Proporcionar o acolhimento para mulheres vítimas de violência em cidades da região do Vale do Caí e da Serra. Esse é o objetivo da casa de passagem de mulheres regional: ser uma ferramenta eficaz na rede de proteção à mulher nos casos que envolvem agressão física e psicológica por conta do gênero. A Casa Filhas de Maria - nome dado em alusão à Lei Maria da Penha - está sendo construída em uma zona rural do município de Montenegro (o endereço não é divulgado para garantir a segurança das mulheres que serão abrigadas no local) e vai contar com 20 vagas.
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A casa vai servir como o elo final de ligação com a rede de acolhimento, que se inicia a partir da denúncia de agressão junto às Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM). Quando existe a necessidade e o desejo de afastamento da vítima em função de medida protetiva, as mulheres serão encaminhadas à residência.
— A violência contra a mulher é muito maior nas cidades pequenas, tem muitos casos que sequer chegam a ser denunciados, por uma questão cultural. A criação da casa é uma possibilidade para que a mulher enfrente essa situação e quebre esse ciclo de violência. Os feminicídios não são casos que acontecem de forma isolada do contexto — aponta a titular da Deam, Cleusa Spinatto.
A casa será mantida pelo Retiro Comunitário de Reabilitação Ocupacional (Recreo), entidade que mantém casas de passagem na região para reabilitação de usuários de drogas, pessoas em situação de rua e vulnerabilidade social. A Filhas de Maria terá dez quartos, com espaço para quatro pessoas cada um. A moradia está sendo construída com recursos próprios da entidade. O investimento para a concretização da obra é de pelo menos R$ 150 mil. O espaço vai contar com coordenador social, cuidadores, médico, psicólogo e pedagogo.
— Para terminar a construção, estamos buscando arrecadar recursos junto ao Judiciário, órgãos de segurança e sociedade em geral. Somente a parte do mobiliário gira em torno de R$ 50 mil — destaca o educador social e vice-presidente do Recreo, Nelso Lopes de Souza.
A previsão é que a casa de passagem entre em operação, no máximo até o final do primeiro semestre desse ano. A manutenção das atividades enquanto o espaço estiver em funcionamento vai acontecer mediante a aquisição de quotas mensais dos municípios do Vale do Caí. Cada cidade vai arcar com um custo de aproximadamente R$ 2 mil.
A construção da casa de passagem vai reforçar a uma rede que atualmente possui muitas lacunas: quando existe uma denúncia de violência na região do Caí, por exemplo, as mulheres precisam se deslocar, por conta própria, à cidade de Passo Fundo para a realização do exame de corpo de delito junto ao Instituto Médico Legal de São Leopoldo (IML) , devido à ausência desse tipo de procedimento em regiões próximas. Com a casa de passagem, esse transporte será feito a partir do primeiro acolhimento da vítima logo no momento da denúncia.
— A delegacia recebe a mulher e levamos, com nosso veículo, para fazer o exame. As redes sócios-assistenciais dos municípios vão estar articuladas para dar esse apoio externo, de encaminhamento, acompanhamento da situação jurídica e do estado mental da vítima — destaca Souza.
AJUDE
Quem quiser ajudar com os trabalhos do Recreo pode encaminhar doações por meio do telefone (51) 3632-2275.
Gramado, projeta abrigo de abrangência regional
Gramado projeta um consórcio para viabilizar uma casa de apoio às vítimas. Conforme a coordenadora do Centro de Referência de Atendimento à Mulher (Cram), Elisandra Andreia de Paula, seriam usados recursos federais para implantar a novidade. A cidade já tem casa e terreno doados _ o custo estimado para reformar o imóvel é de R$ 400 mil.
— A ideia do projeto é justamente regional com a possibilidade de consórcio para poder aderir ao recurso federal. Juntaríamos as cidades próximas para arcar com as despesas e manter o atendimento, já que a demanda de um único município não é suficiente para manter uma casa assim — pondera Elisandra.
Se a iniciativa sair do papel, será um feito em tanto para Gramado, cidade que iniciou grande mobilização contra a violência doméstica sob a liderança da primeira-dama, Bianca Bertolucci. O trabalho vem trazendo à tona histórias que antes ficavam escondidas. Neste ano, Gramado acolheu seis mulheres e cinco crianças numa pousada.
— Por falta de abrigo, já chegaram a manter uma mãe e filhos durante uma noite na delegacia porque não havia para onde enviar a família. Isso também aconteceu no Ciosp da Brigada Militar — revela Elisandra.
Em 2016, o Cram atendeu 35 casos novos de mulheres vítimas. No ano seguinte, com a rede mobilizada, o número de atendimentos subiu para 72. Em 2018, o Cram recebeu 157 casos novos. A rede de proteção, consolidada em 2018, resgata as vítimas com oficinas, terapias, grupos com psicólogos e outros profissionais. Foi no ano passado que a cidade ganhou um cartório para as mulheres dentro da delegacia. A rede é composta por 12 entidades, entre ONGs e serviços públicos, e todos se comunicam a qualquer hora em grupo de WhatsApp. Para breve, cogita-se a criação de uma Patrulha Maria da Penha.
— Toda mulher que faz denúncia de Maria da Penha já é encaminhada para o Cram, onde vai participar de grupos de pré-audiência. Muitas vezes a mulher denuncia e não sabe nem o que é medida protetiva — finaliza Elisandra.