A corrida dos gestores da área de saúde de todo o país para combater a covid-19 depende também da criação de novos leitos de terapia intensiva. Diante disso, é preciso encontrar profissionais especializados. Afinal, a estrutura de leitos de UTI não é formada só por equipamentos, mas sim por médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem e uma equipe multiprofissional para atender aos pacientes.
Em Caxias do Sul, o número de leitos do Sistema Único de Saúde (SUS) saltou de 34, em março, para 65 até esta terça-feira (21). Assim, pelo menos três dos seis hospitais do município estão selecionando novas equipes. Não é apenas o aumento dos leitos que obriga as instituições a buscar profissionais, mas também o índice de contaminação na área da saúde. Segundo o presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (Cremers), Carlos Isaia Filho, dos pacientes com covid-19, 20% deles são profissionais como médicos, enfermeiros e técnicos em enfermagem, entre outros.
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Ele explica que há uma legislação específica para o funcionamento de uma unidade de terapia intensiva. Para cada 10 leitos, é preciso um médico, que não precisa ser intensivista, mas ter experiência em plantões de urgência. Já, uma ala com cinco a 10 leitos, tem que ter uma enfermeira, sendo que, para cada dois leitos, é necessário um técnico de enfermagem. Para montar uma UTI nova, por exemplo, um hospital precisa ter uma equipe preparada, fora o pessoal da limpeza e demais profissionais de retaguarda.
O médico ressalta que é preciso considerar que a UTI é o setor de maior preocupação, portanto, o que precisa de maior qualificação e cuidados dentro de um hospital:
- O médico não faz o trabalho sozinho. Ele precisa de uma equipe preparada e com conhecimento. Às vezes, ao abrir mais leitos, existe a necessidade de montar uma equipe nova. Uma equipe pode cuidar de cinco a 10 leitos dependendo da complexidade do caso de cada paciente. Se abrir mais cinco leitos, tem que formar uma nova equipe para trabalhar na UTI.
Ele frisa ainda que o profissional com maior risco de infecção é o médico, pois é ele quem faz o procedimento de intubar os pacientes contaminados com covid-19. Contudo, Isaia aponta que todos da equipe estão expostos ao risco de contágio.
- Temos duas dificuldades: os leitos praticamente dobraram, então existe a necessidade de busca de profissionais qualificados para uma nova equipe e muitos profissionais qualificados estão fora de combate porque foram infectados. Para suprir a falta de médicos em alguns hospitais do RS, anestesistas e demais profissionais estão sendo treinados para atuar nas unidades de terapia intensiva _ explica ele.
Rotina dentro das UTIs
Roger Weingartner, 51 anos, e Marlise Heckler, 50, dividem a vida, a casa e a paixão pela medicina. Eles são pais de Werner Weingartner, 18, que estuda Engenharia Espacial na Universidade de Toronto, no Canadá. O casal trabalha num dos principais setores de um hospital: a unidade de terapia intensiva. Ele é coordenador da UTI do Virvi Ramos e médico assistente e plantonista no Hospital da Unimed. Ela é médica intensivista do Hospital da Unimed. Eles estão na linha de frente do combate ao coronavírus.
Weingartner ressalta que, para se tornar intensivista, o caminho é longo:
- São seis anos da faculdade de Medicina, mais dois anos de medicina interna e dois de terapia intensiva. Então, somados, são 10 anos de formação. Em seguida, o profissional pode fazer mestrado ou doutorado.
A rotina intensa para atender pacientes que têm índices de mortalidade maior que em outros setores hospitalares, se torna ainda mais extenuante diante da pandemia.
- A rotina mudou muito, porque temos que trocar de roupa assim que chegamos ao hospital, e nos paramentar com todos os equipamentos de proteção individual. Tirar esses equipamentos é um processo ainda mais cuidadoso porque é o momento em que existe o maior risco de contaminação - relata Marlise.
O marido complementa:
- É uma situação nova. Nós buscamos experiências com outros médicos e analisamos o que funcionou e o que pode ser implantado na nossa realidade. Estamos sempre em busca do melhor pelo paciente tentando não nos deixar contaminar por essa tentativa de politizar a doença, que deve ser vista como uma questão de saúde pública.
Marlise ressalta que cuidar de um paciente com covid-19 é uma situação desconhecida. Mesmo trabalhando com pacientes que precisam de cuidados intensivos há anos, os dois contam que é tudo novo em relação ao vírus. Há também o lado emocional, já que a família não pode ver pessoalmente o paciente que está internado:
- Nosso cuidado não é apenas na UTI, com quem está infectado, mas também com a família que não pode ver seu familiar. Temos esse contato muito mais próximo com os familiares. Hoje, o intensivista tem, além do lado técnico e profissional, que cuidar do lado emocional da família, do psicológico. Eles se veem só por meio de uma tela de celular, por videochamada. Essa separação física é uma angústia para quem tem um familiar na UTI.
Fora da unidade de terapia intensiva, o casal tenta relaxar, mas é difícil não conversar sobre a pandemia.
- Tentamos não falar somente sobre o vírus, mas como são pacientes graves, e precisamos de informações para enfrentar à pandemia, trocamos experiências, impressões e ideias sobre cada caso - afirma o médico.
A intensivista finaliza:
- Sentimos as mesmas dores e incertezas e encaramos os mesmos problemas e dúvidas. A nossa cumplicidade e um saber o que o outro está sentindo, nos ajuda a encarar os dias nesse momento de angústia para todos.
HOSPITAIS REFORÇAM EQUIPES
Dos seis hospitais da cidade, o Virvi Ramos, o Hospital Geral e o do Círculo estão com vagas abertas para formar novas equipes de UTI.
Confira um panorama de cada instituição:
Virvi Ramos
Hoje, o Virvi conta com 18 leitos, e irá passar para 26. A equipe é formada por 12 médicos, oito fisioterapeutas, quatro psicólogos, um fonoaudiólogo, uma assistente social, oito enfermeiros e 36 técnicos em enfermagem. A instituição está selecionando técnicos de enfermagem, enfermeiros e fisioterapeutas que são necessários para a abertura de uma nova UTI.
A diretora executiva do Virvi Ramos, Cleciane Doncatto Simsen, destaca que um ambiente de UTI já necessitava de maiores cuidados e com o coronavírus, os procedimentos precisam ser ainda mais rigorosos. Por isso, a qualificação, a experiência e o conhecimento técnico dos profissionais nesse ambiente são fundamentais:
- Há uma exigência maior de cuidado, estrutura, equipamentos e tempo com os pacientes de covid-19, que por vezes necessitam de cinco ou seis profissionais para colocá-los em posição prona (manobra), por exemplo, adequada para melhor respiração. Então, tem uma série de cuidados que são muito distintos de uma patologia normal, em função da alta taxa de transmissibilidade. Isso faz com que o cuidado seja muito mais específico, principalmente em terapia intensiva.
Círculo
No Círculo, são 22 leitos de UTI adulta, seis na pediátrica e 10 leitos de UTI neonatal. Na unidade dos adultos, a equipe é formada por 22 médicos, 10 enfermeiros, 50 técnicos enfermagem e cinco fisioterapeutas. A equipe não está completa porque há vários casos suspeitos ou confirmados por infecção por covid-19 entre os profissionais. A diretora do hospital, Isabel Bertuol, explica que a equipe tem realizado horas extras e a instituição precisa ampliar o quadro clínico. Ele ressalta que os pacientes contaminados que estão na terapia intensiva, geralmente, tornam-se muito graves e complexos assistencialmente.
- A equipe da UTI é responsável pela prestação desta assistência mais complexa e com maior risco de contaminação entre os profissionais. São eles que estão à frente da realização de procedimentos invasivos em um momento mais crítico da infecção com maior incidência e risco contaminação. Também são estes profissionais que ficam mais expostos a sobrecarga física e emocional gerada pela demanda aumentada de trabalho e complexidade dos pacientes - ressalta.
Geral
No HG, há 16 médicos, 25 enfermeiros e 70 técnicos em enfermagem na UTI adulto. Na pediátrica, são sete médicos, quatro enfermeiros e 20 técnicos. N UTI Neonatal, a equipe conta com 26 médicos, nove enfermeiros e 44 técnicos em enfermagem. O hospital já reforçou parte da equipe, mas ainda há cerca de 10 vagas para técnicos em enfermagem, em processo de seleção.
Unimed
No Hospital da Unimed, são 30 leitos de UTI. Há 18 técnicos, quatro enfermeiros e três médicos por turno mais os rotineiros, sendo que plantões são divididos em quatro turnos (manhã, tarde e duas noites). Segundo a instituição, devido ao porte do hospital, há vagas sempre abertas.
Pompéia
No Pompéia, há 37 leitos de unidade de terapia intensiva adulta, sendo sete exclusivamente destinados ao SUS. Sobre a equipe de médicos e enfermeiros, o hospital ressalta que estão de acordo com a legislação de cada categoria profissional e adequados à complexidade do caso de cada paciente. Ainda segundo o hospital, no momento, não há nenhuma necessidade de contratação.
Saúde
O Hospital Saúde afirma que o dimensionamento da equipe está adequado para atender os 10 leitos de UTI da instituição. No momento, o hospital não enfrenta problemas de falta de pessoal e garante que a reposição de profissionais, quando necessária, é feita prontamente.
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