A Organização Mundial da Saúde (OMS) lançou uma colaboração internacional chamada de Access to Covid-19 Tools Accelerator, ou ACT Accelerator, para tornar acessíveis a todo o mundo as tecnologias contra a covid-19. O anúncio foi feito na última sexta-feira em uma vídeo conferência com participação de líderes de diversos países. A ideia é acelerar o desenvolvimento, a produção e o uso de medicamentos, testes e vacinas seguros e eficazes para prevenir, diagnosticar e tratar a doença causada pelo coronavírus.
No pronunciamento, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse que, desde janeiro, a OMS trabalha com milhares de pesquisadores em todo o mundo para acelerar e acompanhar o desenvolvimento de vacinas – desde o desenvolvimento de modelos animais até projetos de ensaios clínicos. Falou, ainda, que a OMS está coordenando um estudo global sobre a segurança e a eficácia de quatro terapêuticas contra a covid-19. Reiterou que "o mundo precisa dessas ferramentas e precisa delas rapidamente" para o enfrentamento de uma ameaça comum que só será derrotada com uma abordagem comum.
A OMS também fez um balanço, com dados até 20 de abril, que aponta ao menos 76 pesquisas de vacinas em andamento em todo o mundo – 71 em fase pré-clínica e cinco em fase clínica (testes em humanos). Recentemente, Alemanha e Reino Unido anunciaram a fase de testes em pessoas de vacinas contra o novo coronavírus. Este último, com expectativa de disponibilizar doses à população em setembro deste ano. Os Estados Unidos também estão com estudos avançados no desenvolvimento de imunizações.
Na Serra, Lessandra Michelin, integrante da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), se diz feliz em ter a vacina como perspectiva na luta contra o sars cov2 (novo coronavírus).
– A velocidade está acelerada pela necessidade de alternativas frente à emergência pandêmica – pondera a médica.
Ela reitera que a pesquisa em vacinas segue todos os passos de qualquer investigação clínica, a fim de avaliar segurança e eficácia antes de chegar à comercialização. Lembra que na pandemia de influenza H1N1 esse foi o prazo para as primeiras vacinas iniciarem sua comercialização, porém, algumas vezes os estudos de segurança atrasam o início da aplicação na população.
Segundo a infectologista, no Brasil, a Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz) está participando de estudos para criação de uma vacina, bem como cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração (Incor). As pesquisas estão em fases diferentes, mas ainda iniciais.
Infectologistas acreditam em prazo maior
Diego Costa, médico infectologista do Hospital São João Batista, de Nova Prata, diz que os processos para a construção de vacinas são "engessados". Por isso, ele acredita em uma expectativa um pouco mais prolongada do que a que está sendo veiculada.
– Penso que as estimativas são otimistas. Porém, com uma pequena parte de realidade. Como sabemos, o processo para produção e aprovação de uma vacina é demorado. Não creio que tenhamos uma vacina antes de 12 a 18 meses. Talvez nove meses a partir de hoje em um cenário otimista – considera.
Para Costa, teoricamente não há como "pular etapas" do processo. Ou seja, é preciso concluir uma fase para passar para a outra, mas o processo "pode ser feito rapidamente por bons laboratórios de desenvolvimento."
Para o médico infectologista Alexandre Schwarzbold, presidente da Sociedade Rio-grandense de Infectologia, não surpreende o estágio avançado de desenvolvimento de vacinas que combatam o novo coronavírus:
– No contexto de pandemia, já vivemos isto em outros anos, as pesquisas acabam tomando caminhos mais rápidos mesmo, tanto para liberação de estudos quanto em testes em voluntários. Mas a expectativa até setembro, como aventaram na Europa, é improvável. Acredito que só no início do ano que vem possamos ter algum resultado positivo de alguma dessas vacinas.
Segundo ele, os estudos exigem, além dos passos experimentais (de laboratório), testes em um número de voluntários e, depois, em quantidade maior de pessoas que nunca tenha tido contato natural com o vírus. Além disso, é preciso avaliação de toxicidade e a capacidade de a pessoa produzir anticorpos.
– Esses países, como Alemanha, Reino Unido, Estados Unidos, junto com a China, até por terem as grandes empresa farmacêuticas, vão ter testes antes das outras. E eles têm tradição na produção de vacinas –ponderou Schwarzbold.
Vírus inativado
Sempre que a ciência produz uma nova vacina surge o questionamento de se ela é capaz ou não de gerar a doença na pessoa que deveria imunizar. O infectologista Alexandre Schwarzbold afirma que são pouquíssimas as vacinas que são feitas a partir de vírus vivos atenuados que, como o próprio nome sugere, tem parte da partícula viral atenuada. Então, funciona bem, mas tem muitos efeitos adversos. Um exemplo é a vacina da febre amarela.
– A maioria, praticamente todas as de vírus respiratórios, que inclui o H1N1 e vai ser a do coronavírus, é feita de vírus inativados, que não tem como ter atividade patogênica (que gera doença), porque pega partículas do vírus e separa proteínas capazes de induzir a produção de anticorpos na pessoa, mas que jamais vão infectá-la. Essa do coronavírus mais ainda porque ela vem de um outro vírus manipulado chamado adenovírus, que é um 'parente' do vírus respiratório. São partes dele que são geradoras da produção de anticorpos e que jamais irão inocular nem o adenovírus nem o coronavírus – explica.