Embarcar, encontrar um lugar para sentar, carregar criança no colo ou sacolas, equilibrando-se para não cair, mexer no celular, esperar até a parada de descer. Essa costuma ser a rotina de quem utiliza o transporte coletivo e, às vezes, não é tão simples quanto parece. Números revelados pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), a pedido da reportagem do Pioneiro, apontam que diariamente, uma ocorrência de acidente envolvendo ônibus é registrada na cidade. E, a cada dois dias, há chamado para atender a passageiros que se machucaram depois de cair dentro do veículo. As estatísticas comprovam, assim, que é preciso mudar a postura para evitar lesões provocadas por quedas.
O diretor-geral do Samu, médico Thyago Anzoli Coser, ressalta que não há como diferenciar se o número de atendimentos é maior a ônibus do transporte urbano ou em coletivos de outras empresas. Ele explica que os dados foram contabilizados após conversas com os médicos, que perceberam a situação após se debruçar sobre as fichas de atendimento:
— Geralmente, são idosos que caem nos ônibus. Pelas fichas de atendimento e pelas características das lesões, os ferimentos foram provocados por quedas dentro dos ônibus.
Segundo Coser, a maioria das lesões é leve. Esse, no entanto, não foi o caso da aposentada Carolina Pedro Patrício, 71 anos. Ela fraturou três costelas e ficou internada no Hospital do Círculo por 20 dias e só recebeu alta no início do mês. A idosa caiu no ônibus da Visate, na linha do Loteamento Mariani, logo no início da tarde do dia 17 de abril. Se não bastasse a lesão, logo após atendimento, foi liberada do hospital e encaminhada para casa. Quando tomava banho se sentiu mal e quase desmaiou. As costelas quebradas perfuraram o pulmão e ela precisou ser hospitalizada novamente, às pressas.
— Eu sou ativa, sempre disposta e com essa queda agora tive complicações que limitam até minha movimentação. Eu tinha acabado de entrar no ônibus e o motorista não esperou nem eu sentar. Ele arrancou e eu caí. Nem todos têm o mesmo ritmo e, às vezes, os motoristas não esperam, principalmente, nós mais velhos, sentarmos. Teriam que ter mais paciência, ainda mais com pessoas de mais idade. Temos que nos cuidar, mas os motoristas também têm que ser mais atenciosos. Não são todos, mas alguns não têm paciência. Foi uma situação horrível.
"Eles precisam prestar mais atenção", diz idosa
O caso de uma cuidadora de 63 anos, que prefere não se identificar, está fora das estatísticas, porque ela recusou atendimento e não registrou boletim de ocorrência, o que indica que o número de acidentes e quedas pode ser ainda maior. A senhora nem precisou embarcar no ônibus para se machucar. Ela estava entrando pela porta de trás em um coletivo da Visate, que estava na Estação de Passageiros Imigrante, e quando colocou o pé na escada para embarcar, o motorista fechou a porta, ela caiu e machucou o joelho. Dois passageiros que estavam no local ajudaram-na a se levantar e o motorista do ônibus que estava atrás avisou o condutor do ônibus onde ela entraria. Ela reclama da falta de atenção dos motoristas.
— Os passageiros me contaram que o motorista estava desatento, conversando e rindo, e eles precisam prestar atenção. Ele fechou a porta praticamente no meu rosto. Já presenciei a mesma cena acontecer com um rapaz. Ele não chegou a cair, mas deve ter machucado o rosto. O motorista quis chamar o Samu, mas eu recusei. Fui para casa e tomei analgésicos. O meu joelho ficou bem feio, mas preferi não levar a história adiante.
As quedas são comuns também em linhas interterminais e ônibus de viagem. Uma doméstica de 46 anos, também se machucou, recentemente, e não procurou atendimento. Ela teme se identificar porque circula no ônibus diariamente e admite que talvez a queda tenha ocorrido porque ela não estava atenta.
— Foi tudo muito rápido. Eu estava no ônibus e ele foi parar e eu caí. Bati as costelas na barra de ferro, próximo do motorista e caí de joelhos. Ele (motorista) perguntou se eu estava bem. Eu não estava. Senti muita dor, e fiquei até um pouco tonta. Esperei passar um pouco e fui para o trabalho, mancando. É até uma vergonha falar isso, mas eu chorei de dor. Tomei remédios, e estou bem agora, melhorando, mas na hora foi muito ruim a sensação — desabafa.
Motoristas também pedem cuidado
A reportagem circulou em três ônibus da Visate em um dia chuvoso. O clima, típico do inverno caxiense, com neblina e chuva fina, dificulta ainda mais a movimentação de veículos. Da parada da Catedral até a Marcopolo, em Ana Rech, o motorista precisou frear bruscamente duas vezes. Em uma delas, o ônibus foi cortado por um veículo e, na outra, um caminhão entrou a direita em um acesso ao bairro Presidente Vargas, logo após uma curva acentuada. Se não freasse, teria colidido contra a traseira do caminhão.
O condutor Manassez Queiroz de Souza, 49, afirma que é difícil proteger os passageiros se eles também não estiverem atentos.
— Eu freio no automático para não bater. É instintivo e realmente não tem como proteger os passageiros, eles têm que se cuidar porque é fácil de cair. Dentro do ônibus, eles precisam se segurar bem e também estar atentos ao que está acontecendo no trânsito. Sei que eles querem apenas chegar até onde precisam estar, mas eles tem que se cuidar também. Há momentos em que precisamos frear para não bater e provocar ferimentos ainda mais graves em quem está dentro do ônibus. Se eu frear qualquer passageiro que não estiver se segurando vai cair e não temos como amortecer a queda, tentamos ao máximo proteger os passageiros, mas se eles não estiverem se segurando vão cair. Não tem jeito.
Outro motorista que prefere não se identificar também chama a atenção dos passageiros:
— Nós priorizamos a segurança de todos. É evidente que não freamos para machucar ninguém, mas é instinto frear quando percebemos que vamos bater e aí os passageiros caem. No tempo que trabalho na empresa em uma dessas freadas bruscas uma pessoa caiu e se machucou. O passageiro precisa estar prevenido porque tudo pode acontecer, eu cuido o máximo, não vamos frear de propósito para derrubar os ninguém. Eu cuido o máximo, mas tem momentos em que é instintivo e precisamos fazer isso. Então a queda interna nesses momentos é inevitável e o passageiro tem que estar prevenido.
PREVINA-SE
Ao embarcar caminhe devagar e entre no ônibus com cuidado para não tropeçar nas escadas;
Passe pela catraca sempre se segurando nas barras laterais ou superiores e, se possível, com as duas mãos, até mesmo quando estiver sentado;
Se estiver de pé e com mochila nas costas, tente colocá-la próximo aos pés, para que quando os demais passageiros passarem não esbarrem em você e lhe tirem o equilíbrio;
Evite mexer no celular se estiver de pé;
Não caminhe no ônibus, mesmo quando estiver lotado, sem se segurar nas barras laterais, superiores ou nos bancos.
O QUE DIZEM
Os passageiros
— A cidade tem muitos veículos, e o nosso trânsito é muito movimentado, e esse dia a dia de andar de ônibus exige que também nos cuidemos mais para não ter machucados sérios — afirma Gabriel Center, 23, que já machucou o joelho após uma queda.
— A barra superior é muito alta e eu não alcanço e nem sempre os motoristas têm paciência para esperar que a gente consiga sentar e estar mais segura — diz a pensionista Neusa Coppe, 63.
— Depende dos dois, tanto do passageiro quanto do motorista, temos que cuidar, porque de pé é ainda mais fácil de cair — destaca a comerciária Graci de Souza, 30.
— Procuro me segurar bem, mas depende tanto de mim, quanto do motorista. Eu que tenho mais idade, tenho mais dificuldade e preciso me segurar bem — afirma a aposentada Esterina Pedrotti, 79, que pede mais paciência aos motoristas.
— Eu procuro me segurar com as duas mãos sempre, mas também precisamos de motoristas mais compreensivos. Sei que eles têm horários a cumprir, mas se cairmos é pior, nos machucamos —ressalta a diarista Maria Sueli Nunes, 48 anos.
— Percebo que as pessoas não se cuidam. É claro que os motoristas precisam estar bem atentos, mas nós temos que nos segurar bem — diz Leandro Souza, autônomo.
— Me cuido muito mais hoje em dia e me seguro nas curvas e nas freadas bruscas para evitar machucados mais graves — conta Tainara Stroeher, 23. Natural de Feliz, a assistente jurídica ressalta que quando começou a andar de ônibus, caiu muitas vezes.
O que diz a Visate
A Visate está acompanhando o caso da aposentada Carolina Pedro Patrício para ressarcir os custos, mas como efetua o pagamento para quitar a dívida apenas uma vez, a família está aguardando o término do tratamento de Carolina para assinar os papéis, junto à empresa. A reportagem solicitou dados referentes às quedas junto à empresa, mas apesar de ressarcir os custos, alegou que não computa o número de atendimentos prestados pela empresa ao passageiros que caiam nos ônibus.