O modelo de concessão das rodovias do Estado, que inclui as principais estradas da Serra, foi oficialmente apresentado em 17 de junho, mas ainda é alvo de muitas dúvidas por uma parcela da comunidade. A proposta, elaborada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) entre o início de 2020 e maio deste ano, está com consulta pública aberta até o próximo dia 18.
Para que a população que pagará pedágio possa debater a melhor solução, contudo, é importante saber exatamente o que está sendo proposto. Questionamentos a respeito do tempo de concessão, da localização dos pedágios, dos trechos que serão duplicados e do valor das tarifas estão entre pontos comuns de dúvidas.
Para esclarecer estas e outras dúvidas a respeito da proposta, a reportagem reuniu justificativas apresentadas pelo Estado e buscou informações junto ao Conselho Regional de Desenvolvimento da Serra (Corede Serra). A entidade da região coordena um grupo de estudos que reúne outras instituições para debater as concessões. O grupo mantém conversas constantes com a equipe do governo do Estado responsável pela proposta de pedágios e é formado pela Associação dos Municípios da Encosta Superior do Nordeste (Amesne), Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Sustentável da Serra Gaúcha (Cisga), Parlamento Regional, Associação das Entidades Representativas de Classe Empresarial da Serra Gaúcha (CICS Serra), Corede Serra, Bento+20 e Mobi Caxias.
Confira abaixo as respostas a 10 questões essenciais a respeito dos pedágios. As opiniões podem ser encaminhadas por meio de um formulário disponível no site parcerias.rs.gov.br/rodovias. As audiências públicas estão marcadas para os dias 13, 14 e 15 de julho, para os blocos 1, 2 e 3, respectivamente. Serão reuniões online e os links serão disponibilizados junto aos formulários da consulta pública.
As dúvidas
Contrato de 30 anos
A concessionária que vencer o leilão previsto para dezembro para cada um dos três lotes de rodovias assinará um contrato até 2052. A justificativa do Estado para o longo prazo é a necessidade de investimentos pesados na malha rodoviária, especialmente com duplicações.
— As empresas investirão R$ 10 bilhões nas estradas ao longo de 30 anos. R$ 4 bilhões apenas nos cinco primeiros anos, dos quais R$ 1 bilhão, na Serra. A concessionária, primeiro, vai tirar dinheiro do próprio bolso para fazer os investimentos para somente lá perto do ano 20 de contrato começar a pagar esses investimentos (ter retorno) com a tarifa — explicou o secretário de Parcerias do Estado, Leonardo Busatto, em entrevista ao programa Gaúcha Hoje, da Gaúcha Serra, no último dia 24.
Segundo o Corede Serra, a informação repassada pelo Piratini é de que o modelo se baseia nas concessões de rodovias federais já realizadas e também em parcerias na área do saneamento.
Localização dos pedágios
Na proposta do Estado estão previstos cinco pedágios no bloco 3, que abrange as principais estradas da Serra. O km 11 da RS-446, entre Carlos Barbosa e São Vendelino, ganharia um dos pontos de cobrança. A RS-122 passaria a ter pedágio no km 50, entre Farroupilha e São Vendelino, e no km 132, em Ipê. O modelo prevê também a transferência do pedágio de Portão para o km 22,5 da RS-122, em Bom Princípio. Além disso, o pedágio de Flores da Cunha, atualmente operado pela Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), deve ser mantido. No bloco 1, que abrange a Região das Hortênsias, está prevista a manutenção dos pedágios de Gramado e São Francisco de Paula, na RS-235, com valores que variam de R$ 5,60 a R$ 7,66. O trajeto entre Caxias do Sul e Bento Gonçalves não terá cobrança.
Conforme o Corede Serra, nas reuniões mais recentes, o Estado já sinalizou mudanças nos endereços propostos para as praças de Bom Princípio e Ipê. A tendência é que a primeira fique cerca de quatro quilômetros distante da atual praça de Portão e a de Ipê seja instalada no km 150, mas distante da área urbana. Já a de Farroupilha pode ficar mais próxima de São Vendelino.
— Os prefeitos de todas as cidades que terão praça de pedágio estão dialogando diretamente com o governo — relata a presidente do Corede Serra, Mônica Mattia.
Duplicação entre Caxias do Sul e Flores da Cunha
No cronograma de obras previsto para os 30 anos de contrato não há previsão de duplicação da RS-122 entre Caxias do Sul e Campestre da Serra, o que inclui o trecho de Flores da Cunha. A justificativa do secretário Leonardo Busatto é de que não há volume diário médio (VDM), ou seja, movimento suficiente para ampliar a capacidade no trecho.
— A duplicação de rodovias segue diretrizes definidas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura dos Transportes (Dnit). A duplicação se justifica a partir de um fluxo diário de 10 mil veículos por dia. No caso de Caxias do Sul a Flores da Cunha os registros indicam que o fluxo, de janeiro a maio deste ano, foi de pouco menos de 2,6 mil veículos por dia — relata Mônica Mattia, presidente do Corede Serra.
O trecho, porém, deve receber correções de traçado, terceiras faixas e melhorias em acessos. A chance de duplicação também não está totalmente sepultada: se o movimento nos próximos anos aumentar de forma considerável, o investimento pode ser incluído no contrato.
Tarifas
O cálculo tarifário leva em conta a localização de cada pedágio, por isso ela irá variar de uma praça para a outra. Para o bloco 3, ele partirá de um valor base de R$ 3, que será somado a um valor variável, chamado de Trecho de Cobertura de Praça de Pedágio (TCP). O adicional será correspondente ao total de pistas simples e duplicadas atendidas por cada praça. Na região, o valor será de R$ 0,0945 por quilômetro de pista simples e R$ 0,1228 por quilômetro de pista dupla.
Isso significa que cada quilômetro duplicado gera um incremento no valor cobrado nos pedágios. A previsão é que, após a conclusão das duplicações, as tarifas sejam 30% maiores em relação ao período de pista simples.
Cobrança do primeiro ano
O modelo propõe tarifas entre R$ 5,10 e R$ 9,43 dependendo da praça de pedágio que irá operar no bloco 3, que atende as principais rodovias da Serra. A cobrança nas praças atuais passará a vigorar no primeiro dia de contrato, com os valores definidos em leilão, já corrigidos pela Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE. Os pedágios que serão implantados somente poderão funcionar no dia seguinte ao aniversário de um ano das concessões. Melhorias, porém, devem ocorrer desde o primeiro dia de contrato. O reajuste das tarifas de todas as praças será anual, sempre seguindo o IPCA.
Regras do leilão
Para cada bloco de rodovias, a concessionária será escolhida por meio da combinação de dois critérios. O primeiro é o percentual de desconto sobre o valor máximo de tarifa proposto. O deságio, contudo, será limitado a 25%. Com mais de uma concorrente atingindo o limite, o desempate será pelo maior valor de outorga, um valor a ser pago pela concessionária ao Estado, que não mínimo nem máximo estipulado.
Conforme explicações já dadas pelo Estado, a limitação no desconto tem o objetivo de garantir que a concessionária vencedora seja idônea e tenha capacidade de investimento.
— Caso o desconto fosse livre, segundo foi transmitido ao grupo (de entidades da Serra), o desconto poderia alcançar percentuais elevados de forma que, na hora da execução dos investimentos, faltariam recursos, como ocorreu em concessões federais cujas rodovias foram devolvidas ao governo — explica Mônica Mattia.
Destino da outorga
A outorga foi estipulada como um dos critérios para a seleção das concessionárias. A Lei 15.599, de 16 de março de 2021, aprovada pela Assembleia Legislativa, determina que os recursos arrecadados sejam utilizados na malha viária que ainda será administrada pelo Estado. Entidades empresariais da região, porém, entendem que o dinheiro deve ser investido em estradas não concedidas da região onde haverá pedágio.
— Essa é uma discussão menos técnica e mais política, que está sendo considerada. Precisamos ouvir todos. O Estado tem mais de 10 mil quilômetros de rodovias e as concessões pegam somente 10% delas. Ou seja, o Estado precisa ter dinheiro para investir nos outros 9 mil quilômetros — observa o secretário de Parcerias Leonardo Busatto.
Recuperação das estradas antes das concessões
Há cerca de um mês, o governo do Estado anunciou aporte de R$ 1,3 bilhão em recursos do tesouro em obras rodoviárias. Desse total, R$ 192 milhões se destinam às principais estradas da Serra, incluindo as que serão pedagiadas. Há duas justificativas para essa decisão. Uma delas é de que os aportes do Estado permitirão gastos iniciais menores por parte da concessionária e isso pode evitar uma tarifa mais alta.
— Se tiver a rodovia em boas condições, o custo da concessionária e da tarifa será menor. Quanto melhor a situação da rodovia, menor a tarifa — explica o secretário de Logística e Transportes do Estado, Juvir Costella.
A outra explicação é a necessidade de ter condições mínimas nas rodovias até que as concessionárias estejas prontas para atuar.
— Considerando que o contrato com a concessionária deverá ser assinado em maio de 2022 e que a empresa leve alguns meses para se instalar e iniciar a operação, temos pela frente mais um ano de imprescindível manutenção a ser realizada pelo governo — aponta Mônica Mattia.
Isenções
Ao contrário do praticado pela Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR) atualmente, o modelo proposto não prevê isenções a moradores de cidades que sediam os pedágios. A justificativa é de que essa não é uma prática comum fora do Estado e encareceria a tarifa aos motoristas pagantes. Em contrapartida, o modelo propõe desconto de 5% para usuários que utilizarem sistema de pagamento eletrônico sem necessidade de parada (TAG). Esse percentual pode ser ampliado para até 20% caso o motorista seja um viajante frequente. Para atingir o desconto máximo será preciso passar 20 vezes por mês pelo pedágio, não importando o sentido de deslocamento.
Cronograma
Entre os principais investimentos previstos para a Serra, a proposta determina as duplicações, passarelas e melhorias nos acessos, além de manutenção.
A RS-122, no chamado contorno norte de Caxias do Sul, entre o viaduto torto e a saída para Flores da Cunha, precisará ser duplicada no terceiro ano de contrato, assim como a RS-453, entre Farroupilha e Garibaldi. Nesse prazo também deve ser implantada terceira faixa na RS-453, entre a rótula de Caravaggio e a saída para Porto Alegre.
Entre Farroupilha e São Vendelino, a duplicação da RS-122 deve ocorrer no quarto ano de contrato. Já a RS-446 será duplicada entre Carlos Barbosa e São Vendelino até o sétimo ano. Já a BR-470 será ampliada entre o acesso ao Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves, e Carlos Barbosa entre os anos quatro e seis de contrato.