As denúncias sobre pessoas que acessaram recursos do programa de auxílio emergencial do governo federal e que supostamente não teriam direito ao benefício começaram a pipocar nas cidades da Serra desde que as listagens foram divulgadas pelo portal da transparência. Posts em redes sociais apontam para casos em pelo menos cinco municípios: São Marcos, Veranópolis, Carlos Barbosa, Garibaldi e Nova Prata.
Em São Marcos, as denúncias chegaram à prefeitura. As duas filhas do prefeito Evandro Kuwer (MDB) estão entre as beneficiárias. A esposa de um diretor de secretaria (cargo em comissão) também. Os nomes fazem parte dos dados públicos divulgados pela Controladoria-Geral da União (CGU).
Na listagem referente ao pagamento da primeira parcela aparecem Karen Ramona Kuwer, 21 anos, e Katia Richeli Kuwer, 24, filhas do prefeito. Cada uma teve o valor de R$ 600 aprovado pelo sistema. Na tarde de ontem, o prefeito admitiu que ambas solicitaram e receberam o benefício, ao qual, entendem que têm direito, mas que a família vai devolver o dinheiro. Inclusive, a segunda parcela que já teria sido encaminhada pelo governo federal. Nenhuma das filhas mora com o pai. Karen não trabalha e está grávida. Katia é veterinária, teria começado a trabalhar em uma clínica, mas sido desligada em função da pandemia. O marido de uma delas atua como funcionário em uma empresa de móveis e o outro é autônomo e trabalha com vendas. Ambas têm propriedades rurais e talões como produtoras. Para o prefeito, elas se encaixam nos critérios do programa.
– A renda dos maridos delas é pequena. Caiu muito com a pandemia. Elas se enquadraram nos requisitos, nada de irregular elas fizeram. Elas jamais iriam preencher um documento com algo que não é verdade. São filhas do prefeito, mas têm vida própria – ponderou Kuwer.
A página da prefeitura postou em uma rede social os canais que as pessoas podem usar para denunciar irregularidades.
– O governo federal, com certeza, deve fazer a filtragem para ver os casos em que realmente é indevido. Acho que nada mais justo, se a pessoa recebeu indevido, de retornar para o governo. Esse auxílio emergencial não é só para o público em situação de vulnerabilidade. Ele é diferente – declarou o prefeito, referindo-se aos casos de microempreendedores individuais (MEIs) que tiveram a renda diminuída ou zerada pela pandemia e para os quais também é voltado o programa.
Na mesma cidade, a manicure Daiane Vieira Dalanholli, 41 anos, fez o cadastro no programa e recebeu R$ 1,2 mil referente à primeira parcela do benefício. Esse valor em dobro é pago quando a mulher se autodeclara chefe de família, ou seja, a provedora da casa. O caso percorreu as redes sociais porque ela é esposa de um cargo em comissão de direção da prefeitura, que recebe R$ 3.549,81 de salário, e é o pai dos três filhos de Daiane. Procurada pela reportagem, a manicure concedeu entrevista, porém, depois, mudou de ideia e disse que não queria que suas declarações fossem publicadas. Já as informações sobre o cadastro e o salário são públicas nos portais do governo federal e do município, respectivamente.
Em Veranópolis, outros cadastros geraram burburinho nas redes sociais dos moradores. Um deles é do sócio-proprietário de uma empresa de compra e venda de imóveis, Rudimar Caglioni.
– Nós estávamos fechados quando eu fiz o cadastro e o Creci disse que o corretor de imóveis tem o direito de receber o benefício. A gente fica três a quatro meses sem vender nenhum imóvel, que renda que eu vou ter? – argumentou o empresário.
Caglioni também disse que vai devolver os R$ 1,2 mil que recebeu das duas primeiras parcelas.
– Não estou me justificando. Mas isso é uma questão do governo, que falhou quando colocou os critérios. Tem muita gente que não recebeu – disse.
Quem tem direito ao auxílio emergencial
O valor do auxílio é de R$ 600 com limitação de duas pessoas em uma mesma família pelo período de três meses.
Pré-requisitos
:: Ser maior de 18 anos.
:: Não ter emprego formal (não pode ter carteira assinada).
:: Não ter benefício previdenciário ou assistencial, exceto Bolsa Família.
:: Renda familiar de ½ até três salários mínimos.
:: Não ter recebido acima de R$ 28.559,70 no último ano de declaração.
O beneficiário deve ser
:: Micro Empreendedor Individual (MEI).
:: Contribuinte Individual do Regime Geral de Previdência Social.
:: Trabalhador informal (autônomo, desempregado) inscrito no CadÚnico ou por meio de autodeclaração.
Especificidades
:: Mãe autodeclarada chefe de família receberá duas cotas do auxílio.
:: É possível acumular um auxílio emergencial e um Bolsa Família.
:: Se receber Bolsa Família e se encaixar nestes requisitos, o beneficiado receberá o mais vantajoso.
:: Poderá receber até R$ 1,8 mil o caso de uma família monoparental e haver um filho trabalhador informal.
Mais duas parcelas
:: Na terça-feira, em reunião ministerial, o ministro da Economia, Paulo Guedes, confirmou que o governo federal pagará mais duas parcelas do auxílio emergencial, estas nos valores de R$ 300 cada uma, nos meses de julho e agosto.