem de referência e apoio aos profissionais da Saúde da Família quando necessário".