A crença em Nossa Senhora de Caravaggio criou raízes na Serra por ser herança de imigrantes italianos, gente de fé que deu início à devoção em Farroupilha por volta de 1879. E se a tradição de homenagear Nossa Senhora já é consagrada em território farroupilhense, há uma cidade na região das Hortênsias onde, ano a ano, crescem as demonstrações de fé do povo em Caravaggio. Canela aflora a religiosidade no mês de maio. Estima-se que cerca de 100 mil pessoas participem das homenagens à santa _ o ponto alto será neste final de semana, quando cerca de 60 mil pessoas devem passar pelo complexo no Parque do Saiqui.
Leia mais
Saiba os horários das missas no Santuário de Caravaggio, em Farroupilha, neste final de semana
Cerca de 100 mil fiéis de Caxias do Sul devem fazer o trajeto até o Santuário de Nossa Senhora de Caravaggio
Ônibus intermunicipais já operam na reserva em Caxias
Ônibus da Visate operam com horários reduzidos, em Caxias
A romaria a pé chega à 58ª edição e tem como grande ganho a união da comunidade. Diferentemente do que ocorre em Farroupilha, onde há equipe permanente organizada e dirigida pela Diocese de Caxias do Sul, o que torna o santuário também um ponto turístico, a festa de Canela depende quase que exclusivamente dos moradores para sair do papel. E mais: são eles também que batalham, há pelo menos cinco anos, para que o complexo tenha um santuário. A igreja está em construção desde 2013 e, pelo segundo ano, já são realizadas missas na gruta inaugurada dentro da cripta. Cerca de 40 casais que trabalham o ano inteiro para a romaria sob o coordenação do empresário Lauro Drechsler.
— Todos os anos acontecem fatos que provam que vale a pena. Às vezes, parece que a obra da igreja vai ter que parar, que não temos mais dinheiro, e, de repente, tudo muda. E a gente nota que, a cada ano, também cresce o número de pagadores de promessas — lembra Drechsler.
O empresário não revela porque dedica tanto de seu tempo, principalmente durante o mês de maio, ao futuro santuário. Mas as lágrimas que brotam dos olhos dele ao falar de Caravaggio demonstram uma religiosidade difícil de esconder. Seu Lauro, como é chamado, é o guardião da fé do povo de Saiqui, localidade em que o santuário é erguido. Ele trabalha voluntariamente desde o ano 2000, quando começou e entregou a primeira obra: o centro de eventos onde os romeiros encontram acolhida e alimento, entregue em 2008. A ideia de construir o santuário para acolher o povo de Canela e da região surgiu após a conclusão do centro. Perto dali, pouco a pouco, o templo de três andares vem ganhando forma graças a muitas mãos.
O dinheiro usado na obra é fruto de doações: de rifa a grupo de devotos, o dinheiro aparece quando menos se espera e mais se precisa.
— Quando a obra vai parar por falta de recursos, aparece alguém aqui que doa uma carga de tijolos. Já teve gente que doou meio saco de cimento, e empresa que destinou 40 mil tijolos. Nosso sonho é terminar esta estrutura — afirma Drechsler.
História começou em 1959
A ligação entre Canela e Nossa Senhora de Caravaggio começou a ser criada em 1959, quando Angela Rigotto, antiga moradora de Canela e lembrada pela comunidade até hoje, fez uma promessa e decidiu ir anualmente ao santuário de Farroupilha para agradecer. A tarefa foi ficando cada vez mais difícil com o surgimento dos filhos, e a moradora decidiu comprar uma estátua, que encomendou de São Paulo, para instalar na comunidade de Saiqui, distante cerca de sete quilômetros do centro de Canela. O pároco da época não foi favorável à ideia: aquele seria o espaço de instalação de uma estátua de Santa Bernardete. Angela, porém, convenceu o pároco e, em 1960, foi realizada a primeira romaria em honra a Nossa Senhora de Caravaggio no Saiqui. Naquele ano, cerca de 2 mil pessoas já haviam sido contagiadas com o convite de Angela, e a quantidade de moradores atribuindo milagres a Caravaggio só cresceu.
— Esta festa ainda mantém as características de uma festa paroquial, mas com a proporção de uma romaria — explica o padre Varnei Luiz Hinterholz, pároco da comunidade Nossa Senhora de Lourdes.
Canela pertence à Diocese de Novo Hamburgo, comandada pelo bispo dom Zeno Hastenteufel. Ele acrescenta que além de a fé do povo das Hortênsias se manifestar de forma maior ano a ano, a mensagem de Caravaggio combina cada vez mais com a sociedade. Isto porque o momento da aparição de Caravaggio para a camponesa era de desolação. A história conta que a mulher, de 32 anos, sofria com os maus-tratos do marido, um ex-soldado.
— Eu sempre trago como mensagem a grande conquista de Joaneta, que foi acolhida por Caravaggio porque o marido bebia e a surrava todas as noites. Ela prometeu à Joaneta que se ela rezasse, haveria uma mudança de vida. E é isso: alguém convertido não pode maltratar nem agredir alguém, muito menos bater em uma pessoa indefesa. É a santa que vem ao encontro da paz, tão necessária para este momento — explica dom Zeno.
O bispo lembra que violência contra a mulher é também uma realidade vista em Canela. Segundo o delegado Vladimir Medeiros, o município conta com um posto policial exclusivo para mulher.
— Nós temos um volume dentro da média das demais cidade, até com diminuição do número de ocorrências. Mas os crimes que mais se repetem são relacionados a lesões, ameaças e contra a honra, envolvendo companheiros e ex-companheiros — lembra o delegado.
PROGRAME-SE
:: Neste ano ocorre a 58ª romaria e festa em honra a Nossa Senhora de Caravaggio em Canela. O evento conta com cinco romarias: uma procissão luminosa, a Romaria dos Jovens e Jornada Diocesana da Juventude, a Cavalgada da Fé, a Romaria Motorizada e a procissão a pé, esta última sempre realizada em 26 de maio, o dia da santa.
:: O parque onde ocorre a festa tem 7,5 hectares, além de infraestrutura para receber a população. As mesas em meio à mata nativa são ideais para os almoços com churrasco, galeto e saladas, vendidos no local. No Centro de Eventos, há opção de bufê de comida caseira e lanches _ com destaque para os pastéis de massa caseira. Outras delícias como pipoca, crepe e espetinho de morango com chocolate também estão à disposição do público.
:: Os romeiros partem da Catedral de Pedras, no centro de Canela, às 8h30min, e seguem em caminhada de sete quilômetros até a comunidade de Saiqui no sábado, dia votivo. A estátua de Caravaggio é carregada pelos devotos. Durante o percurso, são entoados cânticos em homenagens à santa e é comum que os participantes paguem promessas carregando cruzes, caminhando descalços ou segurando flores.
:: No domingo, ocorrerá a Romaria Motorizada e dos Motociclistas. Neste dia, desde muito cedo, motos e frotas inteiras de empresas, caminhões e automóveis particulares tomam as ruas do Centro e seguem em busca da bênção que é dada na chegada ao santuário. A saída da catedral ocorre às 9h.
:: As missas no Saiqui são realizadas no sábado e domingo, na chegada dos romeiros pela manhã (por volta das 10h), às 13 e 13h45min.