Ainda que as portas das escolas estejam fechadas nesta quinta-feira (3), em função do feriado de Corpus Christi, a data marca o período de um mês no qual as aulas voltaram a ser presenciais na rede pública de ensino de Caxias do Sul. Desde o dia 3 de maio, o modelo remoto determinado por decretos referentes à pandemia ganhou a opção das aulas presenciais, feitas em diferentes formatos e escalonamentos, dentro de protocolos sanitários aplicados em cada instituição.
Mesmo sendo tão esperada por boa parte dos estudantes, a reabertura das escolas ainda é um desafio para equipes da Educação. Ao longo dos primeiros 30 dias, 74 professores e funcionários testaram positivo para a covid-19 em Caxias do Sul, sendo 15 na rede estadual e 59 na rede municipal. Como medida de contenção dos casos, as aulas chegaram a ser suspensas em cinco escolas da cidade e as incertezas em relação ao contágio ainda são presentes na rotina das equipes que atuam pela Educação.
Na rede municipal, todas as escolas passaram a dispor do ensino presencial no primeiro dia de retomada. Até a quarta-feira (2), a adesão de estudantes ainda estava em levantamento pela Secretaria Municipal da Educação (Smed) mas, de acordo com a pasta, chega a quase 90% em algumas. Dos 59 casos confirmados para covid-19 entre os servidores, a secretaria não informou quantos ainda estão afastados e nem em quais escolas atuam, sob justificativa de se tratarem de números bastante flutuantes e do fato de um mesmo professor, por vezes, atuar em mais de uma escola.
Dez dias após a retomada das aulas presenciais quatro escolas já registravam casos de contaminação de covid-19. Doze na mesma escola, a de Ensino Fundamental Arnaldo Ballvê, no bairro Santa Lúcia. Naquela ocasião casos também estavam confirmados na escola Villa Lobos, no Vila Lobos; na Santo Antônio, na Terceira Légua; e na Tancredo Neves onde a professora contaminada da Arnaldo Ballvê também leciona.
De acordo com a secretária municipal de Educação, Sandra Negrini, além da suspensão na Ballvê, aulas forma suspensas em turmas de cinco outras escolas da cidade, mas nem todas em função da covid-19.
— Foram casos de licenças pela doença e também por outros motivos de saúde que a gente não conseguiu substituição, então os estudantes foram atendidos de forma remota — garante a responsável pela Educação municipal.
Em relação ao primeiro mês de atividades presenciais, ela avalia:
— Foi um período de muitos desafios e realinhamentos a cada semana, cada dia, em função das situações que vão surgindo. A escola é um espaço dinâmico e estamos atentos às necessidades. Tanto para os profissionais quanto para os estudantes e suas famílias, o retorno foi muito produtivo, muito importante.
Na Ballvê , diretora ainda se recupera
A escola Arnaldo Ballvê, que registrou o maior número de casos confirmados, teve as aulas presenciais suspensas na tarde do dia 13 de maio e voltou às atividades na última segunda-feira (31) — com aulas remotas mantidas ao longo de todos os dias letivos. O retorno presencial desta semana se deu, porém, sem a presença da diretora, Inês Frighetto, 57, que foi uma das profissionais que contraiu a infecção por covid-19 e ainda não está recuperada. Ela chegou a enfrentar um quadro grave da doença, ficando hospitalizada por 16 dias.
— Voltei para casa mas ainda estou de licença porque estou muito debilitada, sem previsão de quando conseguirei retornar. A lição que ficou para mim é que o "bichinho" está aí, é muito forte e as pessoas precisam se cuidar — diz a diretora, que está com o pulmão comprometido pela doença e ainda encontra-se bastante fraca.
— Sem criança na escola a gente não é nada, eles também estavam querendo muito voltar e tentamos fazer tudo da melhor forma possível. Ainda assim, como gestora, estou muito preocupada com a escola. Acredito que precisaríamos rever muitas coisas porque, mesmo com os protocolos sendo devidamente cumpridos, ocorreu isso — avalia.
A vice-diretora da tarde, Rosaura Mendes, é uma das servidoras que acompanharam a retomada ao longo da semana. Ela diz que os protocolos não tiveram alterações porque já cumpriam todas as demandas sanitárias e que o cuidado foi intensificado. Apesar disso, a retomada após os casos confirmados renova um sentimento que as equipes já tinham: o de incerteza.
— É algo muito novo e, mesmo que a gente cumpra tudo, não sabemos até que ponto é suficiente para preservar vidas — comenta a vice.
Segundo ela, a suspensão gerou impacto — mas pouco significativo — na quantidade de alunos que aderiu à retomada presencial na semana pós-suspensão. No início da tarde de quarta-feira, Walderez Teles, 72, deixava o neto, Arthur, 9, estudante do 4º ano do Ensino Fundamental, em frente à escola, no bairro Santa Lúcia, para mais um dia de aula. O estudante integra o grupo previsto em escala para frequentar a sala de aula nesta semana, revezando com o ensino remoto na semana que vem, para que o outro grupo esteja em sala de aula.
— Eu acho que foi certo terem suspendido e acredito que poderiam nem voltar, por enquanto, porque a pandemia ainda está meio forte. Acredito que um pouco de cuidado ainda é importante e que as coisas vão ficar melhores até o final do ano, conforme forem chegando mais doses da vacina — comenta o avô, que já completou a imunização contra a doença.
Ele conta que a família ainda mantém todos os cuidados para evitar o contágio do vírus, mas que a imunização dele e da esposa, integrantes do grupo de risco, faz com que tenham mais tranquilidade em permitir que Arthur esteja em sala de aula com os colegas.
— Eu gosto mais de vir aqui do que ficar em casa. É muito mais legal e eu consigo entender mais as matérias também — comenta o estudante.
A vendedora Denize Tuculo, 43, também optou por continuar levando à escola a filha Ana Júlia Truculo Meloto, 9, que estuda no 3º ano do Ensino Fundamental.
— É um desafio diário, mas sempre orientamos ela a ter todos os cuidados. Prefiro que esteja se relacionando do que fique em casa e adoeça. Ela chegou a ter crises de ansiedade ao longo de 2020, quando estava estudando em casa — relata Denize.
Na opinião da mãe, a decisão de suspender as aulas foi acertada e necessária em função da quantidade de casos registrados. Porém, diz preferir que as aulas sejam mantidas quando possível.
— Neste caso ficava até difícil manter as aulas por conta dos afastamentos, mas se tiver como evitar (a interrupção das aulas presenciais), melhor — completa.
:: CASO SEM CONCLUSÃO
Diante da confirmação dos 14 casos na Arnaldo Ballvê, a Smed afirmou que averiguaria se os contágios ocorreram dentro ou fora da escola. Questionada a respeito deste procedimento na quarta-feira, a titular da Smed disse que ainda não há uma conclusão e que aguarda a recuperação da diretora, Inês Frighetto, para que seja dado andamento ao assunto. O retorno da diretora ainda não tem data para ocorrer.
"A escola é um espaço seguro", diz titular da 4ª CRE
Com levantamento diário de casos confirmados para a doença nas escolas estaduais da região, a 4ª Coordenadoria Regional da Educação (4ª CRE) já registrou 30 testes positivados entre as 110 escolas abertas, sendo que metade foram em Caxias do Sul. O dado refere-se ao período de 3 de maio a 1º de junho.
— Retomamos de forma tímida e a procura por parte dos estudantes foi aumentando. Não tivemos incidência de muitos casos e isso reafirma que o cumprimento de protocolos é eficaz e que a escola é um espaço seguro — afirma a titular da coordenadoria, Viviane Devalle.
As aulas presenciais da rede estadual são praticadas hoje em 52 dos 56 educandários do município. Destas, quatro chegaram a ter aulas suspensas após a confirmação de casos de covid-19, mas os alunos já retornaram à sala de aula. De acordo com a 4ª CRE, a suspensão se deu nas escolas Santa Catarina, Alexandre Zattera, Professora Ivonne Lucia Triches dos Reis e Rachel Calliari Grazziotin. Da região, soma-se ainda a Escola São Pio X, de Farroupilha, que também está com as aulas retomadas.
Segundo a coordenadoria, as suspensões duraram de cinco a sete dias, uma vez que foram tomadas apenas como medida de organização e não devido ao número de casos. A entidade segue protocolo que determina a suspensão das aulas apenas em casos nos quais o contágio tenha ocorrido dentro da escola, algo que não foi identificado nos registrados até então.
O Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul (Cpers) ainda preocupa-se com o fato dos protocolos não terem sido fiscalizados por órgãos da Saúde e defende que a suspensão das aulas adotada nos primeiros casos registrados deveria ser uma medida mantida para os casos confirmados posteriormente.
— Percebemos que no início as escolas estavam fechando, mas agora não estão mais. A medida de fechamento é correta — avalia o diretor-geral do 1º Núcleo do Cpers, David Orsi Carnizella.
Em relação ao primeiro mês de aulas presenciais, ele diz que o sindicato acompanha e incentiva que os casos de covid-19 sejam reportados às autoridades competentes e divulgados como forma de proteção de toda comunidade escolar.
— A gente vê um grande esforço dos alunos e professores nesta retomada, mas seguimos na luta para que uma fiscalização ocorra e observe os protocolos que estão sendo cumpridos. Com a vacinação sendo aberta, agora, à categoria, começamos a ver uma luz no final do túnel, mas a situação ainda é muito preocupante — completa o diretor.