Cerca de 50 pessoas participaram de protesto contra o parcelamento de salários de servidores na manhã desta quarta-feira, em Caxias do Sul. Professores da rede estadual, funcionários de escolas e estudantes de pelo menos quatro instituições de ensino da zona leste e utilizando carro de som para chamar a atenção à paralisação de educadores promovida em todo o Estado. Em Caxias, de acordo com o Cpers, 18 escolas estão paralisadas totalmente e 23 de forma parcial.
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O formato da manifestação foi semelhante ao de outros atos, no entanto, o diferencial do movimento foi o fato de ter surgido da iniciativa dos próprios professores daquela região, que se mobilizaram via redes sociais.
— Dá orgulho ver essa adesão, pois é uma região onde normalmente temos dificuldades para mobilizarmos os professores. Tivemos que chegar ao fundo poço para reagirmos. E quem não está participando, sabemos que em parte é por medo das ameaças que sofremos do Estado — afirma Aline de Azevedo Romeu, professora da Escola Assis Mariani, do bairro Jardim Eldorado
A docente reitera que as próprias condições as quais os professores trabalham atualmente comprometem o futuro da profissão.
— Basta observar nas faculdades, estão oferecendo quase de graça licenciatura porque ninguém mais quer ser professor. Escolhemos essa profissão quando ainda quando éramos criança. É um orgulho que construímos, mas que estamos perdendo. O pior é ter de ouvir dois senhores que passaram pelo protesto mandando a gente trabalhar. Nós trabalhamos, justamente por isso estamos protestando. Cadê a empatia da sociedade com a nossa situação? questiona.
O protesto iniciou na Escola Irmão Guerini, seguiu pela Av. Rio Branco e parou em frente à Escola Hercília Petry. Lá houve a convocação de professores para a mobilização, uma vez que poucos aderiram ao movimento na instituição. Uma das únicas professoras a paralisar as atividades discursou para alunos e educadores que assistiam ao protesto das janelas da escola.
— Abraço a causa por várias questões, entre elas, a luta por dignidade e respeito. Mas o principal, é passar aos alunos mais do que está nos livros. Ensinar a eles que precisam lutar por aquilo que acreditam, no que é direito (deles) e lutar por dignidade. Não adiantaria passar isso a eles na teoria e na prática não sairmos de cima do muro para confrontar prejuízos que nos impõem — comenta a professora Suzana Schmidt, há 15 anos nomeada pelo Estado.
Apesar de compor a minoria grevista da instituição, ela não classifica a própria postura como corajosa. Na visão de Suzana, muitos dos professores não teriam aderido à greve por comodismo.
— É difícil acreditar, mas as às vezes são por motivos egoístas. Há professores que jamais abririam mão dos 55 dias de férias para lutar por seus direitos. Mas eu não posso passar isso aos meus alunos, não posso pensar só em mim — complementa.
Em nenhum momento o grupo parou o trânsito para protestar. A manifestação se encerrou na praça Padavena, em Ana Rech e retornou à Escola Irmão Guerini. O Cpers apoiou o movimento e o Sindiserv cedeu o carro de som.
"No último mês não tive dinheiro nem pra pagar o combustível para ir trabalhar"
Parte dos professores participantes do ato admitiu não estar sofrendo dificuldades por trabalhar em mais de uma escola ou em outras redes além da estadual. No entanto, a maioria dos manifestantes reconheceu que o parcelamento compromete a renda familiar de maneira significativa, principalmente devido à necessidade de pagamento de juros aos frequentes pedidos de empréstimos bancários.
— Nós, funcionários gerais, sofremos até mais do que muitos professores porque ganhamos menos que eles. Eu sequer tenho ido banco olhar minha dívida para evitar me incomodar. Mas sei que ela está lá e tende a virar uma bola de neve cada vez maior — comenta o monitor da Escola Irmão Guerini, Ronaldo de Mello.
Situação mais grave é a da professora da mesma intituição, Mari Cléia Padilha de Almeida. Segundo relata, além de receber o salário em prestações, o fato de o marido estar desempregado inviabiliza até mesmo os gastos básicos do dia a dia.
— No último mês não tive dinheiro para pagar água, luz e aluguel. Até mesmo a gasolina para me deslocar à escola precisei pedir o cartão de crédito de um colega emprestado — comenta.
Além da ajuda de amigos, ela comenta que depende também de familiares para conseguir se manter:
— Meu pai me deu uma cesta básica para me ajudar. Meus amigos toda hora pedem se eu preciso de algo. Sei que eles têm boas intenções, mas nos sentimos humilhados por estarmos nessa situação. O pior é que parte da sociedade vai contra nós e o próprio governo usa isso como argumento para aprovar os projetos que querem extinguir de vez os direitos que conquistamos .
Apesar de lamentar a postura de oposição de parte da opinião pública, ela comenta ter recebido apoio de muitos pais e dos próprios estudantes.
Uma das participantes do ato, aluna do 1º ano do Ensino Médio da Escola Irmão Guerini, Tainá Cristina Luz, 15 anos, afirmou não se importar com o possível atraso do fim do ano letivo para apoiar a causa.
— Os professores são como pais para nós. Sem eles não somos nada. Se não recebem o salário como teremos educação de qualidade? — indaga.
Adesão
Professores e funcionários das escolas Assis Mariani (bairro Jardim Eldorado), Irmão Guerini (Ana Rech), Victorio Webber (Serrano) e Hercília Petry (Ana Rech) participaram do ato.
PEC
A principal oposição dos servidores é com relação à possível aprovação da PEC 257/2016 que tramita na Assembleia Legislativa e sugere a revogação do artigo 35 da constituição estadual. Caso aprovada a medida, haveria a extinção de uma data fixa para o pagamento mensal e do 13º salário dos servidores públicos do Estado.