Sem condições de fiscalizar as cerca de duas mil marquises de Caxias do Sul, a prefeitura da cidade quer transferir para os síndicos, administradores e proprietários de imóveis a tarefa de mantê-las dentro dos padrões. Desde 2010, quando a lei 7.169 entrou em vigor, a Secretaria Municipal do Urbanismo (SMU) recebeu a atribuição das vistorias técnicas nas edificações, mas, sem estrutura adequada para o trabalho, não cumpriu a legislação.
No dia 8 de junho, o Ministério Público (MP), preocupado com o risco de acidentes como o que vitimou duas mulheres em Porto Alegre há uma semana, chamou os representantes do Executivo para cobrar explicações. Do encontro, ficou definido que a lei deve ser alterada, com proposta enviada pela prefeitura à Câmara de Vereadores até o dia 8 de agosto.
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– Precisaríamos de uma equipe de oito pessoas, entre engenheiros e arquitetos, para a fiscalização. Estamos carentes de recursos e não tem como contratar. A mudança vai sim gerar custos, porém, muito menores do que a perda de uma vida e a indenização cobrada dos responsáveis – afirma o diretor de Fiscalização da SMU, Paulo Vega.
Assim como em 2010, quando uma queda de marquise fez vítimas, a fatalidade ocorrida no dia 21 de julho no centro da Capital, que causou as mortes de Eva Lenir Flores da Silva, 59 anos, e Tatiane Duarte da Silva, 34 anos, ligou o alerta do poder público. Há seis anos, a solução encontrada pela Câmara foi adaptar uma legislação de São Paulo, que não serviu para Caxias devido à grande diferença entre o quadro de servidores das duas prefeituras.
Agora, a modificação que será proposta ainda na gestão de Alceu Barbosa Velho (PDT) pretende deixar para a população a fiscalização e manutenção de sacadas e marquises que pendam sobre o passeio público e tenham 50 centímetros ou mais de tamanho.
– Na prática, fiquei convencido de que, do jeito que está, não tem como. Eu fiz algumas colaborações para a Casa Civil do Estado, na Lei Kiss, e a principal delas foi que a responsabilidade deve ser do construtor e do proprietário sempre, e não depois da notificação – pondera o promotor Adrio Gelatti, da 2ª Promotoria de Justiça Especializada de Caxias do Sul.
Valores das multas são discutidos
A Secretaria Municipal de Urbanismo ainda não estipulou os valores das multas para quem descumprir a futura legislação nem o prazo de adequação às normas. Após a reunião com o MP, ficou acertado, conforme documento obtido pelo Pioneiro, que a vistoria técnica estrutural e de manutenção, acompanhada de laudo, deverá ser exigida a partir do quinto ano da data de concessão do habite-se, renovando-se a cada cinco anos – quando expira a garantia da construtora – para os prédios novos.
Nas edificações já prontas, o síndico, administrador ou proprietário do imóvel terá de entregar ao município o laudo técnico, feito por profissional capacitado, das marquises e sacadas que se prolonguem sobre o passeio público e tenham 50 centímetros ou mais. Em todos os demais casos, o laudo não será cobrado.
– São transformações importantes para que funcione e que Caxias tenha realmente prevenção – salienta o promotor Gelatti.
Como a SMU não colocou equipes nas ruas para fiscalizar, não existe um levantamento que revele os pontos mais perigosos para a circulação de pedestres na cidade. Porém, de acordo com Paulo Vega, são poucas estruturas comprometidas a ponto de poderem desabar a qualquer momento. Ele explica que os maiores riscos estão em marquises com ferros não centralizados – que sofrem corrosão com as intempéries climáticas – e com lajes sem impermeabilização, acabamento e escoamento adequados.
– Caxias não é muito antiga e o clima favorece, por não ter maresia, o que dá uma durabilidade maior ao ferro. A restrição das propagandas (sancionada em 2012) ajudou, pois as marquises pegam sol e não depositam tanta água como antes – diz Vega.
Nesta semana, o Pioneiro analisou, junto com o diretor de fiscalização da secretaria de Urbanismo, algumas estruturas localizadas na Rua Júlio de Castilhos, a de maior trânsito de pessoas. Em uma delas, havia sinais de deterioração; em outra, a análise preliminar apontou ser necessário refazê-la. Veja abaixo:
Júlio de Castilhos com Alfredo Chaves
Com 2,20 metros de projeção sobre a calçada, necessitará de laudo. Sem marcas aparentes de infiltração, fissura, comprometimento da estrutura metálica e marcas d'água, ela não deve precisar de reformas.
Júlio de Castilhos com Borges de Medeiros
Sinais de aparente deterioração. Borda descascada, espelho da laje quebrado e três vergalhões da estrutura aparentes. Além disso, foi colocada uma laje de serviço em cima da laje pré-moldada. Uma carga de quase 500 kg de peso pressiona duas marquises, de forma irregular.
Júlio de Castilhos, entre Coronel Flores e Feijó
Falta uma parte do acabamento da marquise, que tem 1,2 metro de projeção sobre o passeio público. É possível ver que a estrutura é feita de madeira, que pode estar em processo de apodrecimento por goteiras, e não está bem nivelada, possivelmente pelo peso que já suportou. Precisa ser refeita.