Quando ainda não existia o sistema de distanciamento controlado com bandeiras e a covid-19 era uma novidade assustadora, há um ano, Caxias do Sul aderiu fortemente à sugestão de ficar em casa. Atualmente, em março de 2021, a cidade chegou ao pior momento da pandemia, com 600 mortes, hospitais em colapso e muito mais pessoas contaminadas.
No entanto, mesmo classificada como de alto risco para o contágio, parte da comunidade parece menos preocupada com a disseminação do vírus. É o que se pode ver pela mobilidade em ruas, avenidas, perimetrais e rodovias que cruzam o município. A movimentação é inferior ao que ocorre de costume em Caxias, mas o movimento é superior aos períodos de isolamento social que ocorreram no início da pandemia, entre março e abril de 2020.
Uma sequência de fotos dos fotógrafos Antônio Valiente e Marcelo Casagrande mostra que a população não parou de circular durante na vigência da bandeira preta. As imagens flagram movimento de pedestres na Avenida Júlio de Castilhos, nas esquinas com a Doutor Montaury e com a Feijó Júnior. Nesse caminho, ficam as praças Dante Alighieri e João Pessoa onde, apesar de proibido, pessoas ainda insistem em permanecer. O fluxo de veículos nas perimetrais e nas rodovias também é intenso, principalmente, em horários de picos. Parques seguem sendo frequentados, mesmo com a determinação de que os locais servem apenas para a prática de atividades físicas.
Comportamento
Esse comportamento preocupa as autoridades diante colapso hospitalar, de mortes por falta de leitos na Serra, e da iminente falta de medicamentos para entubação de pacientes contaminados com covid-19. Com o comércio fechado, e apenas serviços essenciais de portas abertas, teoricamente, seria mais fácil evitar aglomeração de pessoas. Não é o que tem se visto em Caxias.
— O ano passado o fechamento foi quase que integral e a população ficou em casa de forma maciça. Nesse momento de bandeira preta não é um fechamento integral porque temos diversos segmentos trabalhando. Sabemos que a culpa da disseminação não é do comércio e desses segmentos que são penalizados e sim que é preciso a conscientização da população — afirma o secretário de Urbanismo, João Uez.
A fiscalização tem sido intensificada, e não raro, há flagrante de festas clandestinas em Caxias.
— Com as casas noturnas fechados vemos cada vez um número maior de festas clandestinas em loteamentos novos das cidades. Outro fato que chama atenção é que as pessoas estão se aglomerando em residências. Eles não vão aos bares, mas estão se reunido nos pátios e no interior das casa — afirma o secretário.
O desrespeito ao decreto obrigou a prefeitura a retirar os assentos dos bancos da Praça Dante, mas nem isso impede as pessoas de ficarem paradas no local.
— Até que a gente tenha uma conscientização maciça da comunidade de que não é para circular sem necessidade, não pode aglomerar, a solução não vai mudar, não vamos ter uma diminuição no vírus. A população não quer respeitar, a gente teve que chegar na situação de retirar os bancos da praça, mas mesmo assim a população parece não estar preocupada com a gravidade da doença — pede Uez.
Ele desabafa:
— Acredito que essas pessoas não perderam nenhum ente querido, nem uma pessoa próxima. Enquanto não se conscientizarem mesmo fechando alguns setores, as pessoas vão continuar transitando pela cidade. Quem sabe se tiverem, alguém na família contaminado vão entender a gravidade, ou quem sabe eles podem se dirigir a um hospital a um centro de saúde para ver de perto a realidade e ai quem sabe eles mudam de ideia.
Movimentação
No ano passado, em 20 de março, o município publicou um decreto determinando uma série de medidas para restringir a circulação de pessoas nas ruas. A cidade parou quase totalmente e e somente serviços essenciais operavam.
Agora, além do que mostram as imagens, os relatórios de mobilidade do Google, ferramenta que mede a circulação de público em diversos segmentos, indicam que a situação é quase oposta.
— Nas categorias, por exemplo, de mercado e farmácia, teve um pico de queda de mobilidade, ou seja, baixou o movimento (em 2020). De maio em diante começou a subir, e teve um pico de movimentação em dezembro. Em janeiro (de 2021) caiu novamente em função das férias — explica o consultor Isaac Schrarstzhaupt, que tem se dedicado a fazer análises sobre os números da pandemia em Caxias.
Schrarstzhaupt ressalta que durante a bandeira preta, a movimentação reduziu, mas ainda muito longe do necessário.
— Teve queda de mobilidade, mas nem perto do que precisaria porque tão não se ficou isolado como em março e abril de 2020. Se olhar no gráfico, no ano passado, na categoria residências, as pessoas ficaram 30% a mais em casa. Agora está 12%. No comércio e lazer ficaram 80% a menos nesses espaços, e agora com a bandeira preta está em 48% — analisa.
Ele acrescenta:
— Para ter uma ideia no Natal e Ano-Novo, que para tudo, com os feriados, a mobilidade reduziu para 50% a menos, e hoje no pico da pandemia, estamos com 48%, sendo que no começo (em março de 2020) era 80%, quando as pessoas tinham medo. Pelos números, a bandeira preta está fazendo menos efeito do que o final do ano.
Confira as imagens